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Aproveitarei esta jornada dominical tão especial para compartilhar um pouco de uma leitura deliciosa, sobretudo para quem, como eu, tem curiosidade de olhar um pouco pelas frestas indiscretas do tempo e observar o passado.

 Vamos falar de forma leve, e apenas um pouco, sobre conceitos que envolveram a noção de nobreza entre os gregos antigos? Nossas máquinas do tempo serão as memórias de Werner Jaeger e Aristóteles.  Eu li, agora conto um pouco para vocês.

Entre os gregos, a educação cumpria o papel de integrar a própria tradição e se revestia de importantes imperativos da moral coletiva interna: honrar aos deuses, honrar pai e mãe e respeitar os estrangeiros; e preceitos da moral coletiva externa: regras de prudência para a vida, transmitidas via oral séculos afora.

Consequência lógica da aquisição de conhecimentos e saberes é o surgimento da classe aristocrática na Grécia primitiva. A elevação moral pela educação faz nascer a ideia de um ser superior: espécie de nata social distinta dos demais.

Esse homem deverá encarnar a aristocracia local, que é, naquele tempo, a classe mais espiritualizada de uma nação. Mais tarde, na Grécia, essa formação mais elevada do espírito  receberá uma sigla: Paidéia, que está relacionada à educação e à consciência pedagógica da nobreza.

Outro tema importante sobre a formação da aristocracia na Grécia é a ideia de arete. Em língua portuguesa, seria algo equivalente à palavra virtude, e estava relacionada, na Grécia, ao ideal cavaleiresco, a uma conduta cortês distinta e ao heroísmo guerreiro. A arete é a unidade superior que reúne todas as características de excelências humanas.

A Ilíada e a Odisséia, de Homero,  são o registro mais antigo da cultura aristocrática entre os gregos. Para Homero, arete designa a excelência humana e a superioridade de semideuses. A arete é um atributo próprio da nobreza: não há aristocrata ou nobre, quando não há excelência de caráter.

Nos relatos homéricas, a arete também está ligada à força física e à força de caráter, mas está para além disto! A Odisseia exalta sobretudo a astúcia e a prudência de Ulisses, seu personagem principal.

Em estreita síntese, arete tem o sentido predominante de atributo de um homem nobre, que, tanto na vida como na guerra, rege-se pelas normas corretas de conduta que não são inatingíveis pelos homens comuns. São as mais distintas virtudes inacessíveis ao homem vulgar, com as exigências de coragem e virilidade (arete varonil).

Nos poemas de Homero, a arete encarna o sentido de dever, como característica essencial do homem nobre e elevado. A distinção principal do homem nobre em face dos demais é o sentimento do dever e o orgulho por cumpri-lo.

Werner Jaeger ensina que o domínio da palavra expressa a soberania do espírito e é demonstrada na Odisséia como o contraste entre a virtude de Ulisses, que dominava a palavra e a astúcia; e a virtude de Ajax, homem de ação.

Um dos significados da palavra arete está relacionado à honra. Segundo Aristóteles, citado por Jaeger,  a honra é a expressão natural da medida ainda inconsciente da arete. Homero declarou que a negação à honra por um homem seria a maior tragédia humana, de sorte que, para os heróis, a ânsia pela honra era um desejo insaciável.

A honra

Os gregos compreendiam a honra como a valorização pública da conduta nobre, entendendo-a como a aspiração pessoal ao ideal, ao suprapessoal, onde começa o valor, o heroísmo.

Uma personagem complexa e controvertida é Aquiles. Em nome de sua ambição pessoal, Aquiles se indigna contra os gregos e se recusa a prestar-lhes auxílio. A ambição pessoal de Aquiles à honra atenta contra o próprio ideal coletivo dessa experiência. A tragédia final de Aquiles na Ilíada talvez represente a moral pedagógica da abdicação do herói à sua pátria e à arete coletiva, que impulsionava a aliança dos aqueus contra Troia. Aquiles atirou-se na fogueira da vaidade pessoal.

Segundo Jaeger, a ambição pela honra não representa mais um grande mérito pelos gregos no decurso do tempo. Tornou-se mais ambição pessoal. Porém, nos tempos da democracia grega, ocorre novamente o reconhecimento público da honra na política dos Estados e na relação entre os indivíduos.

O ápice do reconhecimento da moral naqueles tempos se representa na palavra grega megalopsychos, que significa o homem magnânimo, na ética de Aristóteles. 

A beleza

Jaeger diz que que a auto-estima de uma pessoa se externaliza na defesa dos amigos, no sacrifício pela pátria e na renúncia a bens materiais e a honrarias. Jaeger fala sobre o ideal aristotélico de beleza, sendo esta mais um desdobramento das virtudes do heroísmo.

Jaeger conclama a fórmula “fazer a sua beleza”, na qual se expressam todas as virtudes capazes de elevar os motivos íntimos da arete na cultura helênica: a subordinação a uma beleza mais elevada. Isto se presentifica, por exemplo, na luta dos heróis por gravar seu nomes na história e no trabalho dos poetas e legisladores pelo mesmo motivo: deixar para a memória histórica  a criação imortal de seu espírito.

É sempre emocionante abrir um livro e, dentro dele, encontrar um portal aberto para viver algumas experiências do passado. Werner Jarger e de Aristóteles têm esse tom de contação de história e de roda de conversa. É sempre uma delícia bisbilhotar o passado pelas lentes deles!

Belo o conceito de arete…

Fontes:

Paideia: A formação do homem grego https://a.co/d/8Lgg2Ta

Ética a Nicômaco https://a.co/d/391XYlr

Shirlei Florenzano Figueira
Shirlei Florenzano, advogada e professora da Universidade Federal do Oeste do Pará - UFOPA, mestra em Direito pela UFPA, Membro da Academia Artística e Literária Obidense, apaixonada por Literatura e mãe do Lucas.

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