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O julgamento de Ronnie Lessa e Élcio Queiroz, acusados pela execução da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, iniciou-se nesta quarta-feira, 30 de outubro, mais de seis anos após o crime que chocou o mundo e mobilizou a população brasileira e organizações de direitos humanos nacionais e internacionais. A sessão, realizada no 4º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro, teve início às 10h30 e é acompanhada de perto por familiares, amigos e autoridades, como Anielle Franco, irmã de Marielle e atual ministra da Igualdade Racial, ao lado de sua sobrinha Luiara, filha de Marielle, e do pai, Antônio.

Os réus, que assistem ao julgamento por videoconferência das unidades prisionais onde estão detidos, enfrentam acusações de duplo homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio e receptação, com penas que podem chegar a 84 anos para cada um. Lessa, apontado como executor dos disparos, está preso na Penitenciária de Tremembé, em São Paulo, enquanto Queiroz, acusado de dirigir o veículo utilizado no crime, cumpre pena no Centro de Inclusão e Reabilitação em Brasília.

O julgamento, até agora, teve depoimentos intensos. A primeira testemunha foi Fernanda Chaves, ex-assessora de Marielle e única sobrevivente do atentado, que relatou as difíceis mudanças em sua vida após o crime. Em seguimento, depuseram a mãe de Marielle, Marinete Silva, a viúva de Marielle, Mônica Benício, que atualmente é vereadora do Rio de Janeiro, e a advogada Ágatha Arnaus, viúva de Anderson.

Fernanda Chaves deu seu depoimento por videoconferência. Relembrando a noite de 14 de março de 2018, a jornalista narrou em detalhes o momento dos disparos, descrevendo a reação de Anderson e a imobilidade de Marielle. “O carro estava devagar. Foi quando teve uma rajada”, recordou, descrevendo o pânico ao perceber o ataque. Fernanda contou como o atentado transformou sua vida, forçando-a a deixar o Brasil por segurança com sua família. “Minha vida mudou completamente”, afirmou, relatando o impacto do atentado sobre sua filha, que teve de lidar com a dolorosa descoberta do que é um assassinato.

Marinete Silva relembrou o compromisso da filha com as causas sociais e reiterou seu desejo de ver justiça para Marielle. Ao iniciar sua fala, Marinete descreveu a expectativa da família desde a gravidez e os primeiros anos de Marielle, enfatizando o vazio deixado por sua perda. Ela revelou que inicialmente se opôs à candidatura de Marielle, preocupada com o envolvimento partidário, mas que compreendeu o desejo da filha de ocupar um espaço onde mulheres negras eram raramente representadas. Segundo Marinete, 2018 foi um ano de grande realização profissional para Marielle, consolidando seu trabalho em defesa de causas sociais, como moradia digna e direitos humanos.

Mônica Benício também destacou a dedicação de Marielle à defesa dos direitos de mulheres e moradores de comunidades periféricas. Ela destacou que Marielle Franco assumiu diversas causas na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro, com especial atenção para a questão fundiária, abordando temas de ocupação do solo urbano e moradia digna. Segundo ela, Marielle usava seu mandato para tratar de forma interseccional as necessidades urbanas da cidade. A defesa pelos direitos de moradia nas favelas e periferias, afirmou, era central para Marielle e pode ter sido um dos motivos que levaram ao seu assassinato.

Ágatha Arnaus, viúva de Anderson Gomes, relatou no tribunal o impacto profundo da perda do marido e as dificuldades de enfrentar o luto. Em depoimento emocionado, ela descreveu o último dia de Anderson, que se preparava para seguir carreira como mecânico de aviação. O promotor exibiu áudios e um vídeo de Anderson descobrindo que seria pai, um de seus maiores sonhos. Ágatha também abordou os desafios que enfrentou, com apenas 27 anos, ao criar o filho Arthur, que sofre de uma condição genética. Ela expressou a dor de viver cada marco da vida de Arthur sem a presença de Anderson, lembrando o conselho de seu pai: “Tudo que eu fizesse a partir dali seria a primeira vez sem o Anderson”.

O julgamento tem previsão de durar no mínimo dois dias, com depoimentos de nove testemunhas. A decisão sobre o destino dos réus será tomada por um júri composto por sete jurados, todos homens, sorteados de um grupo de vinte e uma pessoas. Caso condenados, a juíza Lúcia Glioche calculará a pena final. Em paralelo, há um processo no Supremo Tribunal Federal (STF) que investiga possíveis mandantes do crime, incluindo os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão e o ex-delegado Rivaldo Barbosa.

Gabriella Florenzano
Cantora, cineasta, comunicóloga, doutoranda em ciência e tecnologia das artes, professora, atleta amadora – não necessariamente nesta mesma ordem. Viaja pelo mundo e na maionese.

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