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A Praça do Relógio, a Praça do Carmo, a Praça das Mercês e a Praça das Sereias foram totalmente restauradas no final de 2020 e dotadas de balizadores metálicos em seu entorno, a fim de protegê-las da falta de civilidade dos que costumam usá-las como estacionamento, eis que situadas no bairro da Cidade Velha, centro histórico de Belém do Pará, e figuram entre os primeiros conjuntos arquitetônicos, urbanísticos e paisagísticos tombados pelo Iphan. Na Praça do Relógio não houve tempo sequer de fotografar os balizadores. Sumiram para que os caminhões de peixes e de gelo e as vans continuassem a subir nas calçadas, ocupar o logradouro e promover o caos. E ninguém fez algo. Aliás, ali, em plena enseada do Ver-O-Peso, área com intenso movimento diuturno, foram furtados repetidas vezes até os tapumes metálicos colocados no entorno da praça durante as obras de restauro, e, tal qual “Conceição”, eternizada na voz de Cauby Peixoto, ninguém sabe, ninguém viu.

Na Praça do Carmo, os balizadores foram desaparecendo a cada dia, e mesmo o crime sendo denunciado com veemência diariamente pela presidente da Associação Cidade Velha – Cidade Viva, Dulce Rosa Rocque, nenhuma providência foi tomada. Dulce Rosa, uma cidadã exemplar, documentou desde o primeiro furto. Oficiou às autoridades. Bradou através das redes sociais. Em vão, até que todos os balizadores se foram. Ali fica a igreja de Nossa Senhora do Carmo, primeira igreja de Belém e de toda a Amazônia, construída em 1.626 quando a Ordem Carmelita se estabeleceu no Pará e ampliada em 1766 em projeto do arquiteto italiano Antonio Landi. Com fachada em estilo neoclássico e interior barroco, joia histórica e arquitetônica de valor inestimável, muito além da arte sacra representa a memória do povo paraense desde o século XVII. Durante a Cabanagem, a igreja foi usada pelas tropas imperiais e os cabanos entraram nela e encurralaram os soldados atrás do altar, que só não foram mortos pela providencial intercessão do bispo Dom Romualdo Coelho. Pois bem. Arrancadas as proteções, os selvagens de sempre utilizam o lugar sem a menor cerimônia – e o mais grave, sem serem incomodados pelo poder público – para estacionar os seus carros até no meio da praça, passando literalmente por cima dos direitos de cidadania insculpidos na Constituição e que são cláusulas pétreas.

Na praça das Mercês fica um belíssimo conjunto de casarões coloniais e o antigo Convento e Igreja de Nossa Senhora das Mercês, construído pelos padres mercedários em 1640 inicialmente de taipa coberta de palha, depois taipa-de-mão e de pilão e após mais de cem anos foi iniciada a construção em alvenaria de pedra, concluída em 1777. Projetada pelo arquiteto italiano Antônio José Landi, é uma das poucas igrejas brasileiras com fachada convexa e frontão de linhas onduladas. Em 1794, com a expulsão dos mercedários, as dependências do Convento passaram a sediar a Alfândega. A edificação foi intensamente utilizada durante a revolta da Cabanagem em 1835, tendo ali funcionado, posteriormente, o Trem de Guerra e o Quartel de Milícia, além do Arsenal de Guerra, a Recebedoria Provincial, os Correios, o Corpo de Artilharia e o Batalhão de Caçadores. Pois ali também todos os balizadores metálicos colocados em 2020, quando a prefeitura resgatou a praça, foram roubados à luz do dia. A página “ArchiUrbe”, do Facebook, chegou a postar um vídeo em dezembro do ano passado mostrando indivíduos arrancando os balizadores. Nenhuma medida foi tomada para coibir e punir o crime.

Por sua vez, o Chafariz das Sereias, localizado no antigo Largo da Pólvora, atual Praça da República, é cercado por um jardim circular, rodeado com gradil em ferro trabalhado. A belíssima fonte era, nos idos de 1884, local de venda de água da Companhia das Águas do Grão-Pará. Pois serraram todo o gradil, agora já não existem mais os delicados bordados no ferro e, como sempre, nenhum órgão responsável pela proteção das áreas e conjuntos urbanísticos tomou alguma atitude. Carretas com dezenas de pneus estacionam sobre as calçadas de liós da Cidade Velha, tombadas como patrimônio histórico, artístico e cultural nos âmbitos municipal, estadual e federal. Que, afundadas, quebradas e de alturas totalmente irregulares, são intransitáveis por pedestres e cadeirantes. A Constituição, o Estatuto da Cidade, o Código de Postura, a Lei Orgânica do Município, todo o arcabouço de leis e costumes que rege uma sociedade minimamente civilizada é desrespeitado, pela inércia tanto do poder público quanto da população, que deveria fazer valer os seus direitos.

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