Na abertura oficial do 2º Congresso Brasileiro das Academias de Letras o poeta, advogado e político Zenaldo Coutinho, membro da Academia Paraense de Letras, provocou encantamento e arrancou aplausos dos acadêmicos e convidados que lotavam a Sala Multiuso da Assembleia Legislativa, que ele já presidiu quando foi deputado estadual, além de ter sido deputado federal e prefeito de Belém por duas gestões. Destacando a extraordinária vida e obra do poeta, contista, cronista, romancista, jornalista, dramaturgo e compositor parauara Antonio Tavernard, e as circunstâncias de sua morte, ele recitou “A Última Carta”, pungente poema que calou fundo na plateia, emocionada diante da imensa dor que Tavernard traduziu em arte. Acossado pela Hanseníase, que na época não tinha cura, ele se exilou durante dez anos no chalé de madeira que chamava de Rancho Fundo, e faleceu em 2 de maio de 1936, após ataque cardíaco fulminante, aos 28 anos.
Tavernard foi um dos redatores da revista A Semana, uma das mais importantes a circular em Belém na década de 1930, ano em que publicou o livro de contos intitulado “Fêmea”. Lançou a comédia “A menina do 20.000”, em parceria com Fernando de Castro. Escreveu em seguida a peça “A casa da viúva Costa”; “Seringadela”; “Que tarde” e “Parati”, e, ainda, “Epopéia Azul” e a letra do hino oficial do Clube do Remo. Publicados postumamente, “Os Sacrificados” e “Místicos e Bárbaros”, em 1953. Algumas de suas peças foram representadas no início da década de 1930 no Palace Teatro, pertencente ao antigo Grande Hotel (onde funcionou o Hilton Hotel e hoje Princesa Louçã), em Belém.
Filho do teatrólogo Othílio de Alencar Tavernard e Marietta Frazão, Antônio de Nazareth Frazão Tavernard nasceu em 10 de outubro de 1908, na antiga Vila Pinheiro, atual distrito de Icoaraci. Era o segundo domingo e dia do Círio de Nossa Senhora de Nazaré. A família residia em um amplo chalé em estilo português na Rua Siqueira Mendes (1ª Rua), nº 585, em frente à baía de Guajará. A família se mudou para o centro de Belém e em 1917, com 9 anos de idade, Antonio Tavernard obteve o segundo lugar no Concurso de Contos Nacionais da Revista Primeira.
Em 1919, já no Ginásio Paes de Carvalho, era ativo colaborador do jornal escolar (O C.P.C) e em 1926, aos 18 anos, ingressou na Faculdade Livre de Direito do Pará, mas não concluiu o primeiro ano em razão da hanseníase. A pedido do próprio Tavernard foi construído um pequeno chalé de madeira no quintal da família, batizado “Rancho Fundo”, onde morou até seu último dia.
Mais de 250 poesias de sua autoria foram publicadas nos vários jornais da cidade, como, por exemplo, a extinta Folha do Norte. Foi sepultado no Cemitério de Santa Isabel, em Belém.
Em 1960, o antropólogo e pesquisador paraense Vicente Salles conquistou prêmio da Academia Paraense de Letras com o ensaio literário sobre o poeta Tavernard. Em 1981, pela obra também sobre ele, outro prêmio da Academia Paraense de Letras foi para a professora Margarida Maria do Nascimento Paiva, primeiro lugar em Concurso Literário.
Em 1998, quando ele completaria 90 anos de idade, a Universidade da Amazônia realizou o Simpósio Antônio Tavernard e lançou a edição nº 9 da “Revista Asas da Palavra” com um dossiê sobre sua vida e obra. No centenário de seu nascimento em 2008, o poeta foi o escritor patrono da 11ª Feira Pan Amazônica do Livro, reconhecimento à sua importância e contribuição à Literatura paraense. Nesse mesmo ano, foi inaugurada em Icoaraci a Biblioteca Comunitária Antônio Tavernard, projeto social voluntário sem fins lucrativos, de incentivo à leitura e acesso democrático ao livro, que em sua plenitude resgatou o nome do poeta, que estava esquecido face o abandono do chalé na Rua Siqueira Mendes. O poeta dá nome à rua que passa na Fundação Cultural do Pará (Centur) e ao Complexo Hidroviário da Ilha de Cotijuba. No chalé em Icoaraci funcionou por um tempo a partir de 1986 a “Casa do Poeta”. Ali era possível conhecer os objetos pertencentes a Tavernard e suas obras, dos quais não mais se tem notícia.
“Sobre o leito de morte do poeta, foi encontrado este papel cheio de letras
trêmulas e manchado de lágrimas”.
… … … … … … … … … … … …
“Por que não me vens ver? Estou doente…
É possível que morra com o luar…
Anda, lá fora, um vento, tristemente,
as ilusões das rosas a esfolhar.
E, aqui dentro, na alcova penumbrada,
onde arquejo, sozinho, sem sequer
a invisível presença abençoada
de um pensamento meigo de mulher,
há o desconsolo imenso, a imensa dor
de alguém que vai morrer sem seu amor…
De quando em quando,
o coração, que sinto
cada vez mais cansado, se arrastando,
marcando o tempo, recontando as horas,
pergunta-me, num sopro quase extinto,
quando é que virás…
Volta depressa, sim?… Se te demoras,
já não me encontrarás…
Ouço, longe, a gemer de harpas eólias…
É de febre… Começo a delirar…
Desabrocham, no parque, as magnólias…
Vem surgindo o luar…
E, como a luz do luar que vem nascendo,
eu vou aos poucos, meu amor, morrendo…”
Antônio Tavernard
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