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Desde sua origem, Marabá (PA) sofre anualmente enchentes dos rios Tocantins e Itacaiúnas e a população que reside em áreas de risco fica em situação de vulnerabilidade. Todos os anos a defesa civil estadual e municipal planeja, monitora e prepara equipes para ações. Mas tudo continua igual. Este ano já são mais de duas mil famílias que perderam todos os pertences e estão em precários abrigos provisórios. E ainda é só o começo do “inverno” amazônico, que se traduz pela intensidade de chuvas e transbordamento dos cursos d’água.

Os registros das primeiras enchentes remontam a 1906, quando os habitantes de Marabá procuraram abrigo nas canoas e nas partes mais elevadas. Terminada a cheia, retornaram e edificaram novas casas de pau-a-pique, cobertas em geral com palha, um pouco acima do local original, próximo ao centro da atual Marabá Velha. Em 1910, outra enchente expulsou novamente os moradores para as terras altas do pontal. A memória local e as fontes documentais apontam a enchente de 1926 como uma das piores, além das de 1935, 1947, 1957, 1974, uma sequência de três anos entre 1977 e 1979 e a pior de todas, a de 1980, já na fase da implantação da Nova Marabá. As enchentes de 1990 e 1997 afetaram praticamente toda Marabá Velha. Parece não restar dúvidas de que as duas maiores enchentes que atingiram a cidade foram as de 1926 e 1980.

A tecnologia existente é perfeitamente capaz de previsões do nível dos rios Tocantins e Itacaiúnas. Há estações hidrológicas em Marabá e Conceição do Araguaia, da Agência Nacional de Águas (ANA). A análise quantitativa dos impactos fluviométricos nas enchentes de 2009 e 2011 revelou que, em média, mais de 4 mil famílias sofrem com estes eventos, implicado em gastos financeiros elevados. Mas essas importantes ferramentas não são utilizadas no planejamento e preparo de ações preventivas.

Os moradores dos bairros mais antigos, Cabelo Seco e Santa Rosa, mantêm a rotina vinculada aos rios e à floresta. Tradicionalmente a população era formadas por seringueiros, castanheiros, garimpeiros e as antigas oligarquias vinculadas ao extrativismo e ao comércio fluvial, e ninguém aceitou a mudança proposta há décadas pelo governo federal para novo centro urbano. Ademais, o plano previa acomodar as famílias em blocos residenciais de até três pavimentos, eliminando os quintais, que de acordo com o Plano de Desenvolvimento Urbano eram sujos e armazenavam lixo, mas que para o povo eram espaços onde desenvolviam outras atividades, como lavar ou secar roupas, o contato entre os vizinhos, manutenção de pequenas hortas e a criação de animais e aves.

Em sua origem, Marabá era produtora de borracha. Depois, entre as décadas de 1920 e 1980, grande centro produtor de castanha-do-pará, tendo o garimpo de diamantes como atividade complementar. Em 1967 foram descobertas as jazidas de minério de ferro na Serra dos Carajás, área que na época pertencia ao município de Marabá. Mais tarde se tornou um eixo rodo-ferroviário, com a rodovia Transamazônica e a estrada de ferro da Vale.

Situada em local francamente desfavorável ao estabelecimento de um núcleo urbano, na confluência dos rios Itacaiúnas e Tocantins, com transbordamento anual, Marabá foi se mantendo. As enchentes são comum às cidades ribeirinhas da Amazônia, mas o caso de Marabá é emblemático e singular em função da frequência, de afetar vários segmentos sociais e de os marabaenses terem tido oportunidades para a mudança da cidade para locais mais seguros em relação aos rios.

Em fotos publicadas no portal da própria Prefeitura de Marabá nesta segunda-feira, 17, pessoas sofridas, humildes, necessitadas, são expostas publicamente em filas humilhantes para receber uma cesta básica comprada com dinheiro de impostos. As imagens chocantes de famílias inteiras com crianças, grávidas e idosos amontoados em tendas, em praças e terrenos baldios, sem água nem energia elétrica e péssimas condições de higiene, em meio a uma pandemia, em nada diferem dos refugiados famintos e doentes que fogem do Haiti, da Venezuela, da Síria e outros países em guerra.

O deputado estadual Delegado Toni Cunha, presidente da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa, oficiou ao Governo do Pará pedindo que ofereça o Centro de Convenções de Marabá à prefeitura da cidade para abrigar as centenas de famílias. Considera este o único ambiente que pode receber as pessoas com o mínimo de dignidade, já que dispõe de gigantesco espaço, com banheiros e cozinha industrial: “Já é uma vergonha que não exista uma estrutura específica para receber as pessoas, haja vista que sempre teremos cheias. Inaceitável que não usem os melhores espaços públicos para receber as famílias. Pedi providências à Comissão de Direitos Humanos da Alepa. Representei, também, aos Ministérios Públicos Federal e Estadual, pedindo que interfiram para que providenciem tratamento digno, com humanidade, para os cidadãos desabrigados em Marabá”.

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