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O juiz Wallace Carneiro de Sousa julgou o mérito da ação e ordenou a imediata reintegração do Delegado Fonseca ao cargo de prefeito de Oriximiná. Ele desembarca hoje por volta das 17h e está prevista grande carreata até a Prefeitura Municipal, onde tomará posse e em seguida será celebrado um culto ecumênico no complexo esportivo da cidade, que ontem à noite comemorou com grande festa na rua.

Na sentença, com 31 páginas, o magistrado ressalta que também o Ministério Público entendeu não ter havido contratação de 1465 servidores temporários, vez que existia um “negócio jurídico simulado”: as gestões anteriores utilizavam esquema de contratar serviço de pessoa física para burlar a obrigação de realizar concurso público de provas e títulos para a contratação de pessoal, fato criminoso que os vereadores, estranhamente, não tinham como desconhecer mas não tomaram qualquer providência.

Esses trabalhadores já pertenciam ao quadro da Prefeitura de Oriximiná, com vínculo simulado, e quando o prefeito Delegado Fonseca os contratou como temporários apenas desnudou a verdadeira personalidade jurídica dessas contratações, pontuou o juiz, aduzindo que, quanto ao número excedente de contratos (produto da diminuição entre o número de temporários até junho de 2021 e o número de “planilhados” em janeiro de 2021), 141 temporários, não é razoável concluir pela ilegalidade dessas contratações, ainda mais no período curto de seis meses, em pandemia da Covid 19, somada ao estado de calamidade decorrente das cheias do rio Trombetas, o que não configura ilegalidade.

A decisão salienta o fato de que não há qualquer prova quanto ao dolo de ter vantagem ilícita por parte do prefeito Delegado Fonseca, e que ele demonstrou boa-fé ao levar a conhecimento do Tribunal de Contas dos Municípios a situação dos “planilhados”, consultando a Corte de Contas sobre o melhor caminho a ser tomado pela administração pública.

O juiz frisa que “cuida-se de não substituir a vontade popular pela de seus opositores políticos. Vê-se aqui a responsabilidade deste julgador, e dos demais que me sucederem, com as consequências do pronunciamento judicial. Com razão o Ministério Público. Falta tipicidade para a regularidade de todo o procedimento investigativo, não possuindo justa causa para seu processamento e julgamento. Ora, está a se condenar o autor por ter contratado ilegalmente 1.465 servidores temporários, não sendo estas contratações ilegais, some a razão (justa causa) para a condenação, permitindo assim, o controle de legalidade pelo Poder Judiciário. Não há aqui qualquer afronta à independência dos poderes, mas uma legitimidade conferida pela Constituição para que o Poder Judiciário corrija as distorções perpetradas por outros poderes e, em última análise, proteja a força normativa da Constituição. Filio-me à corrente, capitaneada pelo STF, que afirma ser a natureza jurídica do impeachment um processo jurídico-político e não exclusivamente político, pois defender o contrário é advogar a ideia de um Poder Judiciário “acovardado”, retraído e a reboque dos demais poderes, como já foi até meados do século XX”.

Na sentença, o juiz Wallace Carneiro acentuou: “Não há como sustentar que a contratação de 1.465 servidores temporários, dos quais 1.324 (temporários + “planilhados”) já pertenciam o quadro da administração, sendo 1.141 sob vínculo simulado, seja considerada ato ilegal e com isso remova um mandato constitucionalmente delegado pelo povo através do sufrágio universal. Aliás, como bem sublinhado pelo MP, a ré em momento algum se esforçou para demonstrar qualquer dolo de aproveitamento pelo autor, não há nos autos ou nos documentos juntados pela ré a prova de que as contratações beneficiaram parentes do autor, foram moedas de trocas em acordos espúrios, seriam fantasmas ou mesmo esquema de “rachadinhas” e etc…”

