Ler o terceiro livro de meu irmão Edgar Augusto é reviver emoções maravilhosas de uma história de vida. Quase sempre leio antecipadamente as crônicas que publica em O Diário do Pará às quintas feiras e me delicio com sua memória prodigiosa. Isso é uma coisa. Outra é ler o livro, crônica após crônica e sentir a emoção de tempos idos, vividos de maneira feliz. Edgar sempre teve boa memória. Irmão mais velho, ídolo, mentor, companheiro de brincadeiras e de trabalho, conheço quase todas as peripécias contadas, mas confesso que outras me surpreendem por lembrar e escrever de maneira tão deliciosa.
Uma vida longa e feliz. Quando saiu da brincadeira para o trabalho, o fez com a seriedade que marca sua trajetória e ao mesmo tempo, a alegria e felicidade de sempre ter feito o que gosta. Como me citou em algumas, quase sempre com o ”destruidor”, alcunha merecida por meu comportamento, digamos, mais agitado, penso em contar alguma nova, por exemplo. Apaixonado por Manga, goleiro do Botafogo, ganhou uma camisa, negra e a estrela solitária. Era domingo, no Lago Azul e jogávamos gol a gol na piscina. Súbito ele me convida a ir dar uma olhada no campo de peladas onde o pai estava jogando. Rumamos para lá na estrada de terra. Como sempre ocorre nas peladas, faltava um goleiro. Estavam os peladeiros na beira do campo, aguardando a aparição de alguma “vítima”. Edgar. Aos nos verem, vinham gritando, braços para o alto, em comitiva, dizendo “Manga! Manga!”. Ao que Edgar dizia que não ia jogar. Rápido o rodeavam fazendo mil propostas, presentes, brindes, outros acrescentando que nem iam chutar em sua direção e que ele atuaria apenas para cumprir a regra. Enfim, com seu comportamento sempre doce e gentil, aceitava, para, após o primeiro gol sofrido, ouvir reclamações. Outra vez, uma tarde de sábado, Lago Azul vazio, tínhamos uma bola. Havia dois rapazes que ao nos verem propuseram uma brincadeira de “dupla”. Enquanto dois ficam no gol, a outra dupla, um chuta e o outro, aguarda se haverá rebote. Éramos crianças. Os rapazes não se deram conta. Menor, magrinho, ficava quase atrás do Edgar e eles começaram a chutar forte. Boladas que ardem nas mãos. Deixamos ganharem e dissemos que a mãe havia chamado. Fomos bobos em aceitar o duelo e eles, infelizes em não perceber. E no botão? Irradiava e eu fazia ponta de gol. Ganhou um time. Me convidou. Montei o meu com tampas de remédio. Minha escalação era diferente> Simbad no gol, Vlamir (basquetebolista), Tarzan e enfim. Protestou que assim não dava. Ganhei um time, também. Tínhamos campeonatos carioca, paulista. Quando o time dele perdia, castigava os botões jogando-os contra a parede. Íamos juntos a pé ao colégio. No caminho, eu o perturbava “acertando o passo”, como soldados. Ele, tão doce, sempre suportou. Quando éramos os Beatles, ele sempre fazia John ou Paul. A mim, George. Não abria mão. Me ensinou, me fez descobrir tanta coisa! Leio suas crônicas e me emociono com seu olhar carinhoso, suas reflexões sobre os atos, as façanhas lembradas, os personagens da família, Belém dos anos 60 e 70, principalmente. Nossos pais, nossos irmãos, tios, os amigos de adolescência, algumas aventuras que hoje podem ser contadas e parecem tão inocentes! Leio e penso em uma vida inteira que está sendo contada. Bela maneira de contar. Uma vez, reunindo crônicas para mais um livro, percebi como o cronista se revela, fala de si, divide com o mundo seus particulares, sua maneira de viver. Fiquei até confuso. Lendo o Edgar, penso no privilégio de ser seu irmão, de ter acompanhado essa vida, para mim tão importante e do imenso amor e admiração que sinto por ele.
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