Nessa semana de Brasil na Copa do Mundo e inicio de dezembro, minhas filhas aprenderam a bater palminhas ao ouvir parabéns-pra-você. Univitelinas que são, até os ângulos dos primeiros dentes, tortinhos, são iguais. Mas a altura deles é diferente, porque cada uma tem seu tempo. Ser mãe de gêmeas idênticas é ver dois indivíduos iguais e completamente diferentes, que parecem o mesmo – só que em um universo paralelo. O mesmo DNA, duplicado. Aqui não existe original. Autenticidade e originalidade são conceitos complexos. Tipo um filme do Abbas Kiarostami. Parêntesis. Acho muito engraçado ter escrito e falado aos quatros ventos que Cópia fiel é um dos meus filmes preferidos e, depois, ter tido a surpresa de uma gravidez gemelar univitelina. Fecha parêntesis. O que é original? Cópia fiel é um filme que não fala sobre arte. Ele aborda as experiências que criamos em relação a ela e questiona o conceito de originalidade [o sorriso da Monalisa é original ou é uma cópia do sorriso real da Gioconda?]. No filme, de uma maneira enigmática, os limites entre o que é real e o que é a cópia de alguma realidade não são esclarecidos, te deixando intrigado com o próprio enredo.
Mas não só os símbolos e significados estão por traz das relações humanas, porque convenções sociais fazem parte da vida e o filme me lembra sobre réplicas. De Davi de Michelangelo ao Pavilhão Alemão de Mies Van de Rohe, muitas cópias de obras de arte foram realizadas e hoje também assumiram seu papel enquanto artefato a ser preservado. Porém as cópias saíram dos ateliês, da ideia de aprendizado, e entraram para o mercado das artes, chegando à arquitetura. La clonación arquitectónica, como nos explica Ascención Martinez Hernández* ao refletir que, no campo arquitetônico, é preciso cautela para não achatar e idealizar a história. Já, como nos explica Cazuza, o tempo não para. Então, quais os limites de réplicas? As cópias mudam o sentimento perante a arte? Qual o valor da cópia para o original? A cópia adiciona valor? Qual sua utilidade?
Muito se fala sobre a interação entre o cinema e a arquitetura, especialmente na construção de cenários. Mas essa relação vai além e Abbas Kiarostami me lembra que as cópias são didáticas e, se talvez não mudem em relação à aparência externa, mudam o tempo. E o tempo, para nós ocidentais, importa. A autenticidade existe. Minhas filhas gêmeas são iguais e completamente diferentes. Cada uma tem seu tempo. E o tempo tem função social e cultural. É insubstituível, irreversível, implacável. Nos meus sonhos, o tempo das minhas filhas gêmeas eu queria congelar pra mim. E ainda que tudo passe – tudo sempre passará -, se o que criamos, produzimos e edificamos, fica, de alguma maneira, elas ficam. Nós também ficamos.
*HERNÁNDEZ, Ascención Martinez. La clonación arquitectónica. Madrid: Ediciones Siruela, 2007
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