Dizem que não há ninguém que seja insubstituível, mas hoje eu entendi que toda regra tem exceção.
A Josiane Damasceno foi dessas pessoas que quebram regras.
Quando recebeu o pior diagnóstico que alguém pode receber sobre si mesmo, ela não baixou a cabeça e tampouco pensou somente nela.
Tendo um bom plano de saúde e recursos que lhe permitiam ter acesso a excelentes protocolos de tratamento, Josiane teria todo o direito de se dar atenção plena naquele momento. Mas essa não era ela. A Josiane era daquelas poucas que pensavam no coletivo. Pensou então em todas as mulheres que sofriam da mesma doença e não tinham recurso algum para combatê-la.
Então, Josi foi fazer o que fazia de melhor: lutar. Ainda que não gostasse de ser vista como lutadora.
Todavia, Josi lutou. Não exatamente contra o câncer, mas contra todo o estigma desta doença. Contra um sistema que se nega a ver todos os problemas decorrentes dele, pelos quais passam mulheres sem recursos financeiros. Fundou e atuou em várias ONGS, como a Laços de Amor, através das quais levou dignidade e qualidade de vida a tantas pessoas cujas realidades não podemos nem imaginar. Se faltasse medicamentos nos postos de saúde, Josi denunciava. Se faltasse a quimioterapia para quem não pudesse pagar, Josi gritava. Se faltasse raio x, Josi exigia. Se faltasse alegria, ela gargalhava. Se faltasse amor, ela dava.
Nunca reclamou da doença. Nunca perguntou o porquê. Na verdade , acho que ela sabia que havia sido escolhida, não para o sofrimento, mas para ser voz de quem não tinha, amparo de quem precisava, ajuda de quem necessitava. Tornou-se uma ativista. Das mais importantes deste país. Palestrou em todo o Brasil e logo virou referência.
Era tanta vida nessa amiga que algumas pessoas até duvidavam da doença. Um dia foi acusada de “romantizar” o câncer. Ao invés de se enfurecer, ela riu. E continuou fazendo o que fazia de melhor: levar esperança a tantas mulheres, mostrando-lhes que nenhum diagnóstico é capaz de definir um ser humano. Nenhuma doença faria com que não aproveitasse cada minuto da vida. E ela aproveitou. Dançou, velejou, remou, andou de moto, viajou, tomou banho de cachoeira, conheceu pessoas, palestrou, posou, foi inspiração para tantas pessoas, e com toda a certeza para mim.
Ela gostava de dizer que o câncer é que tinha que se adaptar à vida dela e não o contrário. Que não havia perdedores nessa luta. Que quando a morte lhe chegasse iria lhe encontrar VIVENDO.
Era comum em seus posts sobre a doença encontrar a hashtag #thebrightsideofcancer, que significa “o lado luminoso do câncer”. Porque ela via aprendizado e coisas boas até nele.
Josiane Damasceno não perdeu a guerra para essa doença. Ela foi vitoriosa desde o primeiro dia! Aliás, ela nunca guerreou contra a doença. Ela só venceu!
Venceu quando mostrou que não podemos escolher nosso destino, mas podemos escolher como nos comportamos diante dele.
Venceu quando salvou a vida de tantas mulheres, a cada vez que denunciou que algo faltava nos hospitais públicos.
Venceu quando se importou com todos, quando poderia e teria mais do que direito, de se importar somente com ela.
Venceu quando falou em tantas cidades, em faculdades, na TV, em reportagens, sobre seu exemplo de vida.
Venceu quando sendo uma mulher viúva, sem tantos recursos e doente, se fez ouvir, tão poderosas eram as suas palavras.
Venceu quando não viu o câncer como um inimigo mas como chance de evolução e de ajuda ao próximo.
Minha amiga venceu essa batalha de forma admirável e merece todos os nossos aplausos.
Josiane Damasceno partiu ontem, depois de ter transformado a vida de tantos…
Ela venceu!
É justo que agora descanse.
O legado que ela deixou será para sempre e para sempre sentirei saudades.
A palavra que escolho para terminar esse texto só poderia ser uma: insubstituível.
Josiane Damasceno era artesã, ativista e palestrante. Deixa a filha Bruna, a mãe, tias, além de uma legião de amigos e fãs.
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