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Há alguns anos eu ouvi de uma prima minha, profissional da saúde, que um dos maiores prazeres de alguns pacientes em fase terminal e acamados, é tomar um demorado banho de chuveiro.

Isso nunca saiu da minha cabeça.

Viver uma vida inteira.
Amar para evoluir como ser humano.
Trabalhar para prosperar materialmente.
E, no momento derradeiro, só conseguir desejar um banho de chuveiro.

Sei que pode soar clichê, mas desde então, “vira e mexe”, eu me pego pensando: “deixa eu aproveitar esse banho aqui porque há alguém por aí, querendo muito sentir esta sensação, tão corriqueira pra mim”.

Essa história é só uma história. Não era pra ser uma metáfora sobre os pequenos prazeres da vida, mas acabou sendo.

A verdade é que todos nós, sem exceção, talvez em graus diferentes, vamos vivendo no “modo automático”. Muitas vezes buscando coisas, sensações e experiências que sequer nos farão falta quando estivermos nos despedindo desta existência.

Não há nada mais extraordinário que viver uma vida comum.
Feliz e comum.

Acordar e o corpo ter forças para levantar.
Namorar e sair para jantar.
Gin com as amigas.
Filhos, domingo, praça, bicicleta e pipoca.
O mergulho na piscina do clube.
Abraçar a nossa mãe.
A boa notícia que chega e que achávamos que não vinha.
Sentir saudade e ligar.
Olhar o mar e esperar a onda molhar nossos pés.
Amar com paixão e receber reciprocidade.
Estudar e passar.
Trabalhar para realizar.
O reencontro no aeroeporto.
O sorriso antes do 1º beijo.
A lágrima de emoção.
A alta do hospital.
A troca de alianças.
Cinema no fim do expediente.
Lembrar da infância com os irmãos.
As mãos que se tocam.
Olhar que diz: “estou aqui”.

(…)

Cada um de vocês que me lê agora, poderia completar esta lista com uma infinidade de tantos outros momentos desses que vivemos e passam, às vezes, desapercebidos; no entanto, são eles, justamente, que dão sentido à nossa caminhada pela Terra.

Sempre tento fazer o exercício de me policiar para observar o quanto de mim está “vagando inconsciente” e os convido a fazerem o mesmo.

Que possamos, à noite, naquela hora em que somos só nós e nosso travesseiro, pensar: “a vida é um verdadeiro milagre e que bom que percebi isso enquanto ainda tenho saúde para tomar quantos banhos de chuveiro eu queira, ao longo do dia”.

Angélica Maués
Paraense, Advogada Previdenciarista e mãe do Pedro, da Marina e da Maeve. E-mail: angelicamauesmoura@gmail.com

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