Publicado em: 4 de julho de 2025
A Prefeitura de Santarém determinou a interdição ao tráfego de veículos na Praça Rodrigues dos Santos, localizada sobre o sítio arqueológico Aldeia, uma das áreas de maior relevância histórica e cultural do município. A medida, que entra em vigor a partir do próximo domingo, 6 de julho, foi resultado de uma articulação jurídica e institucional entre o Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), após o descumprimento de recomendações e decisões judiciais anteriores que visavam proteger o patrimônio arqueológico.
O sítio Aldeia, classificado como patrimônio nacional, se estende pelo centro da cidade e outros cinco bairros. Ele abriga vestígios de antigas ocupações humanas cujos registros materiais, como fragmentos de cerâmica e estruturas soterradas, contribuem para a compreensão da formação cultural da região e da história da humanidade. Um dos fragmentos descobertos no local, uma peça cilíndrica de cerâmica com padrões geométricos pretos sobre fundo terracota, aponta o valor arqueológico da área, que agora será cercada para evitar impactos causados por veículos.
De acordo com o procurador da República Vítor Vieira Alves, “a atuação conjunta do MPF com o MPPA, na pessoa da promotora de Justiça Lilian Braga, foi essencial para o alcance dessa conquista, consolidando o caminho para que um capítulo fundamental da história e da cultura humanas seja devidamente preservado e valorizado, garantindo a proteção de um patrimônio que pertence a toda a sociedade e às futuras gerações”.
A decisão municipal aconteceu após um histórico de embates judiciais. Em 2020, o MPF recomendou à prefeitura que consultasse o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) antes de realizar obras na área. Em 2022, contudo, o município iniciou a construção de um camelódromo na Praça Rodrigues dos Santos sem qualquer consulta ao órgão responsável pela preservação do patrimônio arqueológico. Durante as escavações, foram encontrados os primeiros vestígios do Sítio Aldeia.
Diante da descoberta, o MPPA ingressou com ação na Justiça Estadual e obteve a suspensão imediata das obras. Paralelamente, o MPF ajuizou ação na Justiça Federal pedindo a proibição de licenciamento de intervenções na área sem anuência do Iphan. Dois anos depois, em 2024, frente à continuidade do uso indevido da praça como estacionamento, o MPF e o MPPA ingressaram com nova ação conjunta na Justiça Federal, reiterando a necessidade de isolamento e preservação da área, além da elaboração de um projeto de revitalização que concilie proteção ao patrimônio e valorização da história santarena.
Desde o ajuizamento da ação de 2024, a prefeitura iniciou uma série de reuniões com os dois ministérios públicos para discutir os próximos passos. A interdição ao tráfego é fruto desses diálogos. Em maio, em reunião realizada na sede do MPPA em Santarém, ficou acordado que o modelo definitivo de revitalização da praça será construído de forma participativa, com a presença de representantes da sociedade civil, do Conselho do Patrimônio Histórico de Santarém e da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa).
A Ufopa, que já colabora com estudos sobre a área, será parceira nas etapas de salvamento arqueológico, levantamento bibliográfico e ações de educação patrimonial, fundamentais para garantir que a valorização da memória local esteja aliada à preservação científica e ao direito coletivo à cidade e à história.
Foto em destaque: Raoni Valle / Ufopa
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