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Recentemente comemoramos o dia do livro infantil que assim foi designado para homenagear o escritor pré-modernista e intelectual Monteiro Lobato. Autor de 23 volumes de sua obra mais famosa: “ Sítio do Pica Pau Amarelo”, é considerado o primeiro escritor de livros para crianças da América Latina e do Brasil. Escreveu seus personagens inspirados no cenário de sua fazenda em Taubaté- SP. Teve sua infância envolta por uma imaginação exacerbada, que posteriormente confirmou com a mistura de personagens lendários do nosso folclore como o serelepe Saci e a perigosa Cuca, com seus próprios personagens tais como Narizinho, Pedrinho e D. Benta, que foram somando aos não humanos como os emblemáticos Visconde de Sabugosa e a boneca de pano Emília. Seu legado principal foi trazer o cotidiano nacional, pautado em aventuras fabulosas que estimulavam a prática da leitura mirim. A data comemorativa de 18 de Abril no calendário serve para ressaltar a importância de apresentarmos desde cedo o mundo das letras às crianças de tenra idade. Os catedráticos da infância e pais dedicados à educação de seus filhos sempre se reportam ao momento lúdico e especial quando vivenciado à luz da criatividade literária, no gesto de ao tocar e escolher um determinado livro, para exercitar sua expressividade oralmente. Esta ação inserida no exercício da capacidade simbólica, numa demanda constante e rotineira do lazer, conduz ao ato de contar histórias, de forma divertida e ao mesmo tempo intimista. Esta prática universal é renovada constantemente, devido ao fato que toda criança em idade semiótica ávida por descobertas, pede expressivamente ao seu interlocutor, de seu círculo familiar, que lhe conte uma história. Ressalte-se então o relevante papel da escola ou da família em estimular a técnica da leitura casual despertando e encantando desde a mais tenra idade.

Uma vez que ainda não dominam a leitura completamente e muitas vezes o hábito de ler não faz parte do cotidiano, diante de uma aprofundada interação entre os contos fabulosos, instigamos uma questão consequente da constatação, que no engajamento concomitante à adoção de leituras, muito pouco é difundido sobre as lendas pertinentes a nossa identidade local. Não obstante os mais variados tipos de opções de títulos infantojuvenis no mercado editorial, são contundentemente identificáveis e de fácil percepção, que o conhecimento de nossos mitos, ainda carecem de um maior entendimento em detrimento a fatores exógenos, que invertem a direção da cultura endógena muito contemporânea no assunto gerador. A realidade amazônica quase não se faz presente, nos ciclos de leituras de uma forma em geral, a despeito de seu enorme valor cultural, e grandiosidade temática de nossas raízes.

O incentivo à leitura do contexto lendário seria extremamente salutar, por conduzir o leitor a uma condição reflexiva, que fortaleceria a identidade existencial, além de fomentar as possíveis decodificações contidas na vasta e rica memória imaginativa de nossas histórias.

O folclorista Câmara Cascudo sempre se lembrava do poder que a imaginação popular apresentava, e que quanto maior o distanciamento dos vértices locais, menor seria o valor da realidade personificada. Como explicar que a oralidade resultante de gerações possa ser fragmentada em diversos pontos do saber amazônico? Por que a sociedade sabe tão pouco sobre lendas mágicas como a Matinta Perera ou o Muiraquitã? Sobre a riqueza de heróis indígenas e animais falantes? Ou até mesmo detalhes tão essenciais como a cor dos cabelos da sereia lara? Largamente confundida com a nórdica Lorelay. São apenas exemplos de um fantástico leque mitológico, pertencente a um gênero dramatúrgico com grande tradição linguística e combinações infinitamente essenciais da ciência social literata.

Como Betteheim, reitera o exemplo comparativo que “Os contos de fadas que hoje lemos à luz da psicanálise e da sociologia apresentam reações distintas diante de um e outro instrumental”. A par disso, hoje sabemos, os textos de tradição oral da idade média operavam sobre os ouvintes de modo similar ao que atuam sobre nossas crianças, embora não tivessem notícia do inconsciente freudiano.

Visando proporcionar vários momentos, para contar uma história com diversificadas opções, os incentivos à prática da leitura, seja em seu primeiro estágio que recorre à ação de ler, são primordiais para a formação do leitor, que irá interpretar e desvelar cada página lida. E num futuro próximo e promissor, como leitor proficiente vislumbrá-lo de uma nova forma, corroborando com o valor de nossa bela cultura, legitimada com suas realidades poéticas.

Além da data mencionada acima, temos outros momentos durante o decorrer do ano para pautar comemorações à literatura em geral enfatizando todos os benefícios que o hábito da leitura proficiente deve ser realizado indistintamente. Reverenciar Monteiro Lobato é inegavelmente um procedimento para o bem comum. O autor que completou 140 anos de existência, merece todas as incidências que refutam seu legado livreiro. Por muitas vezes foi chamado de polêmico ou mistificado por ser incompreendido, o louvor ao seu trabalho literário deve indubitavelmente pontuado a todas as gerações.

Nazaré de Melo
Nazaré de Mello é escritora, artista plástica e pedagoga, Especialista em Educação Infantil, Mestra em Avaliação, gestora e fundadora da Escola Primeira Infância. Membro da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, diretora da Associação Comercial do Pará, é autora de 17 livros publicados.

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