Em sua criação em 3 de maio de 1900, a Academia Paraense de Letras imortalizou, na qualidade de patrono, um jovem poeta e jornalista que nos deixara materialmente em 1897. Estou a falar de José da Natividade Lima, poeta paraense, nascido em 1871. Esse imortal escolhido pela APL, que hoje me concede a honra de a sua história me juntar, foi caixeiro, guarda-livros, promotor público – atividade à qual me conecto familiar e pessoalmente. Trabalhou no Diário de Notícias e em A Província do Pará, do qual era editor-chefe, juntamente com o senador Antônio José de Lemos. Junto com Leopoldo de Sousa e Guilherme de Miranda, entre outros, Natividade Lima criou a Mina Literária em 1894. Também organizou seu único livro de poesia, Musa Boêmia, editado postumamente em 1920 graças ao empenho dos seus amigos Olavo Nunes e J. Eustachio de Azevedo. Essa proeza literária tornou Natividade Lima, como dito, o patrono da Cadeira n.º 32 da APL, ocupada posteriormente por Olavo Nunes, Bruno de Menezes, Alonso Rocha e, por último, Ubiratan de Aguiar, quatro maravilhosos literatos.
O primeiro a ocupar a Cadeira de n.º 32 foi um dos fundadores da Academia Paraense de Letras, o imortal Francisco Olavo Guimarães Nunes, nascido em Vigia, vila de Curuçá, nos idos de 1871, que nos deixou em 1942. O primeiro imortal foi levado para Belém do Pará, onde ficou sob os cuidados do tio Bertoldo Nunes. Olavo Nunes dedicou-se ao ensino e, juntamente com Euclides Dias, fundou o colégio Minerva. Foi nomeado também promotor público em Maracanã, então Cintra. Embora seu nome não conste nas faculdades de Direito da época, Olavo Nunes retornou a Belém como serventuário de Justiça, titular de um cartório judicial. Isso se deu provavelmente porque, na época, pela falta de bacharéis em Direito, pessoas que não eram da área jurídica, como ocorrera com meus ancestrais no Rio Grande do Norte, tinham reconhecido o dom extraordinário de bem desempenhar o ofício de defesa da sociedade. Escritor e jornalista, o inesquecível Olavo Nunes pertenceu à Mina Literária e também escreveu sob os pseudônimos de José Boêmio, José do Egito, Carlos Heitor e Carlos Augusto. De sua descendência, registra-se seu filho Olavo Guimarães Nunes Filho, que trilhou o mundo das Letras como advogado, escritor e poeta.
O segundo a ocupar a Cadeira n.º 32 foi Bento Bruno de Menezes Costa, belenense nascido em 1893 no Jurunas. Bruno de Menezes era seu pseudônimo. Filho de pais pobres, teve pouca oportunidade de segui a vida estudantil, só podendo concluir o curso primário. Por destino da divindade e pelas circunstâncias da vida, Bruno de Menezes foi aprendiz de encanador juntamente com Tó Teixeira, um grande nome da cultura popular paraense, que, impactado pela linda história, tornou-se seu mentor e mais tarde seu mestre de violão. Na oficina de seu mentor, o imortal, em contato com obras literárias, seu destino encontrou. Tornou-se autodidata e para sempre se apaixonou pelos livros.
Apesar de uma carreira pública invejável no Poder Executivo do Estado do Pará, não descurou do amor às Letras, e essa paixão deu grande frutos. Sua história passou a imortalizá-lo, pois fundou a revista Belém Nova, que se tornou o órgão propagador da nova corrente poética vinda da Semana de Arte Moderna de 22. De acordo com Joaquim Inojosa, historiador do Modernismo no Norte e no Nordeste, Bruno de Menezes foi consagrado pioneiro desse brilhante movimento no Pará, e com letras seu lugar de imortal conquistou. Membro da Academia Paraense de Letras desde 1944, ocupou a cadeira que hoje me enche de luz, tendo sido presidente da APL e membro do Instituto Histórico e Geográfico do Pará e da Comissão Paraense de Folclore, feitos que marcaram sua imortalidade.
