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Um amigo dos meus amigos faleceu semana passada. Em um daqueles contextos de terrível tristeza em que não faz o menor sentido essa partida para alguém tão jovem. Aprender a morrer, só para os sábios. Talvez por isso quem escreveu sobre essa sabedoria foi Saramago, um dos poucos que conseguia tratar a morte como vida e como alegria. E também aquele que escreveu que filosofamos por saber que morreremos. Filosofar é aprender a morrer. Intermitências da morte. Mas seria bom que fosse intermitências da vida. Porque a vida devia ter intervalos e não fins. E se na ponta da língua a gente sabe que a vida importa mais do que tudo, na vida real é difícil viver essa verdade. Porque a vida, ela não para e toma folego. E nem nós. Ela só é. E nós, só somos.

Se existe arte, se existe arquitetura, se existe patrimônio e cultura é porque a vida existe e ela precisa de um meio material para acontecer. Das coisas nascem coisas e nelas, as coisas, também persistem nossas memórias. É por isso que o patrimônio cultural é um sinal da existência histórica do homem, torna vivo um passado e nos serve de orientação. Eu sou quem eu sou porque eu sei quem eu fui. E nós precisamos da relação com as coisas para saber quem somos. Para estabelecer uma ordem simbólica. Termo chique, ordem simbólica, que significa nada mais do que tranquilidade. A sensação de ordem que a familiaridade de certos locais nos remete, embora não possa ser reduzida aos objetos, é fortemente influenciada pela arquitetura, por exemplo. E ter tranquilidade é bom. Sem ela, há um vazio. E é por isso que a destruição de monumentos em guerras ou desastres nos causa um enorme sentimento de vazio e perda, porque a arquitetura também transmite ao homem a sensação de estabilidade.

É a tranquilidade que nos faz encarar os fins e sonhar com os começos. É preciso estar tranquilo para aceitar nossa natureza angustiada com o medo da morte e, por consequência, a desejar a permanência. Mas as pessoas, elas morrem. E é preciso muita filosofia para aceitar isso, aprender a morrer. Ou muita arte. Sim, a arte salva e nos ajuda a lidar com nossas dores, mas nem sempre ela é suficiente. E ainda que seja clichê, gosto de lembrar que a vida é curta, mas as emoções que podemos deixar duram uma eternidade*. Descanse em paz.

https://www.literar.com.br/intermitencias-morte/
https://artout.com.br/a-persistencia-da-memoria/
https://www.nationalgeographicbrasil.com/historia/os-lugares-antigos-danificados-e-destruidos-pelo-isis
https://www.diariodelviajero.com/asia/palmira-antes-y-despues-de-isis
https://www.diariodelviajero.com/asia/palmira-antes-y-despues-de-isis
  • Poema de autoria desconhecida que circula em páginas de pensamentos da internet.
Luciana Florenzano
Mãe de gêmeas, arquiteta e urbanista, doutoranda em patrimônio-teoria-crítica, especialista em história da arte, eterna estudante. Gosto de palavras, da arquitetura que é arte e de fazer abordagens transversais. 

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