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Alarmado com as críticas avassaladoras que vem recebendo por conta do paisagismo horroroso que está sendo implantado nos parques lineares da Av. Visconde (Doca) de Souza Franco e da Av. Tamandaré, em Belém, o governador Helder Barbalho foi pessoalmente ao canteiro de obras da Doca hoje (30) à tarde, e gravou um vídeo tentando amenizar a situação.

A própria Comunicação do Governo do Pará anunciou na semana passada, em release distribuído via Agência Pará, árvores artificiais feitas de vergalhões reaproveitados das construções, sob o pretexto de que o plantio direto não é possível.  A partir da reação indignada da população e até de veículos de comunicação nacionais e internacionais, editaram a matéria usando o termo ‘jardins suspensos’ com plantas naturais apoiadas em uma estrutura de ferro.

O projeto é de autoria da arquiteta Naira Carvalho, da Secretaria de Obras Públicas do Pará, que assim justificou: “a ideia surgiu devido à necessidade de sombreamento e a não disponibilidade de solo para plantio. Precisamos adaptar a maneira de arborizar o parque inspirada em projetos de Singapura. Reaproveitar, reutilizar, reciclar e repensar é mais que uma tendência – é obrigação de todos nós que pensamos em sustentabilidade, e entendo que esta obrigação está inteiramente vinculada ao evento da COP”. Ela disse que o Parque Linear da Doca terá 80 e o da Av. Tamandaré 100 destas estruturas.

É inconcebível Belém do Pará, encravada no coração da maior floresta tropical do planeta, copiar paisagismo de Singapura. Uma vergonha mundial, ainda mais contando com o Numa – Núcleo de Meio Ambiente e o Naea – Núcleo de Altos Estudos Amazônicos da Universidade Federal do Pará, com cabeças pensantes brilhantes capazes de dotar a cidade de criações belas e em harmonia com a floresta e suas características. Sequer se inspiraram no passado. No período da Belle Époque, o paisagismo naturalista fez praças belíssimas como a Batista Campos e a da República.

Qualquer jardineiro do Pará sabe que é muito melhor usar vasos gigantes e plantar árvores de verdade, com raízes pequenas, como as bouganvilleas, por exemplo, que florescem o ano inteiro e têm cores lindas. É preciso por a mão na consciência e repensar o modelo de cidade que queremos e precisamos. Cientificamente, está comprovado que árvores são vitais para garantir um meio ambiente equilibrado. E as de ferro em nada vão contribuir para o bem-estar das pessoas e o equilíbrio climático, são fruto de conceitos de sustentabilidade totalmente equivocados e que não levam em conta a realidade local.

Melhor seguir o exemplo de Paris, onde a arborização e a pedonalização são tratadas como imperativo e a municipalidade sabe que a cidade tem que estar preparada para enfrentar as alterações climáticas, com cenários extremos que podem atingir temperaturas de até 50ºC. Paris vai fechar quinhentas ruas ao trânsito e acabar com dez mil lugares de estacionamento, que se juntarão a outras trezentas ruas onde o trânsito já é proibido. Está criando “praças oásis” em cada um dos seus vinte arrondissements (distritos administrativos), proporcionando mais espaços verdes onde árvores oferecem abrigo do sol e ajudam a resfriar a temperatura, calçadas com canteiros arborizados que também ajudam na absorção de águas pluviais – a exemplo dos jardins de chuva. Todos, obviamente, naturais. O rio Sena está sendo despoluído. A capital francesa tem duzentas mil árvores plantadas nas ruas, praças, cemitérios e jardins públicos, e mais trezentas mil em dois grandes parques, o Bois de Vincennes e o Bois de Boulogne. A elas se juntarão mais 179 mil arvores até 2026. A prefeitura de Paris é responsável pela manutenção desse mais de meio milhão de árvores e faz isso o ano inteiro, com agentes especializados do Departamento de Árvores e Florestas do município, que têm formação técnica de um a dois anos em silvicultura, para poder monitorar, podar galhos, identificar um tronco ou uma raiz doente, providenciar o tratamento e, se necessário, derrubar a árvore que representa risco, plantando no ato outra em seu lugar. Berlim cheira a floresta nas suas grandes avenidas. Londres tem enormes parques verdes e as cidades nórdicas chutam Belém para o canto da vergonha. Em terras brasilis, prefeitos e governadores preferem derrubar árvores e cimentar praias.

Ah! Mas as grandes cidades europeias dispõem de excelentes redes de transporte público. Pois é, pois é. Enquanto isso, o BRT metropolitano, que começou defasado em 2019 e causou incontáveis mortes em acidentes que poderiam ser evitados com a simples sinalização da obra, continua sem funcionar. Na zona urbana, começou em 2012…

Ainda dá tempo de o governador Helder Barbalho intervir e evitar esse desastre que será de âmbito planetário na COP.

Foto: Leonardo Macêdo/Seop

Franssinete Florenzano
Jornalista e advogada, membro da Academia Paraense de Jornalismo, da Academia Paraense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Pará, da Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo e do Instituto Histórico e Geográfico do Tapajós, editora geral do portal Uruá-Tapera e consultora da Alepa. Filiada ao Sinjor Pará, à Fenaj e à Fij.

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