O terceiro ocupante da Cadeira n.º 32 foi Raimundo Alonso Pinheiro Rocha, nascido no Pará em 1926. Poeta desde jovem, Alonso Rocha escreveu vários poemas que o elevaram à nobreza literária, fazendo parte do principado dos poetas, consagrado com o título de quarto príncipe dos poetas paraenses por meio de uma árdua eleição em 1987. Apoiou a fundação da Academia dos Novos, consagrando jovens intelectuais paraenses; em 1963, tomou posse da Cadeira n.º 32 na Academia Paraense de Letras. Alonso Rocha conquistou vários troféus que culminaram com a sua eleição para Príncipe dos Poetas Paraenses em 1987. Além de sonetista por excelência, Alonso Rocha compartilhou o dom das letras com uma intensa atividade financeira e bancária, inclusive participando da luta sindical dos bancários.
Por último, temos o nosso saudoso jornalista e poeta Ubiratan de Aguiar, nascido em 1930. Ainda está latente a dor da despedida daquele que adotou o pseudônimo Pierre Beltrand. Destaco o tributo representado por sua filha Margareth Aguiar e seu neto Pierre de Aguiar Azevedo, aqui presentes para que em letras e voz eu possa homenagear o meu antecessor, que em vida também terei de honrar. Aos 17 anos de idade, teve seu primeiro emprego como repórter no jornal O Estado do Pará, um dos três jornais mais importantes do Estado. Pioneiro do colunismo social no Pará, Pierre criou o Colunista Social, que se espalhou pelo Brasil. Ubiratan de Aguiar também foi produtor e apresentador do Pierre Show na TV Marajoara. Além de jornalista, tendo atuado por 75 anos, também desempenhou a função de Letras como advogado cível e trabalhista durante 55 anos. Deixou-nos na dor incessante da saudade em janeiro do corrente ano, mas não sem antes gravar seu nome na imortalidade pelas Letras como membro da Academia Paraense de Letras, na Cadeira n.º 32 e por meio do livro intitulado Indas e Vindas. Ubiratan de Aguiar foi o primeiro colunista social a ser eleito imortal, além de ter sido tema de Mestrado da UFPA.
São essas, senhoras e senhores, as histórias da Cadeira n.º 32 da Academia que passo a ocupar, à qual minha história familiar orgulhosamente se vincula e peço licença aos integrantes deste Silogeu, conclamar nosso decano Octavio Avertano de Macedo Barreto da Rocha e o nosso recém saudoso Edson Franco, para historicamente representar a imortalidade dos atuais, antecessores e ancestrais de cada cadeira hoje ocupada.
Terminado o discurso da imortalidade histórica que nos acomete e antecede, passo pela mitologia, pela filosofia e pela pprosa, para exercitar meu dom das Letras. Minha alma reluz a tal ponto que desejo demonstrar como a Academia Paraense de Letras e seus integrantes me inspiram a discursar sobre a imortalidade.
Os estoicos, em seu infinito amor à sabedoria, filosofam sobre a imortalidade, no anseio de superar a finitude material humana, à luz de algumas premissas do saber. A primeira delas mostra-se factível pelas células de nosso corpo que, em um ato de transformação, integram-se à matéria orgânica da terra. A segunda diz espeito ao ato de procriação, pois a nossa genética integra-se a nossos descendentes sem cessar, enquanto os filhos dos filhos procriarem. A terceira concerne aos feitos e atos heroicos e indeléveis que alguém, na rica história de seu povo, pode como legado deixar. Essa terceira premissa se mostra também como um fato de transformação na cadeia literária e sucessória da vida, momento em que se traz novamente o verbo esperançar para que possa seus filhos a história acadêmica continuar
Porém, se assim possível não for, conforta-nos a feliz conclusão de que tudo permanecerá, com a história da humanidade que se renova e se entrelaça no mais puro ato de amor pela crença de que todos são filhos do Pai Celeste Criador e nessa condição possam não parar marcha da história, como a que une hoje minha história de vida literária e a de meus ascendentes e colaterais às histórias pessoais e familiares de nomes inesquecíveis como José da Natividade Lima, Olavo Nunes, Bruno de Menezes, Alonso Rocha e Ubiratan de Aguiar, brilhantes antecessores, cujos nomes ressoam hoje no universo como imortais.
