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O relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembleia Legislativa do Pará que investigou, em 44 dias, a existência de grupos de extermínio e milícias no Estado, nas 226 páginas de seu relatório final cobra o indiciamento de mais de 60 policiais envolvidos. O documento é inédito e impactante. Confirmou a atuação de três grupos de extermínio na Região Metropolitana, com a participação de policiais, que eliminam inimigos de seus contratantes, reprimem posseiros e “dão segurança” a estabelecimentos comerciais. Trata-se do primeiro reconhecimento institucional da atuação de tais ações criminosas no Pará. A CPI recomenda, na sua conclusão, a ocupação dos territórios dominados pelas milícias, em parceria do Governo do Estado com a União e as Forças Armadas; a valorização dos policiais, inclusive por meio de política habitacional e criação de lei que defina os critérios de promoção por merecimento e antiguidade; autonomia financeira da Ouvidoria de Segurança, da Corregedoria da PM e dos programas de proteção a vítimas de ameaça; incremento da autonomia da Corregedoria da Polícia Civil; além da estruturação da Promotoria de Justiça Militar e a definição de critérios para a divulgação de informações à imprensa, a fim de evitar a “espetacularização” das notícias de violência. 

O relatório foi entregue oficialmente, ontem de manhã, ao presidente da Alepa, deputado Márcio Miranda(DEM), ao secretário de Estado de Segurança Pública, general Jeannot Jansen; ao promotor de Justiça Militar, Armando Brasil, representante do Ministério Público do Estado; e à Ouvidora de Segurança Pública, Eliana Fonseca, no auditório João Batista. O secretário informou na hora que “a Segup vai encaminhar o documento aos canais competentes para as devidas providências, como a Corregedoria, Polícia Civil, Polícia Militar e Ouvidoria do Sistema de Segurança, além de entidades de diversas esferas da sociedade”

A CPI não identificou quem efetuou os disparos em quatro de novembro de 2014, mas o relatório lido em parte pelo deputado Carlos Bordalo aponta o Sargento Rossicley Silva, que, poucas horas antes da chacina que vitimou 10 pessoas na periferia de Belém, conclamou os militares, via Facebook, a darem uma “resposta” ao assassinato do Cabo Antônio Marcos Figueiredo, o “Pet”, que comandava uma milícia no bairro do Guamá. Também foi pedido o indiciamento do militar Otacílio José Gonçalves Queiroz, o “Cilinho”; de Josias Siqueira da Conceição, ex-cabo do Exército; de Valmir ou Valdemir Oliveira, o Cabo Oliveira, também conhecido como “Canana”; de Romero Guedes Lima, o Cabo Lima da PM, conhecido como “Montanha”; e dos indivíduos conhecidos como “Gaspar” ou “Gasparzinho”, “Zé da Moto” e ” Marcelo da Sucata”.

Um grupo especial de policiais civis e militares está investigando os homicídios perpetrados em novembro do ano passado, no bairro da Terra Firme, em Belém, após a morte do cabo da PM Antônio Figueiredo. A Divisão de Homicídios instaurou inquérito para investigar isoladamente cada uma das mortes. Para executar esse trabalho, foram designados seis delegados, com reconhecida experiência na apuração de casos dessa gravidade, que contam com apoio de mais de 40 policiais, entre investigadores, escrivães, peritos criminais, papiloscopistas e pessoal de apoio. Todas as fases da investigação estão sendo acompanhadas por três promotores de Justiça, especialmente designados para este fim. 

A Juventude do Movimento Sem Terra (MST) aproveitou a entrega do relatório para manifestar repúdio às chacinas de adolescentes e jovens negros, indígenas e pobres nas periferias do Pará. Em razão de parte dos integrantes do movimento ter sido impedida de entrar no auditório – que já estava completamente lotado e não comportava mais pessoas -, houve um protesto pacífico dentro e fora do prédio da Alepa, com o uso de batuques e bandeiras. 

O presidente da Casa, deputado Márcio Miranda, abriu a sessão parabenizando a dedicação de todos os membros da CPI, que, mesmo em recesso legislativo, se mantiveram trabalhando em esforço concentrado a fim de entregar o resultado das investigações no prazo regimental. Márcio Miranda frisou que a apuração dos fatos é da maior importância para a paz social.

Em seguida o deputado Augusto Pantoja(PPS), presidente da CPI, expôs o andamento dos trabalhos. Para ele, “o que ocorreu reflete uma realidade nacional, que torna todos reféns do crime e da violência. Não podemos deixar que a juventude seja interrompida e ceifada por grupos de extermínio ou milícias”, conclamou o parlamentar, que assim se despediu do mandato, já que não pleiteou a reeleição e vai assumir cargo no Poder Executivo, o Núcleo Gestor do Parque do Utinga. 

Na sequência, o deputado Carlos Bordalo(PT), relator, apresentou uma síntese do relatório, acentuando o empenho e a participação dos órgãos do Governo do Estado nos trabalhos da CPI, e entregou cópias do documento aos representantes dos movimentos sociais que estavam presentes. “Não encontramos obstáculos para desenvolver as atividades da Comissão Parlamentar de Inquérito, por isso agradecemos a colaboração das diversas instituições, especialmente as que integram o Sistema de Segurança Pública do Pará”. 

O deputado Edmilson Rodrigues (PSOL), autor do requerimento que originou a CPI, agradeceu o voto de confiança recebido de mais de 100 entidades do movimento social que pediram a criação da Comissão, em razão da chacina do último dia quatro de novembro, em Belém, e cobrou que o Executivo e o Ministério Público do Estado deem continuidade às investigações. Salientou que os policiais identificados como envolvidos representam a minoria dos efetivos das Polícias Civil e Militar e comparou-os a “tumores” que precisam ser extirpados para salvaguardar as corporações e os demais trabalhadores que delas fazem parte. Edmilson propôs, ao final, a criação de um seminário entre movimentos sociais, governo e sociedade civil, a fim de criar um Sistema Único de Segurança Pública destinado a articular as ações federais, estaduais e municipais na área da segurança pública e da justiça criminal.

Compareceram também à solenidade os demais membros titulares da CPI: deputados Tetê Santos (PSDB); e Chicão (PMDB), as vereadoras de Belém Marinor Brito (PSOL) e Sandra Batista (PCdoB), representantes do Centro de Defesa do Adolescente (Cedeca) da República de Emaús, da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH), da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase) e da Comissão Justiça e Paz da CNBB Norte II. 

Devemos frisar que o relatório destaca a importância da adoção de medidas e ações na área social e, além de nos oferecer a possibilidade para abertura de investigações, também será suporte para o inquérito que está em curso na Polícia Civil. Acredito que o dia de hoje baliza uma nova etapa em busca da tranquilidade social no Estado”, afirmou o secretário de segurança, Jeannot Jansen, segundo quem “os objetivos da Assembleia Legislativa e do Governo do Estado, em relação à defesa social, são idênticos e estão plenamente colimados. O relatório é um exemplo, uma representação material disso”

Confiram o inteiro teor do relatório final da CPI das Milícias aqui.
Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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