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O uso de expressões capacitistas, frequentemente presentes no vocabulário cotidiano, reforça preconceitos e marginaliza as pessoas com deficiência (PcDs). Termos que parecem inofensivos, como “não temos braços para realizar este trabalho” ou “que mancada!”, podem esconder um preconceito estrutural que corrobora a percepção de que as PcDs seriam “inferiores”. Essas expressões ajudam a perpetuar estigmas sobre as deficiências e dificultam o processo de inclusão.

De acordo com o Defensor Público André Naves, especialista em Direitos Humanos e Inclusão, a linguagem capacitista “demonstra nossa visão distorcida do indivíduo com deficiência”. Ele alerta que essas expressões, quando usadas de forma corriqueira, alimentam a exclusão e os estereótipos, como quando se afirma que alguém “não tem cara de autista” ou se refere a uma pessoa com deficiência como “coitado”. Para Naves, tais expressões reforçam a ideia de que o corpo da pessoa com deficiência é menos capaz ou não digno de igual tratamento.

O capacitismo surge da ideia errada de que corpos que não seguem o padrão socialmente aceito são inferiores, incapazes ou problemáticos. Essa visão leva a associações pejorativas e excludentes. Expressões como “retardado” exemplificam a naturalização desse preconceito, que afeta diretamente a vida das pessoas com deficiência ao rotulá-las de acordo com estigmas negativos.

A luta contra o capacitismo tem ganhado destaque nas discussões sobre inclusão. Em 2023, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania e o Ministério da Saúde, lançou a cartilha “Combata o Capacitismo”, que orienta a população a substituir expressões capacitistas por termos mais inclusivos. Essa cartilha faz parte de um movimento maior de conscientização sobre como o uso da linguagem pode ser um poderoso instrumento de exclusão ou inclusão.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 24% da população brasileira possui algum tipo de deficiência, o que salienta a urgência de debates sobre inclusão. O defensor André Naves lembra que é fundamental abordar o capacitismo com a mesma seriedade com que se enfrenta outras formas de preconceito, como o racismo, a homofobia e o etarismo. “A cada dia, assistimos a manifestações importantes contra o racismo e a homofobia, mas também precisamos de uma maior mobilização pela inclusão das pessoas com deficiência”, afirma Naves. A inclusão deve acontecer em todos os ambientes — escolas, locais de trabalho, espaços públicos e no convívio social. Uma das formas mais acessíveis e eficientes de iniciar essa mudança é por meio da adaptação da linguagem.

Substituir expressões capacitistas por termos neutros e inclusivos é uma prática simples, mas poderosa. Em vez de dizer “não temos braços para realizar este trabalho”, por exemplo, uma alternativa seria “não temos pessoal suficiente”. No lugar de “deu uma de João sem braço”, pode-se usar “se fez de desentendido” ou “fugiu da responsabilidade”. Essas pequenas mudanças ajudam a desassociar características negativas das pessoas com deficiência, promovendo mais respeito e empatia. A adaptação da linguagem, entretanto, é apenas o primeiro passo para uma sociedade mais inclusiva. “Devemos lembrar que o corpo humano se adapta a diferentes situações, e que nossas diferenças devem ser respeitadas sem que isso se torne uma base para discriminação ou exclusão”, afirma Naves.

Gabriella Florenzano
Cantora, cineasta, comunicóloga, doutoranda em ciência e tecnologia das artes, professora, atleta amadora – não necessariamente nesta mesma ordem. Viaja pelo mundo e na maionese.

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