O padre José Antonio, pároco da Catedral de Soure (Paróquia Menino Deus), deu seu testemunho sobre Dom José Azcona muito emocionado, e foi aplaudido de modo vibrante pelos fiéis que lotavam a cerimônia das exéquias do bispo emérito do Marajó (PA).
“Meus irmãos, preparei aqui uma mensagem em nome dos padres, mas por enquanto vou falar aqui em meu próprio nome, pelos anos que convivi. E dizer a todos que não esqueçam que tudo que Dom José fazia, ele fazia em nome do Senhor, in Nomine Domini. Não fazia desde fora, mas de dentro. Um coração que amava os pobres, que amava a vida. O mundo hoje conhece Dom José como o defensor dos pobres, como aquele que não se acovardou diante das injustiças, das opressões. Está certo. Mas o mundo precisa conhecer e não omitir. Repito, Dom José não fazia desde fora, desde a realidade humana ou racional. Ele fazia desde Cristo, desde a cruz do Senhor. Para que não esqueçamos que ele era o homem que lutava, sim, pelo direito e pela justiça, mas toda a sua força, toda a sua sabedoria, todo o amor pelos pequenos partia desde Cristo, pobre, puro e santo. Que isso fique registrado, que não apenas guardemos na memória e demos continuidade ao legado de nosso amado bispo Dom José como defensor dos pobres mas também guardemos no coração e nos comprometamos com o legado que vem desde a sua vida espiritual. Ele era um homem de Deus. Se não o fosse, ele teria se acovardado, como muitos se acovardam diante das injustiças, porque não agem desde Cristo, agem desde a ideologia, agem desde seus interesses, portanto, com tendências. Quando se age desde Cristo, não se está de um lado nem de outro, se está do lado de todos.
Gostaria de falar de três pontos de Dom José.
O Dom José pregador. Eu vou aqui empregar uma dose de riso, porque senão a gente acaba se emocionando. Bom, é sabido de todos que a homilia de Dom José não durava menos que 40, 50 minutos. Eu fui vigário geral e coordenador de pastoral por muitos anos, então os padres, os leigos, quando a gente ia participar de uma celebração de Dom José, me diziam: “_ Padre Antonio, fale para Dom José falar menos. Aí eu dizia: Dom José está nesse ritmo de homilia de 40, 50 minutos, há mais de trinta anos. Não vai ser agora que ele vai recuar. Não vai ser agora que ele vai diminuir. Falem vocês. Uma outra vez, alguém teve a ousadia de dizer a ele: “_Dom José, olha, me desculpe, mas eu assisto à missa pela manhã, e aí eu trabalho. E a sua homilia está demorando muito”. Ele respondeu: _“Tem outra missa à noite, participe dela”.
Dom José era um homem de oratória, um homem de cultura, um homem de conhecimento. Dom José rezava muito, e não menos estudava também. Então, era difícil acompanhar seu raciocínio, o seu repertório. Mas era um homem que baseava toda a sua pregação no único Evangelho que Jesus tinha. Isso é divinal.
O Dom José confessor. Nós tínhamos um mutirão de confissão na Semana Santa, Crismas e Primeiras Comunhões. E aí ele vinha de viagem pelo Marajó, e nós queríamos que ele descansasse, mas não. Então dizíamos; “_Dom José, não se preocupe, porque a gente dividirá e tudo bem. Mas enquanto eu confessava vinte, Dom Azcona confessava dois. Outras vezes, estava só o Dom José aqui em outras ocasiões, porque nós tínhamos compromisso, missa para celebrar. Fazia fila na porta. Gente que ficava mais de duas horas esperando para confessar. Aí eu chegava, colocava a estola e anunciava: “Eu estou confessando também”. Mas não ia ninguém. Preferiam ficar três horas esperando, mas ir com Dom José. O motivo, não sei, a santidade do Dom José, mas também uma coisa que me chamava a atenção. Aqueles que confessavam com Dom José passavam duas horas, tinha confissão que demorava até três horas, porque realmente ali ele encontrava a forma de levar à conversão e Dom José insistia, é aqui que eu vou tocar na alma, no coração. Então essa pessoa vai levar no coração aquilo que ouviu. Aqueles confessados com Dom José sabem muito bem o que eu estou dizendo. Ele realmente ia “lá”. Ele dava umas “bofetadas” mesmo. Tinha a pessoa que reclamava. Mas depois agradecia. Porque todos os sacerdotes devem conduzir as almas à conversão, à santificação, e à salvação.
O Dom José fraterno. Era um homem fraterno, de comunhão, ele realmente sempre pensava no outro, costumava repartir. As pessoas traziam as coisas para ele, faziam questão de dizer “Isto aqui é para Dom José”. Aí vinham bolos, roscas…eu já sabia da reação do Dom José. Então eu fazia a questão de levar. “Dom José, isto aqui trouxeram para o senhor”. “Não, não. Para nós”. Eu gostava muito quando ele ia nessas viagens, lá para o Rio e São Paulo… As pessoas davam camisas, calças e sapatos para ele. Ele mandava experimentar e dava tudo.
Fui visitá-lo na última semana, ele estava muito esperto e falei: “Teve uma pessoa que entregou lá um vinho para o senhor, e olha esse vinho aqui já, desde maio… Ele disse: “_Beba tudo, beba tudo.” Enfim, muitas histórias, né? Eu acredito que foram quase vinte anos ali, lado a lado com o Dom José, porque minha única paróquia agora é Soure, também no seminário Dom José era uma presença direta. Então, eu realmente tenho muita coisa a falar de Dom José, eu fui feliz. Às vezes, é difícil morar com o bispo. Mas eu viveria por cem anos ao lado do Dom José. Porque ele era pai, irmão, amigo. Partilhava a vida de uma maneira muito fraterna. Quero particularmente expressar meu agradecimento pelo tempo em que convivi com ele. Eu tenho certeza de que não vou esquecê-lo. Eu não vou esquecer.
Mas agora eu vou ler a mensagem dos padres diocesanos, na maioria ordenados por Dom Azcona. O pobre Cristo foi fiel em sua vocação de presbítero e exemplar pastor do seu povo nesta Igreja do Marajó e no mundo. Por isso, damos graças a Deus por sua vida ofertada e consumida em favor do povo de Deus, sobretudo dos pobres e marginalizados, na defesa da vida e pela salvação de todos. E pedimos que sua morte seja honrada, mantendo vivas as suas palavras e o seu testemunho. Enquanto durou a sua vida, sua voz proclamou a verdade do Evangelho e a pureza da fé. Que sua voz continue a ecoar no coração e na vida de todos nós.
Dom José vive! Dom José vive! Dom José vive!”
Todos os presentes fizeram coro com o padre José Antonio, de pé, e aplaudindo demoradamente.
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