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O juiz de Rondon do Pará, Gabriel Costa Ribeiro, determinou à prefeita Cristina Malcher que providencie local adequado para os 300 casamentos comunitários que ela queria realizar durante a Exposição Agropecuária do município, financiados com recursos da Alepa. O magistrado levou um susto quando soube do evento pelo Secretário Municipal de Assistência Social, João Malcher Dias Neto, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais e da Associação Agropecuária Rondonense, além de marido da prefeita.

Eis a íntegra do ofício:

“Excelentíssima Senhora
Shirley Cristina de Barros Malcher
Prefeita Municipal de Rondon do Pará

Senhora Prefeita,

Honrado em cumprimentá-la, venho informar que – nos termos do ofício 046/2011 recebido da tabeliã do serviço notarial de Rondon do Pará, sra. Elcíria de Nazaré de Oliveira – como Juiz Corregedor do serviço notarial, realizarei pessoalmente o casamento comunitário em que aproximadamente 300 casais irão formalizar sua união nos termos da lei.


Também de posse do ofício 028/2011, firmado pelo sr. João Malcher Dias Neto, Presidente do Sindicato dos Produtores Rurais e Associação Agropecuária Rondonense, tomei conhecimento de que os quase 300 casamentos serão pagos com verbas oriundas da Assembléia Legislativa do Estado do Pará, com transferência de verbas públicas para custear os emolumentos pertencentes à serventia notarial e demais despesas. 

Ainda no ofício retrocitado, o sr. João Malcher asseverou que: “a cerimônia será realizada em meio à nossa já consagrada Exposição Agropecuária de Rondon do Pará quando todos (sic) as atenções estarão voltadas para o nosso Município dando, por conseguinte, grande visibilidade à essa solenidade.”
Por outro lado, já como Secretário Municipal de Assistência Social, o sr. João Malcher Dias Neto, em ofício com papel timbrado do Município de Rondon do Pará informa que: “no dia 17 de julho de 2011 a partir das 16h no Parque de Exposição Alacid Nunes será realizado pela Prefeitura Municipal de Rondon do Pará, através da Secretaria Municipal de Promoção e Assistência Social, em parceria com a Assembléia Legislativa do Estado e Sindicato de Produtores Rurais e Associações Agropecuária Rondonense, o Casamento com participação de 300 (trezentos) casais.”

Em assim sendo, constata-se visivelmente que o Presidente da Associação Agropecuária, também cumula o cargo público de Secretário Municipal de Assistência Social, que por sua vez é marido da Exma. Sra. Prefeita Municipal Shirley Cristina de Barros Malcher, o que faz com que o evento no parque de exposição no dia em que se inicia a festa agropecuária do Munícipio, atividade com fins privados, não se coaduna com os princípios da impessoalidade previsto no art. 37, caput, da Costituição Federal, malfere, à primeira vista, também normas constantes das Leis n° 8.429/92 e Lei  n° 4.737/65.

Some-se a isso o fato de que em festas agropecuárias não são locais adequados para atos solenes, como o casamento, previstos no Código Civil, posto que em tais festas o que se espera são peões, vacas, ovelhas e galinhas de raça expostas, rodeios, vaquejada, etc.. e não é comum, tornando-se, portanto, quiçá vexatória a presença de centenas de noivas com véus e grinaldas e suas respectivas damas de honra.

Considerando a origem das verbas que financiaram o evento, oriundas da Assembléia Legislativa do Estado, o casamento feito em um parque de exposição agropecuária, também, prima facie, viola a lei de improbidade em diversos artigos, bem como pelo vinculo entre a Exma Prefeita Municipal e seu marido que cumula o cargo de Secretário de Assistência Social e Presidente do Parque de exposição agropecuário, sinaliza, em uma análise perfunctória, também para uma aparente violação da legislação eleitoral vigente, cuja análise pormenorizada não deve ser feita nesse momento.
Quanto aos nubentes, expô-los no ato da cerimônia de casamento, em regra vestidos a caráter, com o ambiente de festas agropecuárias, como, por exemplo, peões, vacas, cavalos e demais animais que protagonizam esse tipo de festejo, equivale à exposição que malfere a dignidade da pessoa humana, portanto também contrário às normas constitucionais vigentes (art. 1°, III, CF/88).

Por fim, nos termos do art. 1.534 do Código Civil, a lei reza que: “A solenidade realizar-se-á na sede do cartório, com toda publicidade, a portas abertas, presentes, pelo menos 2 (duas) testemunhas, parentes ou não dos contraentes, ou, querendo as partes e consentido a autoridade celebrante, noutro edifício público ou particular.”

Sendo assim, por ser casamento comunitário custeado com verbas públicas, não há como a autoridade celebrante, no caso  o magistrado ora signatário, nos termos da lei, “consentir” que este se realize no meio de comemorações de agronegócio e feira agropecuária. Em Rondon do Pará, é público e notório, já houve outros casamentos comunitários e estes foram realizados em espaço público (ginásio público do município de Rondon do Pará), local em que novamente deverá ser realizado, caso não haja outro local público adequado ao ato solene exigido e regulamentado pela Lei n ° 6.015/73, sempre atento à conveniência do administrador público. 


Em face do exposto, o Magistrado ora signatário, autoridade celebrante, não consente, pelos motivos já expostos, com a realização de 300 casamentos, financiados com dinheiro público, em espaço agropecuário, mormente pelo fato de coincidir com o início das festividades agropecuárias de 2011.

Sendo assim, deverá o Município de Rondon do Pará providenciar local público adequado para a cerimônia de casamento, em nome da probidade, legalidade, impessoalidade e garantia da intimidade dos nubentes e dignidade da pessoa humana, devendo inclusive comunicar os casais de que o casamento não se realizará no parque de exposição agropecuária, bem como informá-los do novo local a ser escolhido, com comunicação prévia ao Juízo desta Comarca de Rondon do Pará, mesmo que para isso, se for o caso, seja necessário alterar data e horário do evento.

Encaminhe-se cópia do presente ofício à tabeliã do serviço notarial de Rondon do Pará, para eventuais providências cabíveis.

Finalmente, reitero votos de elevado respeito. 

Atenciosamente,
Gabriel Costa Ribeiro
Juiz de Direito”
Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, presidente da Academia Paraense de Jornalismo, membro da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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