0

Coincidência ou não, o mês de julho colocou-me diante de vários desafios, constatações, indagações, expectativas e, ao mesmo tempo, de renovação e retorno ao ensino/aprendizagem e à reflexão sobre o Bairro do Reduto. Tive a honra de ser convidada pela União Nacional por Moradia para contribuir no Ciclo de Oficinas de Formação sobre O Direito à Cidade na Amazônia, para lideranças do Movimento, abordando a questão do Planejamento e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, constantes da Nova Agenda 2030 da ONU.

No mesmo período acompanhei on-line a II Audiência Pública sobre o Porto Futuro, conduzida por Úrsula Vidal, Secretária de Estado de Cultura e no dia 27/07/2021 a mídia e as redes mostrando o ato de assinatura do compromisso de cessão por parte da Companhia Docas do Pará – CDP para o Governo do Estado/Município de Belém de cinco dos seus galpões, concretizando a fase inicial do que fora anunciado anteriormente. Projeto interessante que promete revitalizar aquela área portuária e seu entorno, anteriormente tão abandonado, oferecendo novos postos de trabalho, lazer e reconhecimento da história portuária de Belém aos turistas e aos moradores da cidade.

Moradora por mais de quarenta anos do Reduto e tendo vínculos afetivos anteriores ao tempo de moradia, ainda que reconhecendo a necessidade de intervenção para recuperação e valorização do Bairro dado seu estado de abandono, fiquei me questionando sobre os impactos a serem sofridos no pouco que resta de prédios e monumentos históricos  daquele que, embora poucos tenham na memória, já foi considerado concorrente do Mercado do Ver-o-Peso, do Comércio da João Alfredo, o Bairro Operário, abrigando as primeiras fábricas de Belém e teve uma rua chamada Rua dos Mercadores, atual 28 de setembro e suas Vilas Operárias. O início da semana trouxe um alerta em uma nota de jornal de que os investidores de um shopping do Bairro estariam aguardando a concretização da lei que mudará o gabarito no Reduto para fazer o anúncio da compra da antiga área da Phebo, fato já algum tempo fartamente anunciado e comentado em rede e que alerta para o movimento de cobiça do mercado imobiliário para a área do Reduto, cobiça essa somada à área da Orla da Cidade, com a proteção de muitos membros da Câmara Municipal, capitaneados por seu presidente,  defendendo a derrubada do veto sobre a liberdade de construir na área, em um momento delicado em que se discute a nova eleição de membros para o Conselho de Desenvolvimento Urbano – CDU, responsável pela revisão do Plano Diretor de Belém.

Juntando as pontas dos acontecimentos com a reflexão sobre os ODSs, destaco o décimo primeiro dos dezessete Objetivos Sustentáveis – “Tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis” e a meta 11.4 do ODS 11 – “Fortalecer esforços para proteger e salvaguardar o patrimônio cultural e natural do mundo”, logicamente que com reflexo nas cidades e assentamentos, para a partir do local atingir o global e vice-versa. Como garantir que a memória e história da cidade seja preservada, que os investimentos a serem feitos, ainda que reconhecidamente necessários, não destruam ao invés de preservar o pouco que resta do patrimônio cultural e natural do Bairro e da Cidade, que esforços serão garantidos para o Reduto, que já foi um bairro operário, seja inclusivo, seguro, resiliente e sustentável?

*Escada da Antiga Fábrica PHEBO. Foto de Auriléa Abelem

*O artigo acima é de total responsabilidade da autora.

Auriléa Gomes Abelém
Socióloga, professora aposentada pela Universidade Federal do Pará – UFPA, com Mestrado em Planejamento do Desenvolvimento, UFPA/NAEA. Atuou como Consultora de vários órgãos governamentais. Tem experiência na área de Ciência Política com ênfase em Planejamento e Políticas Públicas Sociais: administração, magistério, pesquisa, planejamento e avaliação. Publicou o livro “Urbanização e Remoção: porque e para quem?”, vários artigos e capítulos de livros. Sócia fundadora cadeira nº. 44 do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, cujo patrono é Roberto Santos e titular do Conselho Fiscal do IHGP-PA, é diretora da Associação de Amigos do Patrimônio de Belém – AAPBEL e coordenadora adjunta do Fórum de Entidades em Defesa do Patrimônio Cultural Brasileiro – PA, além de colaboradora do Fórum de Reforma Urbana/PA. E-mail: aabelem@globo.com

    Marajoara sofre há 14 anos com tumor no olho

    Anterior

    Hélio Gueiros no Mutunuy

    Próximo

    Você pode gostar

    Comentários