Não tenho conhecimento suficiente para discutir sobre música erudita. Quando ouvi Emerson, Lake & Palmer tocar “Quadros de uma Exposição”, de Mussorgsky, procurei a versão erudita. Gosto de Tchaikovsky, Mozart e principalmente do “Célebre Adágio” de Albinoni, perdido, encontrado por Giazotto, que ouvi a primeira vez em um filme chamado “Rollerball”, bem ruim. A protofonia de “O Guarany” é emocionante. Mas qual a razão para Belém ter tanto amor e carinho pelo compositor e regente de Campinas, Carlos Gomes? Até hoje, nome do Instituto, que já foi Conservatório, onde foi o primeiro dirigente, apesar de por poucos dias, antes de seu falecimento, é admirado por todos. Penso até que acham ser paraense. O maestro Jonas Arraes, estudioso, lança em livro ricamente editado pela Editora Dalcídio Jurandir, da IOEPA, sua tese, “Tão longe e tão distante”, sobre as vindas e a morte do campineiro em Belém, no final do século 19. No início deixa claro que todas as peripécias vividas pelo compositor em nossa cidade não chegam a ser mencionadas com destaque nos trabalhos publicados fora de nossa região ou na Europa. Mas a verdade é que nos apaixonamos por Carlos Gomes. Não sei a razão. Suas obras nem são tão famosas, fora “O Guarany”. No Brasil é bem festejado por quem conhece, mas não temos em nossa cidade um culto ao erudito que sustente sua fama. Não entendo. Mas lendo o livro de Jonas, importantíssimo, cheio de informações, fotos, desenhos, somos tomados por uma riqueza cultural que naqueles anos firmaram-se em uma cidade que recebia companhias operísticas, teatrais, que chegavam aqui de navio e ficavam por meses, apresentando-se no recém construído Teatro da Paz. Associações locais bancavam ou distribuíam os ingressos. Gomes veio a primeira vez uns dois anos após a abertura do TP, sendo recebido como um ídolo. Prometeu voltar, o que aconteceu dois anos depois, junto a cantores italianos. Alguns se firmaram na cidade, até hoje com seus sobrenomes conhecidos. Houve também problemas de saúde com febre amarela que fulminou alguns, o que causou brutal prejuízo ao maestro. Então passamos a viver a Belle Epoque, a borracha fazia bamburrar os barões locais, paraenses ganhavam bolsas de estudo na Itália e as lojas vendiam pianos a rodo. Henrique Gurjão, compositor local, ficou muito amigo. Acho que deveria ser tão conhecido quanto Gomes, mas suas obras andaram perdidas, até que Jonas encontrou trechos de sua ópera “Idália”. CG regeu algumas vezes suas obras no Teatro da Paz, sendo sempre muito aplaudido. Quando chegava, de navio, outra embarcação ia até o meio da baía de onde o trazia, com autoridades, banda de música, desfile em carro aberto, enfim. Antes do TP, havia a Casa da Ópera, ocupando aquele espaço largo entre o Museu do Estado e o MABE. Havia o Teatro Providência, do outro lado da Praça das Mercês. Jonas ainda menciona uns quatro teatros menores em volta do TP, inclusive um que apresentava atores japoneses. Lauro Sodré e Antonio Lemos, ainda não inimigos mortais, bancaram a última vida de CG a Belém, criando o Conservatório e dando-lhe a direção. Mas o grande compositor já estava gravemente doente e morreu em uma casa na esquina da Quintino com a Tiradentes, infelizmente derrubada, como tudo de histórico em nossa cidade. É tudo sobre Carlos Gomes, mas há uma profusão de acontecimentos, fatos, nomes de pessoas, maneira de saber como Belém era naquele período, inclusive mencionando a grande reforma em 1904 feita por Augusto Montenegro, que deixou o TP com as formas de agora. Para ler com cuidado, degustando tudo, porque a linguagem não é acadêmica e bem fácil de entender e gostar.
Tão Longe e Tão Distante – Jonas Arraes – Editora Dalcídio Jurandir.
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