Atualmente, após milênios, esse olhar acadêmico da imortalidade dos estoicos, fundado em três pilares, é desafiado pela imortalidade porque mais outras premissas são evidenciadas pelas pesquisas e pelos estudos mais modernos: 1) algumas substâncias deixam-nos mais longevos, gerações futuras podendo ter expectativa de vida de duzentos anos ou mais; 2) a revolução genética pode criar clones, que podem recuperar toda nossa memória e toda nossa inteligência de vida, numa forma contínua de desafiar a finitude material; 3) a interação do homem e da máquina, em cooperação simultânea de vida, em que permite ao ser humano ter qualidade de vida nunca dantes vista, com mais força, comodidade e longevidade; 4) a continuidade de nosso ato e energia de raciocinar, mesmo após a morte material da nossa energia geneticamente concentrada nos nossos órgãos ou no corpo por meio da reprodução humana natural, pois nossa matéria corporal formada por células organicamente vivas pode ser substituída por órgãos ou corpos novos em forma de avatar, produzidos por máquinas ou impressoras tridimensionais para funcionar mecanicamente em nosso corpo ou substituí-lo; 4) a continuidade da inteligência humana além da matéria orgânica que pode ser apreendida em potência de nossa memória e inteligência em máquinas e softwares que mantêm ativo nosso ato de raciocinar em computadores ou por meio de inteligência artificial, que simula a sucessão do pensar dos nossos atos da vida como energia, já não mais em potência, mas em ato, por meio de raciocínios, lógicas e sentimentos que nunca dantes foram pela humanidade imaginados, mesmo que não estejamos em corpos materializados, pois a percepção da inteligência artificial pode a história da perpetuidade ou imortalidade continuar, trazendo-nos a sensação que talvez tenhamos que repensar a utilidade de institutos como a Academia Paraense de Letras.
Evitando momentaneamente adentrar o mundo do avanço virtual, que a revolução tecnológica está por nos fazer vivenciar, volto-me para o modo lúdico e consciente dos estoicos, que forjaram a criação e a movimentação de instituições como a Academia Paraense de Letras, pedindo licença a Deus para envolver uma acepção mitológica e filosófica greco-romana. Filosofando, certo dia, eu e meu filho questionamos: será que foi a mitologia que deu origem à filosofia ou seria a filosofia que criara a mitologia para nos fazer pensar de forma lúdica o amor à sabedoria? Independentemente da resposta, cabe a nós integrar as duas indagações. Por isso, declamo por ora a criação mitológica de nossa humanidade, com suas imperfeições e sua perpetuidade.
