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Você já ouviu falar em Educação em Direitos? Nos Objetivos do Milênio estabelecidos pela ONU por meio da Agenda 2030? Parece algo genérico e distante, coisa de estudiosos engravatados em gabinetes refrigerados e temas que não possuem qualquer conexão com nosso dia-a-dia.

Segue uma boa notícia. Não é bem assim. Felizmente.

Temos uma das mais avançadas e modernas Constituições Federais do mundo. Possui em sí elencadas uma série de direitos e garantias individuais, coletivos e sociais, e instrumentos de concretização material de tais direitos. Um destes instrumentos mais tradicionais é o Sistema de Justiça, no qual se destaca a Defensoria Pública.

Mais do que velar pelo Acesso à Justiça, que já é uma tarefa hercúlea, conforme o artigo 134 da carta magna, o novo desenho institucional se direciona para, como expressão e instrumento do regime democrático, promover os Direitos Humanos de maneira também extrajudicial, visando o alcance de uma ordem jurídica justa e a redução de desigualdades sociais e regionais.

E neste contexto que se destaca sua atribuição em educação em direitos, prevista expressamente em sua Lei Orgânica Federal 080/94 e Estadual 054/06. É esta formidável faceta que verdadeiramente mais aproxima o Estado-Defensor da população de maneira direta e efetiva. E com enorme economia de recursos.

Mas, o que é educação em direitos? Sem maiores arcabouços teóricos ou conceituais, explica-se com exemplos práticos e verdadeiramente transformadores, que é o que interessa o cidadão e a cidadã fora dos debates acadêmicos.

Quando se realiza um workshop, uma palestra, uma roda de conversas, uma audiência pública, uma consulta pública, uma entrevista na rádio, na televisão ou em Podcast, esclarecendo sobre determinados temas com viés jurídico ou não, que digam respeito a rotina das pessoas, isso é Educação em Direitos em seu aspecto não-formal (fora dos curriculos tradicionais da academia e das escolas)

E neste ponto, o céu é o limite. Abordar temas, orientando e empoderando pessoas sobre seus deveres e direitos, como Violência Doméstica e de Gênero, Racismo e Machismo Estruturais, Educação Financeira e Fiscal, Direito do Consumidor e à Saúde, Educação Ambiental, Liberdade Individual e Religiosa, Regularização Fundiária e Direito à Terra, Métodos de Solução Extrajudicial de Conflitos, etc. As possibilidades são diversas.

O mais interessante nesta moderna forma de fazer Justiça é que a atuação deve ser preponderantemente horizontalizada e transversal. Não é do alto do conhecimento jurídico que em tom professoral se realiza a verdadeira educação em direitos. O Juridiquês perde relevancia para também realizar um processo de transmissão de idéias que de fato sejam absorvidas e compreendidas por todos e todas.

O uso de linguagem simples também não basta. É preciso sensibilidade e um despir-se de vaidades para um processo de escuta efetiva, após o amplo exercício do direito de fala e de manifestação. E perpassa por diversas áreas de conhecimento, de forma transversal, não se restringindo a área jurídica em sí. Além de uma atuação em rede e organizada com diversas entidades estatais e da sociedade civil.

A educação em direitos é uma verdadeira troca de experiências que promove aprendizados recíprocos entre todos os envolvidos. Quanto mais se “ensina”, mais e mais se aprende. E todos os atores desse processo, que é permanente, tornam-se cada vez mais empoderados e concientes de seus direitos e potencialidades. Tem um caráter verdadeiramente emancipatório e democratizante em espaços coletivos. É o modo preconizado por Hannah Arendt, no indispensável e básico Direito a ter Direitos.

Existem experiências notáveis em todo Brasil. Diversos Estados possuem cursos de formação de Defensores Populares, nos quais especialistas em diversos temas realizam processo de escuta seguido de capacitação/orientação de lideranças populares, para que estas sejam difusoras em sua própria comunidade e a partir de sua própria experiencia e lugar de fala, de noções de cidadania, conhecimentos sobre direitos e mecanismos para que os mesmos sejam efetivados na esfera judicial e sobretudo extrajudicial.

A articulação dos diversos braços do Estado também é fundamental para atuação integrada em em rede. Recente parceria firmada entre as Defensoria Pública Estaduais e o Ministerio dos Direitos Humanos e da Cidadania do Governo Federal, denominada Caravana de Direitos Humanos, prevê uma série de incursões em locais de pessoas privadas de liberdade. Diversos órgãos irmanadados na identificação de violação de direitos e medidas para sua superação e medidas preventivas, a partir da escuta qualificada e troca de conhecimentos. 

E o que isso tem a ver com a ONU? Tudo. A Organização das Nacões Unidas estabeleceu 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável do Milênio – ODS – Chamados de Agenda 2030. Dentre os desafios destacam-se o Objetivo 1: Erradicação da Pobreza, Objetivo 10: Redução das Desigualdades Sociais, Objetivo 16: Paz, Justiça e Instituições Eficazes, e 17: Parcerias e Meios de Implementação.

Tais objetivos foram concebidos sem dúvida como um meio para a consecução do sonhado Desenvolvimento Sustentável: Saude e Bem Estar, Educação de Qualidade, Acesso a Água Potável e Saneamento, Energia Limpa e Acessível, Cidades e Comunidades Sustentáveis, Ação Contra Mudança Global do Clima visando garantir qualidade de vida e proteger o planeta e promover sociedades pacíficas e inclusivas até 2030.

A Agenda 2030 é um marco na diplomacia dos países desenvolvidos e em desenvolvimento, e a busca pela sua concretização passa necessariamente pela Educação em Direitos e a Defensoria Pública é a estrutura estatal que possui em seu DNA a missão e a sensibilidade para contribuir decisivamente nessa tarefa, em articulação com movimentos sociais urbanos e rurais, o Poder Público e empresas de todos os portes social e ambientalmente responsáveis, entidades em geral e todos e todas que estão comprometidos e comprometidas com tais valores democráticos, de desenvolvimento da cidadania e do progresso responsável e humanizado.

Bruno Braga Cavalcante
Defensor Público do Estado do Pará, Pós Graduado Lato Sensu em Direito Público e Privado, Especialista em Gestão Pública, Coautor de obras jurídicas e articulista.

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