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Ao invés de auxiliar a Prefeitura de Belém no necessário debate para revisão do Plano Diretor, a serviço de todos os cidadãos, a Câmara Municipal prefere atropelar o rito legal e toda a sociedade, e tenta aprovar ao arrepio da Constituição e de toda a legislação projeto de lei feito de encomenda para o mercado imobiliário. No ano passado o então prefeito Zenaldo Coutinho vetou o Projeto de Lei Complementar 01/2020, do vereador Mauro Freitas, que dispõe sobre matéria ambiental urbanística sem qualquer estudo técnico e altera dispositivos legais do parcelamento, ocupação e uso do solo do município. Hoje, a Comissão de Justiça da Câmara reuniu e, quarenta minutos depois de começada a sessão, o projeto foi incluído na pauta do plenário. Só não foi votado por conta da pressão popular nas redes sociais. Apenas a bancada do PSol, à frente o líder do Governo, vereador Fernando Carneiro, se manifestou expressamente contra. 

Recentemente o promotor de Justiça Raimundo Moraes, da 3ª PJ de Meio Ambiente, Patrimônio Cultural, Habitação e Urbanismo de Belém, advertiu formalmente os vereadores quanto à inconstitucionalidade da iniciativa e o potencial de causar danos ambientais urbanísticos de grande impacto. Moraes alertou sobre os vícios de natureza jurídica que o processo legislativo e o conteúdo do PLC apresentam: inclui exceção à proibição de parcelamento do solo em Zonas de Preservação Ambiental e em Zonas de Interesse Urbano Especial, para áreas e empreendimentos que já se encontram parcelados e loteados antes da vigência da Lei nº 8.655/2008 (Plano Diretor de Belém). Trata-se, de acordo com o Ministério Público do Estado do Pará, de tentativa sub-reptícia de dar ares de legalidade a parcelamentos de solo ou loteamentos executados em desacordo com a legislação vigente.  

Todas as entidades de defesa do patrimônio histórico, arquitetônico, artístico, cultural e ambiental de Belém execram esse projeto, que foi aprovado em 2020 na surdina, sem debate, em bloco, sem sequer votação nominal, o que planejavam repetir hoje. Acontece que o Plano Diretor não é uma lei simples, e sim um projeto de cidade, um pacto e plano urbanístico que contém os principais instrumentos de ordenamento territorial (zoneamento e fixação dos índices urbanísticos aplicáveis e dos usos permitidos em para cada terreno). Tem que ser fruto de estudos técnicos e ampla discussão com os diversos segmentos sociais, e não pode ser alterado via processo legislativo ordinário. O processo de planejamento participativo deve ser conduzido pelo prefeito Edmilson Rodrigues, e ser encaminhado para a Câmara Municipal aprovar ou rejeitar, não pode sequer fazer emendas. 

Em vídeo gravado após a sessão de hoje, a bancada do PSOL contou a manobra malograda e afirmou que “permitir a construção de grandes empreendimentos, como depósitos e atacadões, na orla de Belém é um crime. O projeto aprovado ano passado, e corretamente vetado pelo ex-prefeito, não teve nenhum debate com a população, nem com os conselhos de meio ambiente, engenharia ou desenvolvimento urbano. Votaremos pela manutenção do veto, que inclusive está amparado em estudos técnicos da Secretaria de Urbanismo e, já foi recomendado pelo Ministério Público do Estado. Por isso, o vereador Fernando Carneiro, líder do PSOL, e as vereadoras Enfermeira Nazaré Lima e Lívia Duarte, votarão pela manutenção do veto, contra a especulação imobiliária, em defesa do nosso patrimônio. 

O MPPA já apontou o principal vício, de inconstitucionalidade, por contrariar a Lei Orgânica do Município de Belém, a Constituição Estadual e a Constituição Federal, no que tange à obrigatória participação popular e existência de estudos técnicos sobre a matéria.  

É dever de todos os cidadãos focar nos atos de vereadores e impedir que entreguem Belém à especulação imobiliária. O calor infernal que aflige os moradores e visitantes da cidade tem origem, em parte, na impune invasão da orla há décadas, impedindo o acesso ao vento e à vista do rio, detonando a qualidade de vida na cidade.  

Em 2012, apenas 04 anos após a vigência da Lei 8.655/2008-Plano Diretor, o setor empresarial do mercado imobiliário e seus representantes na Câmara apresentaram um conjunto de Projetos de Lei propondo diversas alterações pontuais no Plano Diretor, visando atender interesses particulares do setor. Naquele momento, a mobilização social, com apoio de alguns vereadores e do Ministério Público Estadual, conseguiu evitar essa tentativa antidemocrática e totalmente ilegal de mudar o ordenamento urbanístico de Belém, sem os necessários estudos técnicos e audiências públicas, que cabe ao Poder Executivo encaminhar. Em 2018, o Plano Diretor de Belém completou 10 anos e, como previsto em lei, a gestão municipal lançou a revisão ainda em 2019, que está em andamento.  

Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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