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Esses dias fui chamada para dar várias entrevistas sobre violências contra as mulheres por causa da campanha lilás do mês de agosto. Um dos assuntos que sempre abordam é  sobre a violência entre casais, como algo da esfera da intimidade. Obviamente é muito importante, pois toda mulher deve saber reconhecer uma relação abusiva, saber que existem várias formas de violências, não apenas a física, e ser informada onde procurar ajuda e ter rede de apoio. Mas, hoje, gostaria de atentar uma coisinha a mais: as violênciaS contra as mulheres (tudo no plural) são produtos do modelo estatal governados por homens. Há um projeto político, que vem desde a colonização e é histórico, que torna as cidades projetadas para os homens e os formam para soberania, custe o que custar. Sendo estes os que ocupam o poder, mulheres acabam sendo vistas como objetos (sexuais) e como propriedade, não como sujeitos de sua própria história, com direito de ir e vir. Elas servem pro sexo, pra cuidar das coisas, da casa e dar conforto a este homens: apenas.

Apesar dos avanços, seguimos com medo de andar nas ruas, somos julgadas por roupas e atitudes, controladas, mal ou nada remuneradas, apagadas de livros de história, exploradas nos serviços domésticos e na criação de filhos, quando não violentadas fisicamente e mortas.

Nossas conquistas seguem ameaçadas. Nossas denúncias são sempre questionadas. Tornam os filhos instrumentos para retirada da expansão de nossa capacidade. Roubam muito de nós ao não garantir políticas públicas que nos possibilitem a oportunidade de estudar, trabalhar e assumir cargos políticos. Não querem. Resultado: todas nós, sem exceções, estamos vulneráveis. Algumas mais, como as negras, outras menos, mas todas vulneráveis. Não temos o direito sequer de dizer não.

Essa semana um deputado se reuniu com o agressor criminoso que aleijou e tentou matar Maria da Penha, duvidando de sua narrativa. Uma lei de proteção às mulheres sendo questionada em sua origem só demonstra que estamos vulneráveis no Brasil e precisamos estar em luta sempre, sobre o risco de sermos violentadas constantemente, seja em casa, seja na rua. Essa semana também, já após as entrevistas, tivemos a notícia de mais um feminicídio, Geordana Nataly Sales, uma moça jovem, modelo: morta por um homem com nome e farda, morta por uma sociedade que ensina aos homens a violência e baixa capacidade de  tolerar frustrações e perdas, esperando das mulheres servidão, passividade e devoção.

Nossa luta deve ser contra cada ato de violência contra as mulheres e também contra o governo que finge tratar do problema, quando na verdade ganha com a estrutura social como bem está. Quando uma mulher é assassinada, todas nós somos um pouco. Todos meus sentimentos aos familiares e todo meu apoio à marcha de mulheres pelo fim do feminicídio. Força para nós.

Bárbara Sordi
Psicóloga, Psicanalista, Especialista em Psicologia Hospitalar da Saúde, Facilitadora de Círculos de Paz, Professora da Universidade da Amazônia, coordenadora do Projeto “Sobre-viver às violências” e do Grupo de estudos “Relações de gênero, Feminismos e Violências”, Mestre e Doutora em Psicologia pela Ufpa e coordenadora/assessora da Vereadora Lívia Duarte. Mãe da Luísa e Caetano, Feminista Terceiro Mundista.

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