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De 1985 a 2020 o impacto do fogo sobre o território nacional destruiu 150.957 km² por ano. As estatísticas são dramáticas: o Brasil perdeu 24 árvores por segundo durante todo o ano de 2020, 3.795 hectares desmatados em média. No dia mais crítico, 31 de julho, foram desmatados 4.968 hectares, quase 575 m2 por segundo. E o Pará é campeão de desmatamento, com 33% dos alertas e 26% da área desmatada total (366 mil hectares), seguido pelo Mato Grosso, com 13%, e o Maranhão, com 12%. O índice de provável ilegalidade é maior do que 95% em todos os biomas. Ele é mais baixo no Cerrado, onde 97,78% da área de alertas de desmatamento apresenta pelo menos um indício de irregularidade – seja falta de autorização no Sinaflor (o sistema do Ibama onde em tese todos os pedidos de desmatamento precisam ser registrados e liberados), seja sobreposição com áreas protegidas, planos de manejo florestal sustentável ou desconformidade com o Código Florestal. Na Amazônia, são trágicos 99,4%. A cada ano, a Amazônia perde o equivalente a pelo menos seis vezes a área média desmatada nos últimos três anos no bioma para incêndios ambientais (64.955 km²/ano). No acumulado do período, foram 690.028 km², ou 16,4% do total do bioma. E 39% de toda a área queimada no país nesse período ficam na Amazônia.

O cenário calamitoso deriva do fato de que só 2% dos alertas e 5% da área desmatada entre 2019 e 2020 sofreram multas ou embargos pelo Ibama. No caso da Amazônia, nos 52 municípios considerados críticos pelas políticas do Ministério do Meio Ambiente, somente 2% dos alertas e 9,3% da área desmatada tiveram ações de punição. Nos 11 municípios definidos pelo Conselho da Amazônia como prioritários, 3% dos alertas e 12% da área desmatada tiveram ações desse tipo.  Cinquenta municípios concentram 37,2% dos alertas e 49,2% da área desmatada no país. Eles são liderados por Altamira (PA, com 60.608 hectares, aumento de 12% em relação a 2019), São Félix do Xingu (PA, 45.587 hectares) e Porto Velho (RO, 44.076 hectares). Também integram esse triste ranking os municípios paraenses de Novo Progresso, Itaituba, Pacajá, Portel, Senador José Porfírio, Novo Repartimento, Anapu, Rurópolis, Placas, Uruará, Trairão, Jacareacanga e Medicilândia. Entre as Unidades de Conservação, as APAS (Áreas de Proteção Ambiental) do Xingu, do Tapajós e do Lago de Tucuruí, as Flonas (Florestas Nacionais) do Jamanxim e de Altamira, a Rebio (Reserva Biológica) Nascentes da Serra do Cachimbo, a Fes (Floresta Estadual) do Iriri, a Esec (Estação Ecológica) da Terra do Meio e  o Parna (Parque Nacional) do Jamanxim constam entre as mais desmatadas em 2020. Dos vinte municípios mais desmatados, apenas três ficam fora da Amazônia: Formosa do Rio Preto e São Desidério, no Cerrado baiano, e Corumbá, no Pantanal sul-mato-grossense.

Os dados são do MapBiomas e revelam que em pelo menos dois terços dos alertas é possível identificar os responsáveis pelo desmatamento: 68,3% das detecções validadas têm sobreposição total ou parcial com áreas inscritas no CAR, o Cadastro Ambiental Rural. No Pantanal e na Amazônia, esse número é ainda mais alto: 84,8% e 69,2%, respectivamente. Ou seja, em tese, esses proprietários poderiam ser multados até mesmo pelo correio, já que para ter registro no CAR é preciso fornecer os dados do requerente.

Tasso Azevedo, coordenador-geral do MapBiomas, adverte: “Em mais de dois terços dos casos, também é possível saber quem é o responsável. É preciso que os órgãos de controle autuem e embarguem as áreas desmatadas ilegalmente e as empresas eliminem essas áreas de suas cadeias de produção.”

Em relação ao fogo em área antropizada, as pastagens registraram maior área queimada no Pará, com 60% em relação às áreas de agricultura ou mosaico de agropecuária (menos de 1%). É digno de registro que 73% dos incêndios na Amazônia ocorreram nos meses de agosto (17%) setembro (34%) e outubro (22%).

Para chegar a esses números, inéditos, a equipe do MapBiomas processou mais de 150 mil imagens geradas pelos satélites Landsat 5, 7 e 8, de 1985 a 2020. Com a ajuda de inteligência artificial, foi analisada a área queimada em cada pixel de 30m X 30m dos mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados do território brasileiro ao longo dos 36 anos, independente do uso e cobertura da terra. Ao todo, foram 108 terabytes de imagens processadas para mostrar áreas, anos e meses de maior e menor incidência do fogo.

Os dados são impressionantes. A cada ano o Brasil queimou uma área maior que a da Inglaterra: foram 150.957 km² por ano, ou 1,8% do país. O acumulado chega a um quinto do território nacional: 1.672.142 km², ou 19,6% do Brasil. Quase dois terços (65%) dos incêndios aconteceram em áreas de vegetação nativa. Na região do Cerrado, a área queimada por ano desde 1985 equivale a 44 Chapadas da Diamantina.

“Analisar as cicatrizes do fogo ao longo do tempo permite entender as mudanças no seu regime e o avanço sobre o território brasileiro. Saímos de menos de 200 mil Km² de área queimada em 1985 para chegar perto de 2 milhões de Km² em 2020 em uma escalada constante e ininterrupta”, explica Ane Alencar, coordenadora do MapBiomas Fogo. “Outro dado preocupante é que cerca de 61% das áreas afetadas pelo fogo entre 1985 e 2020 foram queimadas duas vezes ou mais, ou seja, não estamos falando de eventos isolados”, complementa.

Embora os grandes picos de área queimada no Brasil tenham sido principalmente em anos impactados por eventos de seca extrema (1987, 1988, 1993, 1998, 1999, 2007, 2010, 2017), altas taxas de desmatamento principalmente antes de 2005 e depois de 2019 tiveram enorme impacto no aumento da área queimada nesses períodos. A estação seca, entre julho e outubro, concentra 83% da ocorrência de eventos de fogo.

Os dados de áreas de queimadas e incêndios florestais estão disponíveis em mapa e estatísticas anual, mensal e acumulada em para qualquer período entre 1985 e 2020, aqui.  A plataforma também inclui dados de frequência de fogo, indicando as áreas mais afetadas nos últimos 36 anos. A resolução é de 30m, com indicação do tipo de cobertura e uso da terra que queimou, permitindo recortes territoriais e fundiários por bioma, estado, município, bacia hidrográfica, unidade de conservação, terra indígena, assentamentos e áreas com CAR.

A MapBiomas é uma iniciativa multi-institucional, que envolve universidades, ONGs e empresas de tecnologia, focada em monitorar as transformações na cobertura e no uso da terra no Brasil. Todos os dados, mapas, método e códigos do MapBiomas são públicos e gratuitos.

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