O magistrado prossegue, evidenciando que “ a atitude do autor em levar ao conhecimento do Órgão de Controle Externo a situação de espúria ilegalidade (contratos de prestação de serviço de pessoa física para falsear o vínculo funcional com a Prefeitura), não é compatível com qualquer espécie de dolo. Portanto, não há ilegalidade na mudança de vínculo de prestadores de serviço de pessoa física para servidores temporários, uma vez que esta contratação já havia acontecido antes mesmo do autor assumir a Prefeitura. Perseguindo a tipicidade da conduta investigada, logo visualizamos que o número de 1.465 contratações de servidores temporários não é real, pois deste montante 1.141 já pertenciam aos quadros da Prefeitura sob negócio jurídico simulado, ou seja, o vínculo já existia – mesmo que camuflado – e por isso não se pode atribuir ao autor as referidas contratações como ilegais”.

A Câmara Municipal de Oriximiná questionou o porquê de o prefeito Delegado Fonseca não ter mudado o vínculo dos planilhados em um único ato ao invés de fazê-lo parceladamente. “A pergunta não parece ser de difícil resposta, apesar de não se conhecer o motivo dessa opção pelo administrador público, sabe-se que trazer esses trabalhadores para dentro de uma legislação que os protege com direitos funcionais (férias, décimo terceiro, previdência e etc..) requer um aumento de gastos com a folha de pagamento. De imediato, poderia também se obstar que essa mudança de vínculo trouxe prejuízo aos cofres públicos com o aumento com gastos de pessoais. De fato, gera aumento, mas não podemos esquecer que houve um negócio jurídico simulado, trabalhadores “de carne e osso” estavam a margem de seus direitos trabalhistas e o reconhecimento de seus direitos não pode gerar o condão de macular de ilegalidade a efetiva regularização. Poderá se questionar ainda, mas os 141 servidores temporários contratados sem processo seletivo prévio? Pergunta respondida a contento pelo Ministério Público em seu parecer final. Ora, a quantia de 141 já não pode ser qualificada como “exacerbada” (termo utilizado no parecer da Comissão Legislativa), mas decisão do administrador público em contratar emergencialmente diante de um quadro pandêmico da Covid- 19 e somado ao estado de calamidade ocasionado pelas cheias do rio Trombetas não permitem taxar de ilegais a opção feita pelo gestor público. Ademais, o número de 141 contratações não é capaz de demonstrar o dolo do administrador. Entretanto, ainda que resista o fato de não ter feito o processo seletivo prévio, o Ministério Público classificou tal omissão como falta de segunda ordem, face a todo contexto apresentado, diante da necessidade da continuidade ao serviço público precisou dar respostas urgentes para as urgências vivenciadas. Aqui mais uma vez o MP foi cirúrgico, não há como se elevar esta falta a categoria de ilegalidade, porém, para além disso, não é constitucionalmente aceito que um mandado sufragado pelo povo seja dele retirado por este fato, pois percebe-se facilmente a tamanha desproporção entre a gravidade do fato e a gravidade da consequência. Deste modo, aplico o necessário art. 22 da LINDB para afastar a ilegalidade da conduta examinada. Repiso que não está a se imiscuí no mérito do Poder Legislativo, mas apenas sanar um ato ilegal face a inexistência de seus motivos”, fulminou o juiz.

Esta não é a primeira vez que o TJPA se depara com vício de competência em procedimentos de responsabilidade de Prefeitos Municipais que levaram a cassação do chefe do executivo local, e a Primeira Turma de Direito Público do TJPA já se pronunciou a respeito da usurpação da competência do Poder Judiciário pelo Legislativo local. O procedimento instaurado pela Câmara, caso o fato investigado fosse típico, padeceria também de uma questão de ordem pública, mais especificamente quanto à competência para processar os fatos investigados, pois, conforme distinção feita pelo próprio Decreto Lei 201/67, caberia ao Poder Judiciário o julgamento de tais fatos e não ao Poder Legislativo.

 “O Poder Legislativo Municipal de Oriximiná, ao julgar o autor por contratação irregular de pessoal, feriu a competência do Poder Judiciário e, por consequência, a norma constitucional do devido processo legal, negando ao autor o seu juízo natural”, concluiu o magistrado.

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