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Normalmente escrevo sobre os jogos e seus desdobramentos nas mais diversas esferas da vida, da ciência, da arte. Me divirto com essa coluna porque é quase como um observatório pessoal, o local onde eu venho para colocar meus games preferidos sob uma lupa e pensar sobre eles de forma mais profunda. E, como observador, sou também alguém que fala de fora. Os jogos que comento aqui são normalmente feitos por equipes e pessoas que eu sequer conheço. Prazer, sou o Dimas, colunista.

Mas hoje farei algo diferente. Algo que inclusive é o motivo pelo excepcional hiato entre esse texto e o meu último. Hoje eu queria falar sobre a primeira vez em que eu li meu nome nos créditos de um jogo com lançamento global.

Embora minha descrição aqui no portal e meu primeiro texto para essa coluna contem um pouco da minha história, acho que vale a pena relembrá-la. Se alguém me perguntasse em 2018 como eu me via dali a dois anos e meio, a chance de que eu dissesse que meu nome estaria nos créditos de um game eram quase nulas. Era algo que habitava a esfera do sonho. Algo que era bem menos real dos que os mundos pelos quais eu transitava nos meus muitos jogos.

Mas, como nos melhores games, a vida tem reviravoltas. E uma série de decisões e coincidências acabaram me levando a abandonar a carreira de mais de 10 anos trabalhando com comunicação corporativa e vir parar na Alemanha, onde, quem diria, voltei a ser estudante. Desta vez de Game Design.

Muita gente achou que, no momento em que fui aceito na faculdade, estava claro que meu nome estamparia um jogo. Ou que eu faria meus próprios jogos. Era só uma questão de tempo. O que essa gente toda não imagina é que, quando eu me encontrei com a minha turma, eu sequer conseguia entender por que ou como eu havia sido aceito na faculdade. Os meus colegas possuem portfolios com diversas ilustrações, modelos 3D, protótipos. Vários já sabiam utilizar as linguagens e softwares necessárias ao desenvolvimento de jogos, enquanto eu sequer os tinha instalados no meu computador. Alguns já têm jogos publicados. E eu… bom, eu tinha um mestrado estudando games dos outros, um monte de textos e um punhado de ideias. Mas quis o destino que eu lá estivesse.

Como bom habitante de Colônia, me adaptei até a andar de bicicleta por aqui

Três semestres depois, eu deixava meu trabalho de meio período num supermercado para aceitar uma proposta de estágio. Num golpe de improbabilidade, eu era o primeiro daquela turma inteira, mesmo sem portfolio, a conseguir algo do tipo. Trabalharia para uma “publisher” (empresas que compram, publicam e distribuem jogos) com base na Holanda, como “Community Manager”. Claro que meu passado com comunicação ajudou muito. Eu passaria a ser a pessoa que monitora as redes sociais dos jogos e transforma os feedbacks e bugs lá coletados em melhorias, documentos e tickets para que as equipes responsáveis possam trabalhar corrigindo e melhorando esses games. “Ah, então é por isso que você conseguiu o estágio”, disseram alguns conhecidos e minha própria consciência. “Você já é profissional em comunicação, já fazia isso”. Pode ser.

Mas, alguns meses mais tarde, comecei a receber também algumas tarefas de QA (“Quality Assurance”, o processo de teste e polimento de jogos) e Game Design em si, ajudando a curar, lapidar e selecionar os jogos que seriam publicados.

Em nove meses de estágio, passei por lançamento de DLC (duas), organização de vários livestreams e entrevistas com desenvolvedores e designers, discussões de todos os tipos e muito, muito trabalho. Mas nunca tinha participado do lançamento de um jogo completo, “do zero”.

The Eternal Cylinder: um jogo de sobrevivência e aventura sobre o poder da diversidade

Até que, em 30 de setembro, The Eternal Cylinder, jogo desenvolvido pelo Ace Team, estúdio chileno, e publicado por nós, chegou a diversas plataformas. Eu havia trabalhado com o jogo desde a versão beta, seja coletando feedbacks, testando comportamento de inimigos, reformulando detalhes e até caçando “bugs”. Sem contar as várias horas jogando e explorando cada canto do mundo jogo, em busca de detalhes que pudessem enriquecê-lo ou de vídeos que seriam interessantes para as mídias sociais.

Eu esperava que as pessoas gostassem do jogo. Eu mesmo sou apaixonado por ele. Eu esperava os críticos enxergassem nele tudo que eu enxerguei – e eles enxergaram até um pouco mais. O que eu não esperava era ver meu nome entre os créditos de The Eternal Cylinder. Eu mesmo sequer chequei a versão final dos créditos quando o jogo foi lançado. Soube pelo Rique Sampaio, amigo jornalista de games, que pinçou meu nome ao terminar o jogo. Lá estava eu, entre os agradecimentos especiais. “Special thanks to”.

Se alguém me perguntasse em 2018 como eu me via dali a dois anos e meio, eu não saberia direito o que responder. Mas hoje, em outubro de 2021, eu digo que eu me vejo como o cara que, de tanto observar games, passou a fazer parte da história que contava. Prazer, eu sou o Dimas, Game Designer.

Dimas de Lorena Filho
É jornalista com mais de 10 anos de experiência em comunicação corporativa em empresas como Experian, Monsanto e Bayer. Largou da chupeta por causa do videogame. E fez mestrado só pra poder estudar "joguinho". Atualmente, estuda Game Design na Universidade de Ciências Aplicadas de Colônia, na Alemanha.

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