Faço-o da seguinte forma: “Certa vez, Mercúrio ou Cura, o deus romano que representa o planeta Mercúrio e corresponde ao deus grego Hermes – símbolo da medicina –, estava a visitar a deusa Gaia (planeta Terra). Por ela, prostava-se a caminhar quando, à beira de um lindo lago de beleza terrena estonteante e de encontro das águas e da terra, viu-se, com o barro, feito lama, a esculpir e a brincar. Após se entreter com as curvas e as formas esculpidas pelos seus dedos, chegou a uma forma de um amor tão encantador que seus olhos não paravam de olhar. Em um ato de desespero, pelo sentimento de amor incondicional ao ser formatado por deus, Cura volta seus olhos para Zeus (planeta Júpiter) e diz: ‘Ó, Grande Júpiter, estava em Gaia a brincar e esse ser me pus a formar, dê-lhe ânimo para que com ele possa morar e dele possa cuidar’. Júpiter, atendendo ao pedido de Mercúrio, soprou-lhe as narinas. Num ato de mágica, aquele ser começou a pulsar e com ânimo passou com os deuses a se relacionar. Cura, em ato de gratidão, começou a agradecer a Júpiter por ter-lhe dado a vida daquele ser. Porém, Júpiter, também encantado com a criação pelo amor inabalável, disse: ‘Esse ser é meu, pois a vida quem lhe deu fui eu’. Em meio à discussão, Gaia, ao ver o ser criado, passa também a amar a criatura. Levantando-se, começa a argumentar: ‘A matéria desse ser me pertence, por isso esse lindo ser não pode pertencer a vocês’. Cura, em mais um ato de desespero, volta-se para o deus romano Saturno, planeta de mesmo nome, identificado como o deus grego Cronos. Invocando-o, submete-lhe a questão, explicando que criara com suas próprias mãos um ser lindo pelo qual nutre muito amor, que Júpiter deu-lhe ânimo e vida com um sopro nas narinas e que, por amor divino, começou a discussão para saber a quem o ser pertenceria. Porém, de repente, Gaia, inundada em amor, arroga a si a posse do ser criado, dizendo a ele pertencer, pois a matéria dela adveio, postulando a titularidade daquela forma de viver. Cronos, após analisar a situação, proclamou: ‘Como os três têm legitimidade para requerer a titularidade desse lindo e apaixonante ser, eu, para não cair na tentação do mesmo amor, desde já adianto que essa criatura materialmente para sempre não viverá, mas, enquanto vida tiver nessa forma, matéria e sopro divino, integrado a ti, Cura, esse ser será, pois dele cuidarás e o curarás se doente estiver; se disso não te desincumbires, a ti, Zeus, o sopro voltará e a ti, Gaia, o pó retornará. Assim os três terão de volta a si os elementos mágicos da criação reconhecidos pela beleza de cada ato da vida e visão. Quanto a mim, por não ter por ele o amor eterno, em meio à discussão insolúvel que se me apresenta, vê-lo-ei como ser criado e mortalizado, mesmo com a dor da morte causada pelo amor que também lhe tenho, esperançando que vós e o ser criado adoteis alguma medida ou descubrais algo que faça dessa bela e amada criatura um ser imortal como nós que somos deuses e que ela possa para sempre entre nós viver e que para sempre entre nós amada’”.
Sabemos em Gênesis como o ser humano foi modelado pelas mãos de Deus no barro, mas resta saber como algo tão divino e pleno, imperfeito se tornou.
Peço mais uma vez permissão divina ao Pai Celestial, para com outras filosofias, mitologias e crenças a ideia imperfeição demonstrar. Recorro à mitologia grega para declamar mais uma lenda: como dito na outra mitologia, a vida humana precisa continuar, pois fora criada pelos deuses para habitar com eles em outro mundo, pois com o Olimpo não pode ser com os mortais coabitado. Os seres humanos eram perfeitos, tinham tudo em dobro, duas cabeças, quatro braços, quatro pernas e por aí sucessivamente. Estavam essas criaturas na Terra a habitar. E, olhando para o Olimpo, lugar onde só os Deuses poderiam morar, passaram a questionar: “Por que o Olimpo não poderiam pelos humanos habitado e governados, pois, diante de tanta perfeição, não seriam eles a desejar dos outros seres a divina admiração?” Com o questionamento, logo passaram a planejar e o plano a executar, subiram ao Olimpo para os deuses destronarem. Lá chegando, cumpriram o plano, e Zeus e seus comparsas de lá expulsaram. Em ato de revolta e retomada, Zeus e os outros deuses reuniram-se e um plano de conquista começaram a implementar. Sem delongas, em ato divino, o Olimpo os deuses retomaram. Pelo ato de desobediência da humanidade, em um Tribunal celestial, os deuses sentenciaram: “Vocês, humanos, pela dádiva da criação e da perfeição, quiseram usurpar os deuses; sem gratidão no coração, desafiaram a quem deveriam respeitar, por isso passo a prolatar a sentença pelo desrespeito e desobediência: formado de alma e corpo, serás ao meio dividido para que contra os deuses não pratiques traição, mas te deixarei o umbigo como cicatriz e ato de recordação, para que não tenhas mais tempo a pensar e um ato de ingratidão contra nós possas perpetrar. Como ficarás materialmente mortal e incompleto, sem saber onde tua metade foi parar, serás dos outros dependente para tuas necessidades saciar e ficarás o resto da tua vida ocupado a procurar tua cara metade e alma gêmea, pois assim Cronos não mais te dará tempo para o Olimpo desejar.
