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No Pará acontecem
coisas das quais até Deus duvida. A Defensoria Pública, como ninguém ignora, é instituição
que tem a incumbência de prestar assistência jurídica integral aos necessitados.
Pois bem. O Conselho Superior da Defensoria do Estado do Pará, que tem a função
de legislar internamente e fiscalizar, requisitou quase uma dezena de vezes que
o Defensor Público Geral, Luís Carlos de Aguiar Portela, oferecesse o lotacionograma
da Defensoria, o que não foi atendido. Aliás, o reiterado pedido sequer foi
respondido.
O lotacionograma
seria uma espécie de gráfico ou organograma mostrando onde cada Defensor
Público está, a cidade e telefones de contato da Defensoria do Município ou
Núcleo, no caso da Capital.
Por exemplo, quem
entra no site da Ministério Público ou do Judiciário, em uma busca rápida consegue
saber, respectivamente, quem é o promotor de Oriximiná ou o Juiz da 1ª Vara da
Fazenda Pública em Belém. Mas, no caso da Defensoria Pública, tal informação parece
ser sigilosa e tem que ser buscada pelo interessado no Diário Oficial do Estado.
Não se sabe o porquê.
O lotacionograma é
importante por vários motivos, dentre eles porque assim os cidadãos ficam
sabendo quem devem procurar para defesa de seus direitos, onde e telefones de
contato. E como os Defensores Públicos cumulam funções em vários municípios, um
assistido de Parauapebas, por exemplo, tendo o número do telefone da Defensoria
de Curionópolis, poderia ligar e saber quando o defensor estará na cidade, ao
invés de ter que ir até lá para “arriscar
encontrar um Defensor. Também pelo lotacionograma é possível verificar se está
sendo cumprida a lista de antiguidade da Defensoria; ou seja, se o Defensor
está em determinado município segundo sua classificação na carreira e não pelo
famoso QI (Quem Indica). Enfim, trata-se de ferramenta que auxilia o controle
social por parte do cidadão.
Quando ocorreu o
fechamento de várias Defensorias Públicas, a Defensoria publicou esta Nota de
Esclarecimento 
, afirmando que atenderia somente casos urgentes das unidades
fechadas, nos municípios polos como Marabá, Breves e Tucuruí. Ocorre que não
informou, nos municípios onde deixou de atender, onde e quais demandas seriam
atendidas. Como o assistido iria buscar auxílio?
Diante desses
fatos inexplicáveis e injustificáveis, o Defensor Público
Marcos Wagner Alves Teixeira, designado
para Tucuruí, fazendo itinerância em Novo Repartimento,  oficiou
o Diretor de Interior da Defensoria Pública para que apresentasse o
lotacionograma dos Defensores, no que também não foi atendido.
De modo que não restou
opção a não ser ajuizar Ação Civil Pública requerendo a ampla divulgação do
lotacionograma e que nas cidades que perderam Defensores Públicos fosse dada
ampla divulgação acerca de onde os assistidos poderiam buscar auxílio e quais
espécies de causas seriam atendidas, com fundamento na Lei nº 12.527/2011, a Lei
da Informação.
Pedido que, ao
primeiro olhar, salta aos olhos que é justo e de largo alcance social, não
havendo motivo plausível para que não seja atendido.
O juiz de Novo
Repartimento, Pedro Enrico de Oliveira, de pronto acolheu os argumentos e assim
lecionou, na liminar concedida:
“A Defensoria Pública possui forma
democrática para escolha de sua direção, sendo certo que o Defensor Público
Geral é escolhido por seus pares, ou seja, por todos os defensores públicos pertencentes
aos quadros da instituição. Por tal razão, e se levando em consideração que
vivemos em um país em que a politicalha, em sua pior acepção, move as
instituições públicas, não é impossível imaginar que o Defensor Público Geral
esqueça que suas funções à frente da instituição tem natureza eminentemente
técnica e aja com viés político (politicalha), defendendo seus eleitores e
preterindo aqueles que estão em situação de oposição.
Neste sentido, levando-se em
consideração apenas a carreira dos defensores públicos do Estado, é certo que a
não divulgação do lotacionograma de forma periódica, ou seja, o não acesso à
informação pelos próprios defensores, provoca auto alienação institucional,
podendo ocorrer situações em que defensores públicos menos antigos estejam em
situações mais confortáveis do que outros colegas mais antigos na carreira.

