O texto do escritor Salomão Laredo publicado em um jornal de circulação aqui da capital paraense exige, e concordo plenamente com ele, uma resposta, social, política e cultural. Larêdo traz indagações que nos remetem a uma discussão latente e essencial para as Letras do Norte. Para contextualizar o apelo do escritor, reporto-me ao ano de 1894 quando a produção literária aqui na capital paraense estava em completo marasmo, fato que exigiu de um dos nossos escritores, Natividade Lima, tomar iniciativa individual e propor mudanças para a situação. Natividade Lima, convocou por meio de um jornal de circulação á época os seus “amigos de arte”. Lima fez uma espécie de convite nas Folhas Diárias: “Solicitamos aos que se interessarem pelo desenvolvimento literário d’Amazônia, o obsequio de comparecer às 9 horas da manhã de domingo, 2 de dezembro, na casa do Sr. Eustachio de Azevedo, à Rua da Trindade, canto do Alecrim, para uma reunião que decidirá do futuro de nossa coletividade literária. (Pará 27 de novembro de 1894) (REGO apud AZEVEDO, 1997, p. 23).
O resultado desse convite? Segundo relato do escritor Eustachio de Azevedo, foi a presença dos principais intelectuais locais, da última década do século XIX: Drs. Álvares da Costa, Paulino de Brito, Natividade Lima, Leopoldo Souza, Guilherme de Miranda, Ácrisio Mota, Alcides Bahia, Manuel Lobato, João de Deus do Rego, Theodoro Rodrigues, Euclides Dias e Luiz Barreiros. Essa reunião de escritores culminou com a fundação da Associação Mina Literária.
Se percebermos a data da publicação do convite de Eustachio de Azevedo são 128 anos de busca por visibilidade, o que remete-nos a indagação atualizada de Larêdo.
“Somos suprimidos da Literatura Brasileira?
Quem impede o acesso aos livros dos escritores do Norte?
Quem nos deprecia?
Quem nos esconde?”
Ainda percebendo o tom de desabafo do escritor Salomão Larêdo, a frase publicada em seu texto, “Somos Ignorados”, evidencia a postura de outro olhar critico sobre a Literatura produzida na Amazônia paraense do inicio do século XIX. José Eustáquio de Azevedo que escreveu em 1904 uma antologia amazônica. Em sua perspectiva dizia que “… nós conhecemos todos vocês, mas vocês fazem questão de não nos conhecer”. Azevedo referia-se aos intelectuais cariocas.
A dissonância entre centro e periferia literária, está na concisão do texto e novamente Salomão Laredo infere: “Somos tratados assim para permanecer a alienação e por isso somos escondidos e esquecidos, invisíveis e invisibilizados pelos que não querem ver nossa produção e ler nossas obras para saber que produzimos Literatura Brasileira aqui no Pará?
O texto produzido traz em sua produção de sentido, um desabafo dirigido também, como diz Abguar Bastos em seu manifesto Flami-n’-Assú, aos seus “amigos de arte”. Ao Falar em Abguar Bastos, seus manifestos em 1923, a “geração que Surge e Flami-n’-Assú em 1927, trazem em suas composições, necessidades imperiosas de evidenciar a Literatura produzida na Amazônia paraense em um circuito de produção e Leitura, além de oferecer as características brasílicas dessa arte literária. Bastos propõe “Libertemo-nos! Mostremos aos anêmicos de iniciativa, de patriotismo, de atividade, que o Norte pode ter a sua literatura! Criemos a Academia Brasileira do Norte. Sagremos e imortalizemos! Façamos concursos interestaduais. (Flami-n’-Assú, 1927). A proposição de Abguar Bastos é oferecer a Amazônia como forma de escrita para a Literatura Brasileira e Larêdo reverbera em seu discurso esse tom, “O Brasil tem fome de leitura dos livros dos escritores do Pará”.
No manifesto “a geração que surge” (1923) uma frase atravessa os discursos de Larêdo e Abguar Bastos a ideia de preconceito com a Literatura produzida por aqui. Bastos sedimenta, “o Sul, propositadamente, se esquece de nós”. E Laredo é enfático “Somos vítimas de preconceito, sim e somos silenciados historicamente, sim. Há muito vivemos esses dilemas estéticos, culturais e políticos, traços da sociedade brasileira e não podemos mais aceitar passivamente esse inexistir como escritores”. Assim como Abguar Bastos, Salomão Larêdo é participante de uma coletividade de escritores que, dentro de suas esferas sociais e suas perspectivas literárias, foram e são agentes sociais de outras comunidades, daí a perspectiva polifônica desses escritores, como intelectuais engajados. Concordo com o professor e historiador Aldrin Figueiredo quando aponta que no fundo é uma discussão do centro e da periferia, há uma centralidade discursiva da centralidade da literatura brasileira. O assunto colocado em evidencia é enorme e carece de uma visão mais atenta aos debates e propostas.
Com um hiato de quase 100 anos entre os manifestos e o texto manifesto de Salomão Larêdo, a Literatura produzida na Amazônia e especificamente na paraense, segue buscando caminhos para sua visibilidade e produção. Tenho plena convicção que precisa-se provocar os “anêmicos de iniciativa. Propostas como a Mina Literária em 1894 e a Feira Literária do Pará (2014), organizada pelo próprio Salomão Larêdo, Edyr Proença entre outros escritores, trazem em sua origem a “necessidade e a independência” da Literatura produzida na Amazônia Paraense e faz eco a proposta de Abguar Bastos,”Façamos a literatura do Norte! As Academias do Norte! As Edições do Norte! O Intercâmbio do Norte! Norte precisa eufonizar na amplidão a sua voz poderosa!
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