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No ano de 2024, pela primeira vez, a temperatura média global ultrapassou 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais, um limite estabelecido pelo Acordo de Paris como essencial para evitar os piores impactos do aquecimento global. O anúncio, feito por organizações internacionais que monitoram o clima, destaca que o planeta registrou uma média de 1,55 °C acima do período de 1850 a 1900, indicando que o mundo está entrando em um território perigoso mais rápido do que muitos especialistas previam.

Para Gail Whiteman, cientista social da Universidade de Exeter, no Reino Unido, o rompimento desse limite é tanto um “choque simbólico” quanto uma realidade física. “Estamos chegando ao fim do que considerávamos uma zona segura para a humanidade”, alertou em entrevista para a revista Nature. A superação do limite de 1,5 °C sublinha a urgência de ações concretas para conter as emissões de gases de efeito estufa.

Carlos Nobre, climatologista da Universidade de São Paulo, também reforçou para a Nature a gravidade do momento. “Se o aumento das temperaturas de 2023 e 2024 não for apenas um evento isolado, mas um sinal de aceleração do aquecimento global, precisaremos reduzir as emissões ainda mais rapidamente”, afirmou.

Os anos de 2023 e 2024 marcaram recordes de calor em todo o planeta. A temperatura média global, calculada com base em dados de várias organizações, revelou um aumento estatisticamente significativo em relação aos anos anteriores. Especialistas estão analisando se essa tendência reflete uma aceleração do aquecimento global ou apenas uma variação pontual. Segundo Katharine Hayhoe, cientista-chefe do grupo de conservação Nature Conservancy, “o aquecimento que estamos vendo no ar é apenas uma parte do calor acumulado no sistema terrestre, que também envolve oceanos, terras e geleiras”.

Embora o limite de 1,5 °C seja um marco político estabelecido no Acordo de Paris, os cientistas enfatizam que ele não representa um ponto de ruptura abrupta, mas sim parte de um espectro contínuo de impactos climáticos. Cada fração de grau adicional amplifica os riscos de tempestades mais violentas, incêndios, derretimento de gelo e aumento do nível do mar.

O Acordo de Paris, assinado por quase 200 países em 2015, estabeleceu a meta de limitar o aquecimento global a 1,5 °C em relação aos níveis pré-industriais. Apesar disso, as emissões de carbono continuaram a crescer, atingindo níveis recordes em 2024, mesmo com o avanço de fontes de energia limpa, como eólica e solar. Segundo o secretário-geral da ONU, António Guterres, “o fato de um ano ultrapassar o limite não significa que a meta a longo prazo está perdida, mas sim que precisamos lutar ainda mais para voltar ao caminho certo. Os líderes devem agir — agora”.

Os cientistas também destacam que muitas projeções do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) preveem um “ultrapassagem temporária” do limite, com a possibilidade de capturar carbono da atmosfera no futuro para trazer as temperaturas de volta ao patamar seguro. No entanto, essa estratégia depende de tecnologias ainda em desenvolvimento e de cooperação global efetiva.

Os efeitos do aquecimento global já são sentidos em eventos climáticos extremos, como ondas de calor intensas, inundações e secas prolongadas. Além disso, o derretimento acelerado de geleiras e as mudanças nos ecossistemas aumentam os riscos de longo prazo.

Um dos maiores temores é que a notícia do rompimento do limite de 1,5 °C possa levar à complacência. Alguns podem interpretar o fato como um sinal de que “nada aconteceu” ao ultrapassar o limite, ignorando os danos cumulativos que as mudanças climáticas causam no longo prazo. No entanto, especialistas alertam que a inação apenas intensificará as consequências, tanto para a natureza quanto para as comunidades humanas.

A próxima conferência climática da ONU, que acontecerá em Belém, será uma oportunidade crucial para intensificar os compromissos internacionais. A transição para uma economia de baixo carbono, o investimento em tecnologias de captura de carbono e a proteção das populações mais vulneráveis são passos essenciais para evitar o pior. Cada décimo de grau conta e, enquanto houver oportunidade de mitigar os impactos e adaptar as sociedades às mudanças, a luta contra o aquecimento global deve ser prioridade.

Foto: Araquém Alcântara

Gabriella Florenzano
Cantora, cineasta, comunicóloga, doutoranda em ciência e tecnologia das artes, professora, atleta amadora – não necessariamente nesta mesma ordem. Viaja pelo mundo e na maionese.

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