Imaginem uma noite de agosto, em Santarém. A lua vestida de maravilhas, como se fosse uma noiva tomando banho no rio Tapajós.
As saudosas catraias empurradas pelas faias do catraieiro, bem na frente da cidade, entre a Ponta Negra e a Praça da Matriz.
No meio do rio, perto do encontro das águas, as horas silentes para não espantar os peixes, deixando a alma mergulhar no paraíso da noite, onde há paz e alumbramento.
Nesse oco de mundo sob os eflúvios do Tapajós noturno, tudo é sossego. A natureza acalenta a cidade com suas asas na madorna da noite. Inesquecíveis os imensos navios ancorados, com algumas luzes acesas na frente da cidade. Seguiam no rumo de Manaus e em tempos idos paravam geralmente para se abastecer da água límpida do rio azul. Às vezes nos espantavam, pois de longe, pareciam Cobras Grandes.
Nem muito distante dali, no Mapiri, alguns pescadores corajosos mergulham na escuridão das águas, munidos apenas com lanterna e arpão, enquanto outros, despreocupados, vão tenteando o anzol e molhando o olhar na beleza do rio bebendo a lua.
Lamento o uso de açacu, timbó, tingui, cunambi, bombas e outros venenos utilizados para pegar mais peixe.
Esses vegetais venenosos servem para intoxicar o peixe, fazendo com que venha sobrenadar desnorteado, na tona, facilitando a captura de montões de pescado, de uma pegada só, causando desequilíbrio no sistema ecológico.
Essa prática extermina peixes de todos os portes, impede o crescimento das espécies e vai acabando a conta-gotas com os cardumes, que vão se retirando cada vez mais para longe, até que um dia, quem sabe, não tenham mais para onde se alargar.
Hoje em dia esses recursos parecem coisa de brinquedo quando se compara com os métodos, que eu considero criminosos, das grandes empresas de pesca.
Meu pai me levava ao mercado, toda manhã, para ajudar a carregar o paneiro de compras e tomar mingau.
Quando ia comprar pescado ele gostava de conversar com alguns dos grandes futebolistas dos times santarenos que ganhavam a vida em função do mercado: Taro, Pelicano, Flecha, Darito lá do Arapixuna (este, o patriarca de uma geração de craques da terra da laranja doce, como Adilson e Edvar).
É que além do futebol eram pescadores e ficavam falando das piracemas que naquele tempo ainda abarrotavam as igaras com piramutabas, pirapitingas, surubins, apapás, jaraquis, tucunarés, tambaquis e outras tantas espécies e quantidades de pescado.
Chegavam de manhãzinha e traziam as montarias cheias de peixe para vender na escadaria do Mercado Velho quando o rio estava cheio ou na beira da praia, na época de vazante.
Hoje mudou tanto. Mas tenho saudades daquela paisagem autenticamente amazônica, feita de canoas, mastros, velas, cheiro de peixe e de melancia, urubus e azul do rio da tapajônia. Ainda hoje parece que escuto o pregão dos pescadores:
Olha o peixe barato! Compra uma cambada, leva duas!
Coisas assim fazem de Santarém, a “Terra Querida”, a cidade mais linda do mundo!
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