Sabendo que, de acordo com a filosofia cristã, tal situação de imperfeição deveu-se à desobediência do fruto proibido, cabe a nós de forma incessante desejar a perpetuidade, para que só por meio do amor ao paraíso possamos retornar.
Discursando neste ato de posse sobre a criação e a imperfeição da humanidade, resta-nos filosofar sobre onde podem entrar a escrita e as letras nessa história de imortalidade. Sentenciado a ser mortal e condenado a dos outros depender, como recuperaria o ser humano a imortalidade perdida no paraíso ou como poderia do ato de rebeldia na conquista do Olimpo ser perdoado, por ter desejado viver como deuses, mesmo tendo sido por ele ou por eles criado?
Para isso, recorro aos ensinamentos de Sócrates descritos na filosofia de Platão, no diálogo por ele descrito entre Sócrates e Fedro sobre a origem da escrita e como tal invenção divina seria bem ou mal empregada.
No diálogo, Sócrates fala a Fedro com base na mitologia egípcia, sobre o deus Thoth, que na grande cidade chamada Tebas do Egito era denominado Amon, deus da sabedoria. Tal deus inventara os números [arithmos] e o cálculo, a geometria e a astronomia, o jogo de damas e os dados e também a escrita [grammata]. O deus Amon foi demonstrar as suas artes e criações, dizendo que elas deveriam ser ensinadas aos egípcios, mas foi por Tamuz, rei de todo o Egito, questionado, para a saber a utilidade de cada arte a um ser humano dado. Enquanto o deus explicava, Tamuz o interpelava, pois ora o censurava, ora o elogiava, conforme essas artes lhe pareciam boas ou más. Quando à escrita chegaram, Amon assim proclamou: “Esta arte, caro rei, tornará os egípcios mais sábios e lhes fortalecerá a memória; portanto, com a escrita, inventei um grande auxiliar para a memória e a sabedoria”. Mas logo Tamuz criticou: “Ó, grande artista Thoth, não é a mesma coisa inventar uma arte e julgar a utilidade ou o prejuízo que dela advirá aos que a exercerem. Tu, como pai da escrita, esperas dela com o teu entusiasmo precisamente o contrário do que ela pode fazer. Tal coisa tornará os homens esquecidos, pois deixarão de cultivar a memória; confiando apenas nos livros escritos, só se lembrarão de um assunto exteriormente e por meio de sinais, e não em si mesmos. Logo, tu não inventaste um auxiliar para a memória, mas apenas para a recordação. Transmites a teus alunos uma aparência de sabedoria, e não a verdade, pois eles recebem muitas informações sem instrução e se consideram homens de grande saber, embora sejam ignorantes na maior parte dos assuntos. Em consequência, serão desagradáveis companheiros, tornar-se-ão sábios imaginários ao invés de verdadeiros sábios”.
