A história de Sergio Gutiérrez Benítez, que parece um roteiro de Hollywood, foi influenciada pelo cinema e acabou inspirando três filmes. Ele nasceu em 5 de fevereiro de 1945, em San Agustín Metzquititlán, Hidalgo, no México e, aos 22 anos, viciado em drogas e álcool, decidiu mudar de vida e ingressou na Ordem dos Escolápios, marcando o início de sua jornada rumo ao sacerdócio. Sua formação teológica o levou a Roma e à Espanha. De volta ao México, lecionou filosofia e história em universidades católicas romanas e tornou-se sacerdote secular na Diocese de Texcoco, onde fundou um orfanato, em 1976. Porém, a necessidade de recursos para manter a casa o levou a uma decisão nada convencional: ingressar na lucha libre (aquele famoso combate mexicano entre lutadores mascarados). Inspirado pelos filmes mexicanos de 1963 “El Señor Tormenta” e “Tormenta En El Ring”, que contavam justamente a história de um padre pobre que sustentava seu orfanato como um luchador mascarado, ele passou a duelar sob a alcunha de Fray Tormenta, mantendo uma vida dupla na qual, durante o dia, era um sacerdote devoto e, à noite, subia no ringue sem que ninguém soubesse de sua identidade como padre.
A rotina extenuante de Fray Tormenta começava às 4h da manhã com sessões rigorosas de treinamento que duravam até pouco antes de sua missa matinal. Apesar do desgaste físico, ele continuou firme em seu propósito. Seu primeiro combate lhe rendeu apenas 15 dólares. Sua identidade secreta foi, entretanto, acidentalmente revelada por outro lutador, Huracán Ramírez, só que o lapso acabou impulsionando sua fama e o levou a competir em lutas internacionais, pois sua determinação e a singularidade de sua história atraíram a atenção do público. Ele rapidamente subiu na hierarquia da lucha libre mexicana, chegando a lutar nos Estados Unidos, Canadá e Japão.
Embora repleta de desafios físicos – incluindo braços deslocados, um nariz quebrado e costelas fraturadas –, sua carreira nos ringues deu-lhe a oportunidade de oferecer um futuro melhor para as crianças e adolescentes sob seus cuidados. Durante quatro décadas, Fray Tormenta usou a lucha libre para levantar fundos e conscientizar o público sobre o seu orfanato. Apesar de nunca ter alcançado a fortuna que sonhava, sua iniciativa ajudou mais de duas mil crianças, muitas das quais se tornaram profissionais bem-sucedidos em diversas áreas. Mesmo depois de se aposentar dos ringues, no ano 2000 (ele lutou ocasionalmente até 2014) e de sobreviver a um grave caso de COVID-19 em 2020, Gutiérrez Benítez continuou a apoiar seu orfanato, vendendo memorabilia e permanecendo ativo em sua comunidade. Ele tem, hoje, 79 anos, e ainda precisa lutar, metaforicamente, por seus projetos sociais.
Sua história inspirou a criação de personagens em videogames, como King de “Tekken” e Tizoc de “Fatal Fury”. Em 1991, o cineasta francês Eric Duret realizou o filme L’Homme au masque d’or (O Homem da Máscara Dourada), estrelado por Jean Reno e inspirado livremente em sua vida. Quinze anos depois, em 2006, Fray Tormenta ganhou nova vida nas telonas com o filme Nacho Libre, dirigido por Jared Hess e estrelado por Jack Black. Gutiérrez Benítez fez uma aparição especial, interpretando um lutador aposentado. Em 2007, ele estrelou o filme Padre Tormenta, interpretando um padre que veste a máscara de luchador e entra no ringue para arrecadar fundos para o orfanato que dirige. Atualmente, Fray Tormenta também é um personagem coadjuvante na série de quadrinhos mexicana Místico: El Principe de Plata y Oro, na qual é o mentor de um luchador chamado Místico.
Foto de destaque: E. Vaquerizo
Comentários