Para quem presta atenção, a vida é cheia de mistérios e o mais intrigante deles é a própria morte.
Na década de 1980 veio do interior para minha casa uma jovem bonita e simpática, que vou chamar de A., para manter sua identidade e dignidade em sigilo.
Veio para morar e ajudar nos serviços caseiros. Como era uma pessoa de excelente caráter foi logo promovida em nossa afeição e ficou fazendo parte integrante da família.
Certas pessoas chegavam até pensar que era minha filha, pelo afeto e pela intimidade que possuía comigo, minha mulher e filhos.
Ela estudava de noite e dizia que queria fazer uma faculdade, no que era incentivada por todos.
Certo dia ela nos comunicou que ia abandonar os estudos, já que estava apaixonada por um rapaz, com quem casou e foi morar com ele.
Mas, não perdemos o contato. Tiveram um filho que ficou sendo nosso afilhado de batismo.
Tempos depois, soubemos que sua vida conjugal não andava bem.
Discutiam, brigavam, enfim, coisas do gênero, que ele confidenciava para minha mulher.
Certo sábado, pela manhã nossa família acordou satisfeita.
Iríamos fazer compras e almoçar no shopping.
Meus filhos e filha eram uma só felicidade. Tomaram banho, vestiram-se, cantavam, brincavam, sorriam e se soltaram de alegria ao chegarem ao templo do consumo.
Depois das brincadeiras infantis, almoçamos e as crianças tornaram a correr pelo shopping numa só felicidade, depois de ganharem presentinhos.
Em dado momento, sem motivo aparente, todos começamos a sentir uma tristeza inexplicável.
As crianças ficaram quietas, eu e a esposa ficamos jururus.
Sentimos uma vontade imensa de ir embora. De repente aquilo ali perdera subitamente o encanto.
Pegamos o carro e saímos no rumo de casa.
Já no trânsito, tentei usar a buzina do carro, que era perfeita, mas esta não funcionou. Tentei várias vezes e nada.
Olhei para o meu relógio de pulso que era novo e com a bateria carregada e vi que estava parado, marcando exatamente 12:30 (doze horas e trinta minutos) daquele sábado.
Todos seguiam em silêncio no veículo, em contraste com alegria de pouco tempo antes.
Mal chegamos em casa e me telefonaram do Hospital Guadalupe perguntando se eu conhecia essa pessoa.
Falei que sim. Então me disseram que algo havia acontecido com ela e pediram minha presença urgente naquele local.
Deixamos a criançada com minha sogra.
Quando eu e minha mulher chegamos no Hospital fomos mandados para o necrotério.
E lá jazia o corpo sem vida da nossa amiga A.
Vizinhos dela nos informaram que ela teria brigado com o marido e, angustiada ingeriu uma dose cavalar do conhecido veneno “chumbinho”.
Pendurada no dedão do pé da falecida, uma placa anunciava a hora do óbito: exatamente às 12:30.
E o meu relógio e buzina do carro voltaram a funcionar de novo.
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