Assim, após essa afirmação, vejo que o ser humano não será livre, mas prisioneiro dos ensinamentos pelos outros criados, sem considerar se os escritos são bons ou maus, verdadeiros ou falsos. Dessa forma, limitado pela escrita o ser humano não deixa que a liberdade da sabedoria construa o conhecimento, conforme a verdade e a justiça, mas seja conduzido pelos ensinamentos outrora registrados. No diálogo com Fredo, Sócrates, quanto a esse questionamento, assim se posiciona: “O uso da escrita, Fedro, tem um inconveniente que se assemelha à pintura. Também as figuras pintadas têm a atitude de pessoas vivas, mas, se alguém as interrogar, conservar-se-ão gravemente caladas. O mesmo sucede com os discursos. Falam das coisas como se as conhecessem, mas, quando alguém quer informar-se sobre qualquer ponto do assunto exposto, limitam-se a repetir sempre a mesma coisa. Uma vez escrito, um discurso sai a vagar por toda parte, não só entre os conhecedores, mas também entre os que não o entendem, e nunca se pode dizer para quem serve e para quem não serve. Quando é desprezado ou injustamente censurado, necessita de auxílio do pai, pois não é capaz de defender-se nem de proteger-se por si”.
Entretanto, como materialmente a obra não se altera ao sair de seu criador, Sócrates apresenta o discurso da alma como virtude da escrita, para pelo discurso defender-se por meio da dialética, pois a sabedoria pela escrita não admite quando se escrevem as letras para ser deleite entre aqueles que escreverão em vão ou que se mostraram incapazes de ensinar eficientemente a verdade pela razão, pois o discurso da alma deve ser feito entre os que conhecem o justo, o bom e o verdadeiro. Para isso, Sócrates traz a parábola de um agricultor inteligente, fazendo menção a jardins literários que só escrevem para registrar as recordações ou para quem não nutre pelas letras as razões, pois do contrário a escrita será uma arma que não permite ninguém se defender, visto que só pela dialética a escrita pode pela força alma se proteger. Interpelado por Fredo sobre a inutilidade da escrita sem a virtude da alma, Sócrates assim se pronuncia: “Se assim escrever, será na intenção de acumular para si mesmo um tesouro de recordações para a velhice, se chegar até lá; porque os velhos esquecem tudo. Escreverá também para os que caminham na mesma rua com ele, e se alegrará vendo crescer as tenras plantas. E enquanto outros se divertem em banquetes e prazeres semelhantes, esse homem se recreará com as coisas que mencionei”: sem interação da sabedoria. Porém, Fedro retruca: “Mas, Sócrates, estás comparando com divertimentos vulgares a belíssima atividade de um homem que se deleita em escrever discursos sobre a justiça e as outras virtudes!” Sócrates responde: “É verdade, meu Fedro! Mas acho muito mais bela a discussão dessas coisas quando alguém semeia palavras de acordo com a arte dialética, depois de ter encontrado uma alma digna para recebê-las; quando esse alguém planta discursos que são frutos da razão, que são capazes de defender-se por si mesmos e ao seu cultivador, discursos que não são estéreis, mas que contêm dentro de si sementes que produzem outras sementes em outras almas, permitindo assim que elas se tornem imortais. Aos que as levam consigo, tais sementes proporcionam a maior felicidade que é dada ao homem possuir”.
Por isso, senhoras e senhores! Fico feliz por integrar esta casa de Letras, pois a escrita vem com a virtude da alma por meio da dialética, a escrita tem o discurso da razão, permitindo às outras almas sementes que proporcionam maior felicidade pelo discurso do que é verdade, belo e justo, tornando-nos imortais pela escrita do saber e imunes a Cronos e a Zeus, por permitir a alma se defender em letras que servem de sementes que florão em almas inquietas para a vida do passado ser projetada para que futuras gerações do passado possa conhecer.