Por outro lado, levando-se em consideração a prestação de serviços à população
carente que necessita de assistência jurídica, a ausência de publicidade
provoca alienação quanto à informações de interesse coletivo ou geral, não
sabendo a população a quem procurar quando necessitada de auxílio. No mesmo
sentido, a falta de informação impede o controle social das instituições
públicas, o que é inadmissível no âmbito da administração pública
.”
E sentenciou, nos
autos do Processo
nº 0003382-05.2013.8.14.0123
:
Por todo o exposto, e por tudo o mais quanto
dos autos consta, com fundamento na Lei n9 12.527/2011, presentes os requisitos
previstos no artigo 273, do Código de Processo Civil, e no artigo 12, da Lei Federal
n& 7.437/85, concedo a liminar requerida, determinando que:

1. Seja divulgado em 48 (quarenta e oito) horas no site da Defensoria Pública
do Estado do Pará o lotacionograma dos Defensores Públicos do Interior do
Estado (Defensor Público, município, telefones e endereços da Defensoria
Pública), devendo este ser atualizado a cada 10 (dez) dias, sob pena de multa
diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais);

2. Seja dada publicidade, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, via rádio ou
carro de som por 30 (trinta) dias contínuos, e por cartaz fixado nas salas onde
o Defensor Público atendia, nos Municípios que perderam Defensores Públicos,
quais demandas serão atendidas (especificar demandas urgentes) e o local em que
deverão comparecer os assistidos que necessitem de assistência jurídica, sob
pena de multa diária de R$5.000,00 (cinco mil reais)”.
Acreditem: ao
contrário da sua obrigação de cumprir a ordem judicial, a Constituição e a Lei da
Informação que determina a transparência, a Defensoria Publica do Estado do
Pará apresentou Agravo de Instrumento, a fim de continuar a praticar a
ilegalidade!
Felizmente, o
Desembargador Leonardo Noronha Tavares, em brilhante decisão, afirmou que é Direito fundamental dos cidadãos
saberem onde os Defensores Públicos estão. Confiram trecho de seu despacho:
O jurisdicionado carente é o público alvo da
Defensoria. Logo, possui o direito de, com a divulgação do lotaciograma dos
Defensores Públicos, ter conhecimento – da forma mais ampla possível – de saber
em qual local se encontram estes profissionais
.”
(…)
A divulgação do lotaciograma dos Defensores
Públicos é de interesse de todos os “necessitados”, protegidos por lei, que
necessitam de assessoria jurídica. Portanto, cuidam-se de direitos fundamentais transindividuais,
personificando-se em direitos e interesses jurídicos bem superiores aos afirmados na inicial do agravo, no sentido de
que o direito discutido nos autos se resume a “interesses” dos próprios
Defensores Públicos.
Correto o entendimento esposado pelo
Ministro HERMAN BENJAMIN ao julgar o REsp 931513/RS verberando que:  “Quanto mais democrática uma sociedade,
maior e mais livre deve ser o grau de acesso aos tribunais que se espera seja
garantido pela Constituição e pela lei ao cidadão, individual ou coletivamente
.”” (grifos meus)
Causa estupor e é
caso de se exigir explicações do porquê de o Defensor Geral  da Defensoria Pública do Pará se negar a
fornecer tais informações em detrimento da sociedade paraense; afinal, trata-se
de uma instituição essencial ao acesso da população à justiça e à cidadania, e
não do quintal de sua casa. A conduta do Defensor Geral infringe de uma tacada só
os princípios constitucionais da publicidade, da legalidade, da motivação, da
finalidade, da impessoalidade e da economicidade.
Pior: além da estranhíssima insistência em
esconder a lotação dos Defensores Públicos, a resistência do Defensor Geral aos
ditames da lei e da Constituição está sendo patrocinada pela Procuradoria Geral
do Estado, que deveria ser utilizada para defender os interesses elevados do
Pará como unidade da Federação.
Por que a PGE, cumprindo seu papel de
aconselhamento jurídico, não informou ao Defensor Geral que
a desobediência aos princípios da
administração pública pode levar o agente público a responder por ato de
improbidade administrativa, a teor do que dispõe a Lei Federal 8.429/92, sem
prejuízo das sanções penais, civis e administrativas cabíveis? E que os princípios
da administração pública não se resumem àqueles explicitados no artigo 37, da
Constituição Federal, tendo sido também amplamente reconhecidos pela doutrina e
pelos Tribunais Superiores pátrios todos os princípios implícitos no texto
constitucional?
 E por que não respeitar o enunciado do artigo
52, XXXIII, da CF?
Todos têm direito a receber dos órgãos
públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou
geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade,
ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e
do Estado
.”

E, ainda, o artigo 32, da Lei 12.527/2011?

“Art. 32- Os procedimentos previstos nesta Lei destinam-se a assegurar o
direito fundamental de acesso à informação e devem ser executados em
conformidade com os princípios básicos da administração pública e com as seguintes
diretrizes:

I – observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção;
II – divulgação de informações de interesse público, independentemente de solicitações;
III – utilização
de meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da informação;
IV – fomento ao
desenvolvimento da cultura de
transparência
na administração pública;
V- desenvolvimento
do controle social da administração
pública.”
(grifos meus)
Espera-se que o
governador Simão Jatene, no mínimo, puxe
as orelhas
do Defensor Geral e exija que ele cumpra a lei, a Constituição e
a ordem judicial. Afinal, o erro é dele mas a gestão que fica manchada é a sua.
Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, presidente da Academia Paraense de Jornalismo, membro da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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