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O bilionário Elon Musk é alvo de uma carta assinada por mais de 50 intelectuais e acadêmicos de renome internacional em uma carta aberta. O documento, obtido pela coluna da jornalista Mônica Bergamo na Folha de São Paulo, reúne assinaturas de especialistas de países como Argentina, França, Estados Unidos, Austrália, Reino Unido, Espanha, Suíça e Itália, e pede apoio à soberania digital brasileira. Entre eles estão os economistas franceses Thomas Piketty, Gabriel Zucman e Julia Cagé, conhecidos por seus estudos sobre desigualdade e economia digital, a filósofa Shoshana Zuboff, da Harvard Business School, autora de obras importantes sobre a economia de dados, e o economista argentino Martín Guzmán, ex-ministro da Economia da Argentina. Entre os signatários brasileiros estão o ex-diretor-geral da FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), José Graziano, além de acadêmicos como Helena Martins, da Universidade Federal do Ceará, Marcos Dantas, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Sergio Amadeu Silveira, da Universidade Federal do ABC.

Os intelectuais apontam que o comportamento de Musk, ao adotar uma postura conflituosa com autoridades brasileiras, envia uma mensagem preocupante para o restante do mundo. A polêmica gira em torno das pressões que Musk tenta exercer contra o Brasil, em especial em relação às tensões entre sua empresa e o Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo o texto da carta, a situação reflete um “esforço mais amplo” de restrição à capacidade de nações soberanas definirem uma agenda de desenvolvimento digital que seja independente do controle de grandes corporações de tecnologia sediadas nos Estados Unidos, como o X, de Musk. De acordo com os signatários, a disputa entre a plataforma de Musk e o STF não é um caso isolado e sim um exemplo de como as big techs estão se posicionando como “governantes” em várias partes do mundo. Essa relação de poder, afirmam, representa uma ameaça às democracias de países que tentam se libertar da influência desmedida dessas corporações sobre o espaço digital. 

O embate Musk versus Brasil coloca em evidência uma questão crítica que afeta países em todo o mundo: a luta pela regulação do espaço digital. Na medida em que plataformas de tecnologia exercem um papel central na mediação da comunicação e no controle de dados, a independência dos governos de regular esses espaços tem sido extremamente desafiada. O controle das big techs sobre as infraestruturas digitais tem permitido que elas influenciem não só o comércio, mas também o debate público e a própria dinâmica política, tornando urgente a adoção de políticas que garantam que essas plataformas operem sob a lei de cada país, respeitando suas particularidades. Além disso, ações como as de Musk sinalizam um apoio velado a movimentos políticos mais conservadores e de extrema-direita, alimentando uma perigosa polarização social que mina as bases das democracias modernas.

Ao convocar “todos aqueles que defendem valores democráticos” a apoiar o Brasil, os signatários da carta pedem uma resposta às tentativas de interferência de Musk na soberania digital de nações. Acredita-se que este episódio em especial possa ser o prenúncio de novos embates entre governos soberanos e as grandes corporações tecnológicas, que têm resistido às tentativas de regulamentação local. O documento, que será oficialmente divulgado nesta terça-feira, dia 17 de setembro, tem como objetivo marcar o início de um debate global mais incisivo sobre o papel das big techs na política mundial e sobre as estratégias para proteger a soberania digital de países como o Brasil.

Leia a tradução para a língua portuguesa da carta:

Contra o Ataque das Big Tech às Soberanias Digitais

Nós, os signatários, desejamos expressar nossa profunda preocupação em relação aos ataques em curso das empresas Big Tech e seus aliados à soberania digital do Brasil. A disputa do Brasil com Elon Musk é apenas o mais recente exemplo de um esforço mais amplo para restringir a capacidade de nações soberanas de definir uma agenda de desenvolvimento digital livre do controle de megacorporações sediadas nos EUA.

No final de agosto, o Supremo Tribunal Brasileiro baniu o X do ciberespaço brasileiro por não cumprir decisões judiciais, exigindo a suspensão de contas que incitaram extremistas da extrema direita a participar de tumultos e ocupar as sedes do Legislativo, Judiciário e Executivo em 8 de janeiro de 2023.
Posteriormente, o presidente Lula da Silva deixou clara a intenção do governo brasileiro de buscar independência digital: reduzir a dependência do país de entidades estrangeiras para dados, capacidades de IA e infraestrutura digital e promover o desenvolvimento de ecossistemas tecnológicos locais. De acordo com esses objetivos, o Estado brasileiro também pretende forçar as empresas de big tech a pagar impostos justos, cumprir as leis locais e ser responsabilizadas pelas externalidades sociais de seus modelos de negócios, que frequentemente promovem violência e desigualdade.
Esses esforços têm sido alvo de ataques do proprietário da X e dos líderes de extrema direita, que reclamam sobre democracia e liberdade de expressão. Mas justamente porque o espaço digital carece de acordos regulatórios internacionais e democraticamente decididos, as grandes empresas de tecnologia operam como governantes, determinando o que deve ser moderado e promovido em suas plataformas.

Além disso, o X e outras empresas começaram a se organizar, juntamente com seus aliados dentro e fora do país, para minar iniciativas que visam a autonomia tecnológica do Brasil. Mais do que advertir o Brasil, suas ações enviam uma mensagem preocupante para o mundo: que países democráticos que buscam independência da dominação das big techs correm o risco de ter suas democracias perturbadas, com algumas big techs apoiando movimentos e partidos de extrema direita.
O caso brasileiro se tornou a principal frente no conflito global em evolução entre as grandes corporações de tecnologia e aqueles que buscam construir um espaço digital democrático e centrado nas pessoas, com foco no desenvolvimento social e econômico.

As empresas de tecnologia não apenas controlam o mundo digital, mas também fazem lobby e operam contra a capacidade do setor público de criar e manter uma agenda digital independente baseada em valores, necessidades e aspirações locais. Quando seus interesses financeiros estão em jogo, elas trabalham de bom grado com governos autoritários. O que precisamos é de espaço digital suficiente para que os Estados possam direcionar as tecnologias colocando as pessoas e o planeta à frente dos lucros privados ou do controle unilateral do Estado.

Todos aqueles que defendem valores democráticos devem apoiar o Brasil em sua busca pela soberania digital. Exigimos que as big techs cessem suas tentativas de sabotar as iniciativas do Brasil voltadas para a construção de capacidades independentes em inteligência artificial, infraestrutura pública digital, gestão de dados e tecnologia em nuvem. Esses ataques minam não apenas os direitos dos cidadãos brasileiros, mas também as aspirações mais amplas de cada nação democrática de alcançar a soberania tecnológica.

Também pedimos ao governo do Brasil que seja firme na implementação de sua agenda digital e denuncie as pressões contra ela. O sistema da ONU e os governos ao redor do mundo devem apoiar esses esforços. Este é um momento crucial para o mundo. Uma abordagem independente para recuperar a soberania digital e o controle sobre nossa esfera digital pública não pode esperar. Também há uma necessidade urgente de desenvolver, dentro do quadro da ONU, os princípios básicos de regulação transnacional para acessar e usar serviços digitais, promovendo ecossistemas digitais que coloquem as pessoas e o planeta à frente dos lucros, para que esse campo de provas das Big Tech não se torne prática comum em outros territórios.

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