Publicado em: 18 de março de 2025
No último dia 13 de março, aconteceu um episódio de extrema violência política de gênero que deveria indignar a população de todo o Brasil. Durante a cerimônia de entrega da Medalha do Mérito Comercial do Amazonas 2025, o senador Plínio Valério (PSDB-AM) proferiu uma fala de teor extremamente violento e misógino contra a ministra do Meio Ambiente e Mudanças do Clima, Marina Silva.
“Imagina o que é tolerar a Marina (Silva) por 6 horas e 10 minutos sem enforcá-la.”
A declaração, feita em tom de deboche, aconteceu enquanto o senador relembrava a participação da ministra na CPI das ONGs, realizada em novembro de 2023.
O discurso de Plínio Valério ultrapassa os limites da crítica política e configura violência de gênero, utilizando uma imagem de agressão física contra uma mulher para reforçar sua discordância com a ministra. A fala se torna ainda mais grave por ter sido feita em um evento público, diante de autoridades e representantes do setor comercial. Para agravar ainda mais, Plínio prosseguiu: “A minha mulher que está ali, a Ana, mandava mensagem o tempo todo, né, me instigando, jogando gasolina e no final ela me disse: ‘Se você tivesse 10% da paciência que teve com a Marina, a gente nunca brigava’. Porque foi tudo o que ela quis, provocou, provocou, provocou e provocou o tempo inteiro.”
O tom jocoso da declaração escancara um problema estrutural muito profundo: a forma como mulheres que ocupam cargos de poder são frequentemente reduzidas a figuras irritantes ou provocadoras, como se a simples presença delas fosse um incômodo. O ataque verbal de Plínio reforça a cultura de que mulheres na política devem ser “toleradas”, não respeitadas, e que a resposta aceitável para sua atuação seria a violência.
A ministra Marina Silva, reconhecida internacionalmente por sua atuação na defesa do meio ambiente, já enfrentou diversos ataques de cunho machista e racista ao longo de sua trajetória política. Suas posições, principalmente relacionadas à proteção da Amazônia e à BR-319, frequentemente são tratadas com desdém e agressividade, algo que dificilmente ocorre com ministros homens que defendem pautas igualmente polêmicas.
A fala do senador não pode ser considerada, em hipótese alguma, um deslize isolado. É um reflexo da violência política de gênero no Brasil. Mulheres que ocupam cargos públicos enfrentam constantemente ataques pessoais, ameaças e discursos desqualificantes, como é o caso de tantas outras, como Marielle Franco, vereadora assassinada em 2018, da ex-presidente Dilma Rousseff, que sofreu uma campanha sistemática de desmoralização baseada no machismo, e para citar um exemplo no Pará, a prefeita de Abaetetuba, Francineti Carvalho, que já sofreu inúmeros ataques verbais e ameaças de agressão e de morte – e sempre corajosamente denunciou toda a violência de gênero e política que sofreu e sofre.
Seria impossível, citar aqui, todas as mulheres que ocupam cargos políticos que já foram violentadas. Provavelmente são todas.
O que Plínio Valério verbalizou, em um espaço oficial, é o que muitas mulheres na política enfrentam diariamente nas redes sociais e nos bastidores do poder. A violência verbal e simbólica serve para desestimular a participação feminina na política, criando um ambiente hostil que afasta mulheres de disputas eleitorais e de cargos estratégicos.
A violência contra Marina Silva não se limitou ao comentário sobre “enforcá-la”. Durante o evento, o senador voltou a atacá-la ao falar sobre a BR-319, rodovia que liga o Amazonas a Rondônia e que é alvo de embates entre setores econômicos e ambientalistas: “essa questão da BR-319 vai sair nem que seja na porrada.”
A escolha das palavras é simbólica: a imposição da força sobre o diálogo, o desrespeito às instituições e a lógica de que, se necessário, o violento prevalecerá sobre o negociador. A postura de Plínio Valério reforça um modelo antidemocrático de política, onde o embate físico e a ameaça substituem o debate democrático.
Além dos ataques à ministra Marina Silva, o senador também revelou sua falta de compromisso com questões estratégicas para o Amazonas. Ao comentar sobre a Zona Franca de Manaus, ele admitiu abertamente não compreender os tributos que regem o polo industrial: “Eu não entendo p**** nenhuma de Zona Franca, de tributo. Mas, eu não preciso estar. A minha assessoria está lá para isso.”
A declaração é uma prova de descaso com a principal matriz econômica da região, um desrespeito aos eleitores que confiaram a ele o papel de representá-los no Senado.
Se, por um lado, Plínio exibe total ignorância sobre a Zona Franca, por outro, ele semostra extremamente empenhado em atacar uma ministra que defende uma agenda ambiental respaldada por pesquisas e organismos internacionais. O episódio evidencia a priorização de ataques pessoais em detrimento da discussão de políticas públicas de real impacto para o estado.
O ataque de Plínio à Ministra Marina Silva não pode ser tratado como uma simples piada ou comentário infeliz. O Brasil tem um histórico preocupante de violência política de gênero, e permitir que falas como essa sejam normalizadas fortalece um ambiente de impunidade e hostilidade contra mulheres na política.
O Senado, o Governo Federal e demais instituições devem se posicionar diante desse episódio e adotar medidas para responsabilizar discursos que incitam violência. A impunidade de declarações como essa abre espaço para novos ataques, cada vez mais graves.
A fala do senador foi um ataque ao direito das mulheres de participarem do debate político sem sofrerem ameaças e intimidações. O silêncio diante desse episódio significará cumplicidade com a misoginia e a normalização da violência de gênero no Brasil.
Assista:
Foto: Fecomércio AM
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