Sabemos que, na Amazônia Legal, nossa sociobiodiversidade a partir do açaí, cacau e outros gera mais empregos e renda do que boi. Que com eficiência agrícola se produz mais, com menos terra, sem desmatamento. Que áreas protegidas prestam serviços ambientais de valor planetário. Que a Zona Franca de Manaus poderia ser o Vale do Silício da bioeconomia. E que o Brasil poderia ser o tal “país do futuro”.
Só que não adianta falar de desenvolvimento sustentável sem antes resolver a cultura do ilegalismo que impera na região, onde legal é o ilegal, onde aqueles que grilam terras, derrubam árvores ou contaminam rios ditam regras como “cidadãos de bem” que movem as economias locais em nome do progresso.
No quarto país mais perigoso do mundo para defensores ambientais, não se pode normalizar o fato de que, dos 300 assassinatos de ativistas na Amazônia brasileira, apenas 14 foram a julgamento na última década (Human Rights Watch, 2019).
Amazônia Legal, só nos mapas. Ela está mais para a Chicago gângster dos anos 1920. Mata-se e desmata-se, num conluio entre atores privados e públicos. Uma minoria, porém, empoderada e dominante, detém um quinhão do maior patrimônio dos brasileiros a serviço da humanidade. Se a Amazônia fora da lei fosse um país, estaria entre os dez maiores emissores de gases de efeito estufa só pelo desmatamento ilegal.
Não é que “onde existe muita floresta também existe muita pobreza”, como disse o ministro Joaquim Leite (Meio Ambiente) na COP26, mas sim que esse modelo que desmata está nos deixando mais pobres. Os dados do IPS Amazônia 2021 identificam os piores Índices de Progresso Social justamente nos municípios que mais desmataram.
Se Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB) deixaram a desejar na área ambiental, o que era ruim ficou pior sob Jair Bolsonaro (PL), com o menor número de multas do Ibama em 20 anos e a maior taxa de desmatamento desde 2006 (Prodes).
Não se acaba com o ilegalismo legalizando o ilegal, com projetos para liberar garimpos ou boi em reservas. Ou para premiar grileiros com descontos de até 98% para aquisição das terras públicas surrupiadas. É insistir num modelo que deu errado, sem mais tempo para errar. Compromete-se tudo para favorecer só alguns que se apropriam do que são de todos.
Quem quer fazer a coisa certa é punido. Como não consegue concorrer com o preço baixo da produção ilegal, quebra ou muda de lado, desestimulando investimentos responsáveis e a própria existência de um mercado como deveria ser. Em vez de empreendedores, o que temos atraído para a região são cartéis.
Já vimos o desmatamento na Amazônia cair mais de 80% entre 2004 e 2012, enquanto o agronegócio e a economia cresciam. Só que apenas lampejos de comando e controle não bastam.
Como ente soberano, é hora de a sociedade brasileira chamar a responsabilidade para si, pelo cumprimento das leis, pela questão socioambiental acima de direitas e esquerdas, como política de Estado, efetiva, que consolide uma nova cultura em que boas práticas predominem.
Sem uma mobilização nacional neste sentido, fica difícil falar em Amazônia Legal. E sustentável.
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