Eis que, pelos socráticos, pelos estoicos ou por Deus, alguma solução a Academia Paraense de Letras desde 1900 nos apresenta por meio da escrita, como se mostra na discussão entre o deus Amon e o rei Tamuz. É certo que hoje vivemos a dor da partida das pessoas amadas, esperançando que um dia o paraíso nos acolha na imortalidade espiritual por Deus prometida ou que nós possamos de alguma forma a imortalidade alcançar, por pertencermos à centelha divina por Deus criada, dando-nos ânimo e vida, para momentos felizes como este experimentarmos.
Neste momento, portanto, senhoras e senhores, suplicamos a decisão de Cronos que, de alguma forma, imortais nos tornou, seja pelo átomo, pela genética, pelo legado, pela escrita ou pela informática, para que possamos dar aos deuses, à Trindade santa e aos humanos a esperança feliz de viver para sempre com as pessoas amadas. Hoje proclamo que a minha história a de vós se juntam a essa imortalidade perseguida, que será para mim um desafio, para que sempre de nós os deuses, anjos e arcanjos não se esqueçam ou para que nos aconteça alguma imortalidade sem trégua, atendendo ao anseio de Cronos como solução à beleza da vida humana perpétua.
Mas, se por acaso a imortalidade material ou de energia informática não nos acontecer, que tenhamos o caminho perpétuo de nossos feitos literários, para que nunca ninguém possa esquecer e pela dádiva de Deus possamos como criaturas Seu nome honrar, pois céus e terras passarão, mas sua palavra não passará, demonstrando a criação humana, sua imperfeição, o estado de dependência uns dos outros e a imortalidade pela escrita, quando a alma livre discursar e, por letras, a imortalidade gravar. Nesse diálogo de perpetuidade, rogo a Deus também que me dê consciência de que meu tempo também passará. Que eu, como antecessor, possa em vida material e intelectual me formar e, assim, que eu possa para sempre em espírito ficar preenchido de felicidade pelos muitos que me sucederão na Cadeira n.º 32, deixando um legado do que é belo, verdadeiro e justo e uma estrada pavimentada e orgulhosa para ser seguida por meio das letras que trazem sementes a serem plantadas em almas, para que, pela dialética, possa em outras almas a sabedoria proliferar os frutos saber. Que dos altos céus eu possa em espírito e alma com os feitos da APL me regozijar.
Nutro a esperança de que, das imortalidades proclamadas pelos estoicos, pelo menos a duas dela eu possa unir-me, pois com filhos já propaguei a perpetuidade de minha genética e no dia de hoje propago minha eternidade em feitos literários pela Academia Paraense de Letras. Em um ato de atender ao desafio de amor feito por Cronos e concretizado por este Silogeu, esperanço que a imortalidade genética funda-se e confunda-se com a imortalidade do legado literário, pois assim podemos viver o amor eterno e infinito proclamado pela filosofia, desafiado pela mitologia metafísica greco-romana, perseguido pela revolução dos nutrientes e da informática e prometido por Deus no paraíso.
Temos uma enorme necessidade de pertencer e de ser pertencido, uma necessidade que revela um extremo ato de carência e de interdependência, pois precisamos uns dos outros para termos uma vida plena e propositada, conforme sentenciou Zeus e nos desafiou Deus ao paraíso retornar com a segunda vinda de Jesus Cristo. Ciente disso, já proclamo que me completo por me sentir pertencer à minha família, incluindo sua história e suas crenças divinas, ao ciclo de amizade que me acolhe até hoje, às histórias dos confrades e das confreiras da APL. Enfim, hoje me plenifico por ser acolhido pelos membros da Academia Paraense de Letras. Meu muito obrigado aos que me incentivaram a percorrer essa jornada que tanto abrilhanta minha vida material literária e vai fazer reluzir pela eternidade os meus feitos literários conduzidos pela minha alma. Muito obrigado aos agora confrades e confreiras, amigos e amigas e familiares.
Deus nos abençoe nesta investida acadêmica da imortalidade, que essa seja a porta mais adaptada às nossas vidas perpétuas.
Muito obrigado!
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