Publicado em: 21 de dezembro de 2025
No dia 15 de dezembro de 2025, um nativo marajoara, Fernandez Rodrigues Pessoa, receberia seu primeiro título em vida: Honra ao Mérito, outorgado pela Câmara Municipal de Ponta de Pedras, proposto pela vereadora Mirna Zarpellon, reconhecendo relevantes serviços prestados ao município.
Um infarto fulminante na porta do Legislativo Municipal tirou-lhe a vida, deixando todos consternados, a Prefeita Municipal, Consuelo Castro, os vereadores, e o povo pontapedrense que admirava os predicados do homenageado.
Também fui destacado pela mesma vereadora que percebeu a grandeza de Fernandez para receber idêntica comenda, me fazendo presente com a intensão de revelar um segredo envolvendo o homenageado: um livro que escrevi sobre sua sabedoria, a partir das entrevistas que me concedeu na ilha do Marajó.
Essa obra dirá aos leitores da sapiência do povo marajoara por suas vivências dentro do grandioso habitat marajoara, espelhadas nas narrativas pessoais de Fernandez Pessoa.
Conheci o homenageado reivindicando escolas para a Flor da Síria, região da grande várzea marajoara, junto à Prefeitura Municipal de Ponta de Pedras, gestão do Prefeito Milton Malato. Pedidos cuidadosamente elaborados como planos administrativos contendo valores, ações, materiais, períodos, aconselhamentos e prestações de contas que o alcaide aprovava.
Fernandez foi um líder comunitário de sua longínqua região, dedicado ao bem estar social do povo, reivindicando melhorias sociais como educação, transportes, saneamentos e saúde para a população da Flor da Síria.
Transportava, incansavelmente, idosos às cidades grandes buscando aposentações e tratamentos médicos específicos, enfrentando inúmeras dificuldades sem desistir. Nada cobrava para si e ainda fortalecia, indiretamente, candidaturas políticas que se valiam dos votos dos atendidos.
Autodidata, sem estudos formais ou diplomas, seu conhecimento empírico sobre a amazônica ilha do Marajó firmou-lhe sabedoria inigualável sobre ecossistemas, geografias, costumes e histórias de civilizações que habitaram a região.
O livro a ser lançado envolve os relatos de um habitante da maior ilha fluviomarinha do mundo pertencente ao Estado do Pará, a ilha do Marajó, situada entre fenômenos grandiosos da natureza, o Rio Amazonas, o Oceano Atlântico, as chuvas, os campos e as florestas, fortemente presentes na vida do habitante nativo.
Marcada pelos ciclos periódicos das águas que controlam a vida social entre o rigor do verão e a fartura do inverno, a região marajoara, com mais de 40 mil quilômetros quadrados de área, ainda oferece grandes desafios no plano político, econômico e social, exigindo responsabilidade por parte dos governantes em razão da pobreza que ainda predomina.
Como em várias cidades da região, Flor da Síria nasceu sem aprendizados institucionais, escolas capacitadas, livros e recursos educacionais em favor dos estudantes. Apesar disso, Fernandez conseguiu aprender a ler e a escrever utilizando folhas de bananeiras, sob orientação de sua única professora: sua avó Cecília, e a lutar por escolas em sua região.
Suas histórias estão contadas nesse livro, revelando um grandioso aprendizado, capaz de orientar qualquer pesquisador técnico científico de universidades deste mundo. Colhi informações desse mestre para a obra que será lançada: “Flor da Síria, Marajó Jardim”, como fonte de informação cultural elaborada pela inteligência cintilante desse grande professor.
Nossas entrevistas eram mensais, eu indo de Belém e ele da Flor da Síria, para em Ponta de Pedras, na praça, no trapiche, na igreja, na Mangabeira, conversar e anotar, até fecharmos o livro em Belém do Pará.
Fernandez é um desafio da própria vida estabelecida entre antagonismos, como riqueza e pobreza, possibilidade e dificuldade, tristeza e alegria, pares de opostos que os pré-socráticos tanto se referiam abrindo caminho para a razão. Fernandez Pessoa é mais um entre milhares de marajoaras pobres, errante dos vastos campos que enfrentam as agruras do tempo e as negativas do sistema.
Ele confirma as bases da estrutura política do Estado: dignidade e solidariedade, que nem todos os investidos no poder conseguem aplicar. Tornou-se uma liderança em sua comunidade, o que lhe poderia proporcionar cargos eletivos, mas optou por requerer ações beneficiárias administrativas em favor do sofrido povo marajoara.
Somente um ato de amor e sensibilidade da vereadora Mirna Zarpellon, haveria de reconhecer a grandeza das pessoas que apresentam em seus corações capacidade para amar ao próximo como outro grande Mestre sem diplomas ensinou.




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