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Levantamento da Ong Terra de Direitos em 2024 estima que, no ritmo atual, serão necessários 2.708 anos para titular os 1.857 quilombos do país com processos abertos no Incra.

Associações quilombolas do Pará denunciaram na 18ª Mesa Nacional Quilombola, em Brasília (DF), a falta de atuação e postura negligente do Incra no que tange à garantia do direito territorial. As entidades exigem reestruturação completa das Superintendências Regionais de Santarém (SR-30) e Belém (SR-1), incluindo a exoneração do superintendente de Santarém, José Maria Melo, e a contratação de equipe técnica adequada e suficiente para dar andamento aos processos de titulação. Uma nota pública foi divulgada, com assinatura de trinta associações quilombolas paraenses e organizações parceiras, entre elas a Terra de Direitos. 

Desde 2018 o Incra no Pará não conclui qualquer processo de titulação de territórios quilombolas. Em Santarém, onde há apenas um território parcialmente titulado – o Quilombo Pérola do Maicá –, o órgão conta com apenas uma servidora responsável pelos 19 processos abertos de pedido de titulação, 84% deles datados de mais de 18 anos. “Esse cenário escancara o descaso da atual gestão da SR-30/Incra para com os direitos das comunidades quilombolas”, afirma a nota. 

Douglas Sena, coordenador regional da Malungu no Baixo Amazonas – região onde se encontram as comunidades quilombolas atendidas pela SR-30 – reforça.  “A Superintendência do Incra em Santarém tem atuação ineficiente e quase inexistente, no sentido de que temos um decreto que cria as diretorias quilombolas dentro da SR-30, e até hoje essa divisão quilombola não foi instituída de fato e de direito, porque falta comando da gestão do Incra em direcionar funcionários para compor essa diretoria. Faltam também chegar as pessoas que passaram no concurso público unificado, para completar o quadro de funcionários do Incra. Precisamos ter um superintendente que entenda de fato do assunto, que seja técnico, que consiga dialogar também politicamente com o movimento quilombola.”

Na Regional de Belém há 53 processos abertos, sendo 29 em fase inicial há 20 anos, aguardando a ida a campo do Incra. A presença do órgão nos territórios é fundamental para elaboração e publicação do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação, documento central no processo de regularização quilombola. O RTID define a área reivindicada como quilombo, com base em informações cartográficas, fundiárias, agronômicas, ecológicas, geográficas, socioeconômicas, históricas e antropológicas. 

A pesquisa Racismo e Violência contra Quilombos no Brasil, elaborada pela Coordenação Nacional de Comunidades Negras Rurais Quilombolas e Terra de Direitos entre 2018 e 2022, revela que 65% dos assassinatos de quilombolas aconteceram em territórios não titulados – nos quilombos sem título, 70% dos assassinatos foram motivados por conflitos fundiários.  

Lideranças dos territórios com processos abertos no Incra, organizações parceiras e o Ministério Público Federal participam regularmente de reuniões ordinárias, as mesas quilombolas, em que se debate o andamento dos processos de titulação, mas nada avança. Enquanto isso os territórios seguem enfrentando uma série de desafios, como o avanço do agronegócio, a expansão portuária, ausência de políticas públicas e insegurança jurídica quanto as suas terras pois grande parte delas ainda permanece nas mãos de fazendeiros, garimpeiros e posseiros. 

Ao final da Mesa Nacional Quilombola a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas informou a saída do espaço de diálogo do Incra, pela ausência de representantes do governo federal que pudessem decidir e dar encaminhamentos concretos às demandas. O presidente do Incra, César Aldrighi, não compareceu. “É a 18ª reunião que a gente vem para colocar nossos lamentos para nós mesmos porque quem, de fato, tem o poder da caneta, não se faz presente para não se comprometer com a causa quilombola. Então diante disso não há mesa e todos os quilombolas do Brasil se retiram nesse momento”, declarou Maria Rosalina, coordenadora executiva da Conaq.

Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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