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O Ministério Público Federal está apurando denúncias de que um grupo fortemente armado atacou 54 famílias moradoras do lote 96 da Gleba Bacajá, hoje à tarde. A terra é alvo de disputa entre agricultores e grileiros e fica localizada no município de Anapu, no sudoeste do Pará, às margens da rodovia BR-230, a Transamazônica. A Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal foram acionadas para que tomem medidas com urgência, diante da gravidade da situação. O Ministério Público do Estado do Pará também recebeu pedido de socorro, através do promotor de Justiça de Anapu e da promotoria agrária em Altamira. Foram requeridas providências, ainda, à Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social do Pará e à Secretaria de Justiça e Direitos Humanos, no sentido do envio de reforços para garantir a segurança no município, um dos mais violentos do Pará, marcado por sangrentos conflitos. Mas até agora não se tem notícia da chegada das forças policiais.

Conforme denúncias de moradores, por volta do meio-dia um grupo armado invadiu o lugar, incendiou casas e agrediu pessoas no acampamento. Eles também ameaçaram aqueles que filmavam a ação. Aparelhos celulares foram confiscados e destruídos pelos homens armados, que afirmaram ser policiais e cumprir reintegração de posse. Os agressores continuam no local e há relatos de que uma família está refém dos pistoleiros. As reintegrações de posse estão suspensas no país inteiro por ordem do Supremo Tribunal Federal. Em gravações que circulam nos grupos de WhatsApp de ativistas sociais, uma mulher relata chorando que “atearam fogo aqui na casa, eles disseram que era reintegração de posse, que tínhamos vinte minutos para sair dali. Eu pedi o mandado de busca e ele me amostrou foi a arma dele. Ele ateou fogo, revirou a casa inteira. Queimou tudo. Não tem nada lá dentro mais”. (sic)

A área é pública federal e o pretenso dono teve o título de propriedade cancelado pelo Incra, a pedido do MPF, em ação civil pública. O terreno está em processo de se tornar um assentamento de reforma agrária e já foi feita vistoria no imóvel, com posterior confecção um laudo agronômico de fiscalização. Uma das lideranças das famílias moradoras do lote 96 está no programa de proteção a defensores de direitos humanos por causa de ameaças à sua vida.

Foi em Anapu um dos crimes mais chocantes do Pará. Em 2005, a missionária norte-americana Dorothy Stang foi executada com seis tiros, portando uma bíblia nas mãos. Ao lado de sua sepultura, enfeitada com flores e foto dela, uma cruz vermelha cravada no chão tem dezenas de nomes de trabalhadores rurais assassinados nos últimos anos em Anapu.

O padre Amaro, que atuou ao lado de Dorothy, ficou 92 dias na prisão, sob falsas acusações, e lá também estava um dos condenados pelo assassinato da missionária, Regivaldo Pereira Galvão, o Taradão. “Desconfio que armaram para me matar dentro da cadeia”, afirma. Após conseguir habeas corpus, o religioso foi obrigado a deixar Anapu e vive na sede da Igreja, em Altamira. Ameaçado de morte, não pode caminhar pelas ruas. O cerne da questão envolvendo o padre é o lote 44, também conhecido como Fazenda Santa Maria, área equivalente a três mil campos de futebol, cuja posse é disputada judicialmente. Incra e o Ministério Público Federal pediram a destinação da área para a reforma agrária, o que foi acatado pela justiça federal de Altamira, mas a guerra continua.

Márcio Rodrigues dos Reis foi preso em março de 2017, quando tentava reconstruir o acampamento no lote 44, acusado de invasão de propriedade e porte ilegal de arma. Outro denunciante, Valdemir Resplandes dos Santos, foi assassinado em janeiro do ano seguinte. Dois de seus parentes também já foram mortos, assim como uma testemunha do crime. Dos 16 assassinatos de trabalhadores rurais de 2015 a 2018, só em um a investigação policial levou à prisão de suspeitos. Os demais seguem sem elucidação. Para a Comissão Pastoral da Terra da CNBB Norte 2, a impunidade é uma das causas da continuidade da violência.

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