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Certo dia, um paroquiano esteve com ele e pediu conselhos para um problema pessoal. Claudio devolveu: você quer o conselho do padre ou do homem? Ainda muito criança, lembro de ouvir Cláudio Barradas em rádio novelas pela Radio Clube, em vários personagens. Adiante, passei a saber de seu trabalho na Tv Marajoara, no cinema de Líbero Luxardo e nos palcos, seja interpretando, seja dirigindo. Barradas é o mentor de toda uma geração de atores e diretores nesta cidade. Foi seminarista na adolescência, esteve na fundação da Escola de Teatro da Ufpa e em várias ações cênicas, marcando sua presença pelo talento, exigência e compromisso. Há várias lendas a seu respeito. Então ele dirigiu por vários anos a área teatral do Sesi, formando mais atores e diretores. De repente, veio o chamado e ele foi ser padre. Esteve nos interiores e voltou para as cercanias, como pároco na Marambaia. Uma noite, após um espetáculo no Teatro Waldemar Henrique, o encontrei na platéia. E aí, quando volta aos palcos? Estou disponível. Tens algum texto para mim? Tenho. A peça “Abraço” é a minha favorita e estava aguardando por ele. Houve problemas em conseguir um diretor e enfim, resolvi dirigir. Nunca tinha feito isso. Dois personagens, Cláudio e Zê Charone. Para mim, ao mesmo tempo a felicidade e a preocupação em dirigir um monstro como ele. Ambos atores experientes, exemplares em dedicação, oferecimento de idéias, disciplina e amor pela profissão. Não houve dificuldades. Houve a graça de ter este homem, cavalheiro, inteligente, amoroso à disposição para longas conversas onde muito foi ensinado. Gostamos tanto que resolvemos repetir a dose, Cláudio Barradas e Zê Charone em “Sem dizer adeus”, a partir de “Eu e a últimas 48 horas de Magalhães Barata”, escrito por Dalila Ohana. Foi muito bom. Era impressionante aquele senhor, ainda um padre, chegar com seu texto pronto, sugestões e a compreensão exata de todo o ato a seguir. Estive algumas vezes em sua paróquia e percebi claramente o amor dos paroquianos por ele, que assim como fez em outras paróquias em que passou, reunia os jovens e montava peças de teatro. Foi um homem doce, amoroso, talentoso, inteligente e como padre, aplicou à religião toda sua sabedoria. A última vez em que pisou em um palco foi em 2020, durante a pandemia, fazendo parte da Mostra Nilza Maria, no Teatro da Paz, com “Abraço”, com Zê Charone. Já tinha problemas de locomoção e encenou usando um “andador”. Há uma cena em que os dois personagens dançam. No frisson do momento, Cláudio levantou e dançou, como se tivesse 17 anos! Ainda fomos chamados mais uma vez, mas quando fui visita-lo em um hospital, texto em suas mãos, ainda tinha a esperança de voltar, o que não foi possível.

Ficaremos se ele. Seguiremos sem ele. Há toda uma geração se despedindo. Precisamos festeja-la. Sem essas pessoas, o que seria de nós? Precisamos gritar para os que ainda não sabem, da importância de Cláudio Barradas para o Pará. Ainda lembro dele, chegando, um domingo, no teatro, cansado de um dia inteiro rezando missas, em seu palco religioso, entrar na outra casa, abrir um sorriso, fazer brincadeiras sacanas com todos, vestir o personagem e terceira campa! Merda, Cláudio Barradas!

Edyr Augusto Proença
Paraense, escritor, começou a escrever aos 16 anos. Escreveu livros de poesia, teatro, crônicas, contos e romances, estes últimos, lançados nacionalmente pela Editora Boitempo e na França, pela Editions Asphalte. Foto: Ronaldo Rosa

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