Finalmente estou de volta. Inicio essa crônica assim, porque ela simboliza muitos retornos pessoais e internos. E por marcar algo especial, o tema também foi de difícil escolha, embora não tenha sido uma decisão aleatória, afinal, se o momento é de retorno e recomeços, por que não falar de um grande retorno que é de um governo democrático? Entretanto, não vou discorrer hoje sobre os absurdos cometidos por terroristas golpistas, também não falarei do Lula e da esperança nessa nova gestão, com nomes tão preciosos em cargos importantes. Como de costume, vou falar de algo que também é político, recorrente, e pouco abordado fora de espaços e reflexões feministas: a violência simbólica contra as mulheres em espaços de poder político, mais especialmente, os ataques a figura de Janja, que acredito ser de conhecimento geral, afinal é a esposa do atual presidente (e que maravilha poder dizer isso!).
O primeiro ataque que acompanhei dizia respeito a sua postura alegre e de como ela deveria se portar em cima de um trio elétrico, no dia do resultado da última eleição. O segundo, publicado em jornal aqui de Belém, apontava Janja como conflituosa, gerando mal-estar ao organizar a posse de Lula, por ser “centralizadora” e, deixando no ar, como era “agressiva”. Fiquei me perguntando se existiria uma matéria similar abordando essas críticas a um homem. Janja, que também é socióloga e defensora de direitos humanos, traz uma imagem de mulher potente e não à toa, e como sempre, tem sido vigiada em relação a sua postura, roupa, sexualidade, quando não, desvalorizada e questionada acerca de sua capacidade intelectual, ocultando sua competência profissional, e reduzindo a “esposa do Lula”.
Se passou a ser difundido midiática e declaradamente, a partir do governo Temer, que “primeira dama” (nome já complicado, né, gente?) precisava ser bela, recatada e do lar. Janja vem na contramão quanto a elementos que se fundam na passividade feminina. Ora, ela pula, se diverte, se posiciona, tem condições para tomar decisões e adota postura firme no que se compromete a fazer. E isso, ainda nos tempos atuais é assunto de capa de revista ou matéria de jornal, passando a mensagem subliminar (embora nada sutil) de que Janja é problemática, difícil; que o presidente está “dando” muito poder a ela; e quanto pode o manipular – reiterando mito da mulher ardilosa, do homem influenciado por estar apaixonado, porque não conseguem ver uma relação de respeito, simétrica e de valorização e reconhecimento de capacidades – e do incomodo e resistência em ver mulher em lugar de destaque e decisões.
Vi outra matéria que chegou a mim por mulheres defensoras da Janja, escrita por outra mulher, que falava quanto existiam mulheres invejosas, rivalizantes e que Janja representava o que a sociedade reprime. Pois bem, meu incômodo está justamente no retorno em individualizar o processo, culpabilizando mulheres, sem tensionar a estrutura patriarcal. Em outras palavras, tornando da esfera privada e individual algo do público, do coletivo, de construção socio-histórica. Por isso, proponho questionamentos, ao invés de cairmos na retórica das “mal amadas”: por que mulheres se incomodam com a liberdade sexual? Por que homens não aceitam mulheres firmes e assertivas na gestão? Por que insistem falar de roupa, vigiar a forma de gesticular e se mexer de uma mulher? Por que esses assuntos são manchete de revista? Por que insistem em fomentar rivalidade feminina? Por que tratam Janja como problema? Por fim, só quero reiterar como foi linda a posse de Lula, tão bem pensada, organizada, sensível e precisa, inclusive nos mínimos detalhes, como o de não soltar fogos por conta de animais. Gente, o que parece besteira, mas não é, só poderia ser pensado por uma mulher atuante e que se importa com o entorno, inclusive que reconhece os animais no mesmo grau de importância que pessoas, sendo tudo parte da natureza e do meio ambiente. É sobre isso, gente. Sobre política e mulheres, política para mulheres, mulheres em espaço de poder. Esse governo vem propondo mudar estruturas, a imagem e tratamento às mulheres, e uma delas é: vamos ressignificar a tal “primeira dama”, que ironicamente me lembra sobre colonização dos corpos femininos, assunto pra outra crônica. Bem-vinda, socióloga Janja. Desejo animação para essa jornada.
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