Publicado em: 26 de março de 2025
O ex-presidente Jair Bolsonaro se tornou oficialmente réu por tentativa de golpe de Estado, após decisão unânime da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira, 26 de março. Também se tornaram réus sete de seus principais aliados e ex-assessores: o ex-ministro da Casa Civil, Braga Netto: o ex-ministro da Justiça, Anderson Torres; o ex-ministro do GSI, Augusto Heleno; o ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira; o ex-diretor da Abin Alexandre Ramagem; o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier; e o ex-ajudante de ordens da Presidência, Mauro Cid.
A decisão configura o início de uma ação penal no STF em que os acusados serão julgados por crimes como abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, organização criminosa e danos ao patrimônio público e tombado.
Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), os oito compõem o chamado “núcleo crucial” da tentativa de ruptura democrática. A acusação afirma que o grupo atuou de maneira coordenada até janeiro de 2023, buscando abalar o Estado Democrático de Direito, inclusive após a derrota eleitoral de Bolsonaro.
O relator, ministro Alexandre de Moraes, abriu a votação com um voto de 1h50min, afirmando que há provas robustas de organização criminosa, com hierarquia, divisão de tarefas e objetivo golpista. Segundo Moraes, Bolsonaro liderou uma estrutura que difundiu mentiras sobre o sistema eleitoral e pressionou militares a publicarem notas técnicas para alimentar a insatisfação nos quartéis.
“Não houve um domingo no parque”, afirmou o ministro, exibindo imagens da invasão aos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023. “Até a máfia poupa familiares. A organização criminosa em questão não teve esse pudor.”
O ministro Flávio Dino afirmou que a denúncia é sólida, baseada em ampla documentação, e que as defesas não negaram a tentativa de golpe, mas buscaram isentar seus clientes. “Houve violência e poderia ter produzido danos de enorme proporção. A conduta é tentar. Se fosse consumado, não teria juízes pra julgar”.
Luiz Fux também votou pela abertura da ação penal, destacando que “todo crime tem atos preparatórios. Todo crime tem tentativa. Está na lei”.
A ministra Cármen Lúcia classificou os ataques como parte de uma engrenagem golpista que se construiu ao longo do tempo. “Não foi uma festinha de final de tarde, em que todo mundo resolveu comparecer e usar paus e pedras para arrebentar com tudo.” Ela lembrou que pediu a antecipação da diplomação de Lula em dezembro de 2022 por temer a instabilidade institucional crescente.
Último a votar, o ministro Cristiano Zanin reforçou que a denúncia da PGR não se apoia apenas na delação de Mauro Cid, mas em vídeos, documentos e mensagens que demonstram envolvimento prévio de Bolsonaro e aliados na trama golpista. Rebateu ainda as defesas que alegaram ausência dos réus no dia 8 de janeiro: “Não adianta dizer que a pessoa não estava no dia 8 se ela participou de uma série de atos que culminaram nos ataques.”
Com a aceitação da denúncia, os oito acusados passam a ser réus formais em processo penal. A partir de agora, a PGR e os advogados de defesa poderão apresentar provas, testemunhas e argumentos. Ao final do processo, os ministros do STF julgarão se houve crime e poderão aplicar penas que incluem a perda de direitos políticos e a prisão.
A denúncia sustenta que Bolsonaro e seus aliados atuaram de maneira estável, organizada e hierárquica para promover a abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentar um golpe de Estado, constituir uma organização criminosa, causar dano qualificado ao patrimônio da União e deteriorar patrimônio público tombado.
Entre os elementos considerados estão a minuta de decreto de golpe, supostamente discutida por Bolsonaro; a produção e divulgação de notas técnicas com informações falsas sobre urnas eletrônicas; e a mobilização de apoiadores para permanência em quartéis e ações de insubordinação militar.
Durante a sessão, os advogados dos agora réus alegaram que seus clientes não participaram da tentativa de golpe, apesar de não negarem a existência de articulações nesse sentido. Também questionaram o acesso à íntegra dos autos e a suposta generalização das acusações. Pediram, sem sucesso, a rejeição da denúncia.
A decisão desta quarta-feira é o primeiro grande avanço judicial contra o ex-presidente Jair Bolsonaro por seu envolvimento na tentativa de romper a ordem democrática. O julgamento sobre a responsabilidade de autoridades envolvidas nos atos de 8 de janeiro de 2023 e terá desdobramentos políticos e jurídicos extremamente relevantes para a história do Brasil.
Foto: Lula Marques / Agência Brasil
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