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Fada é uma égua que sofria maus-tratos de seu antigo dono e, por isso, foi levada para o Centro de Controle de Zoonoses e Vigilância Ambiental de Campos de Goytacazes, município do Rio de Janeiro. Em seguida, um santuário para animais de grande porte em que os bichos vivem em liberdade e uma clínica de equoterapia pediram para ficar com ela.

O advogado animalista e professor Francisco Garcia, que leciona Direito Animal na Universidade Federal da Paraíba, onde coordena o Núcleo de Justiça Animal, e que redigiu o Código de Direito e Bem-Estar Animal da Paraíba, entende que Fada não deve ser enviada para a clínica, porque é bem provável que lá ela será submetida a trabalho forçado. Então, ao lado de duas advogadas e Ongs de defesa dos animais, protocolou um Habeas Corpus, com pedido de liminar, para que Fada possa ser a autora da ação e vá para o santuário de animais.

Nos autos, Fada é qualificada como “brasileira, equina, sexo feminino, cor tricolor, com data de nascimento desconhecida, nascida no estado do Rio de Janeiro”.

Assistam ao vídeo postado pelo advogado franciscodireitoanimal, em seu perfil no instagram, no qual ele explica a sua tese, que está causando frisson no meio jurídico.

O então ministro do Trabalho e da Previdência Antonio Rogério Magri, nos idos de 1991, levava a sua cadela Orca no carro oficial até o veterinário, justificando que “cachorra também é ser humano”. De lá para cá muita coisa mudou. As criancinhas continuam sendo abusadas e violentadas ao pedirem comida na rua e nos rios, os adolescentes e idosos permanecem puxando carroça, mas os cavalos já têm lei impedindo que sirvam de tração. E não é a primeira vez que um animal figura em HC (remédio constitucional que tem a finalidade evitar ou fazer cessar violência ou coação à liberdade de locomoção, decorrente de ilegalidade ou abuso de poder) no judiciário brasileiro.

Acórdão expedido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu, em 17 de junho de 2020, o equivalente ao habeas corpus humano ao cavalo Franco do Pec, que assim foi libertado de um isolamento sanitário que já durava quase três anos em São João da Boa Vista, interior do estado. Tudo começou em 2017, quando o garanhão foi diagnosticado com mormo (zoonose causada por uma bactéria que pode afetar, eventualmente, outros equídeos e seres humanos) em exame de rotina para participar de uma exposição. O animal foi condenado à eutanásia por não existir na época vacina contra a doença. Mas como não tinha sintomas, o proprietário suspeitou de falso positivo e recorreu ao judiciário. Outro exame, em um laboratório na Alemanha, atestou que o animal era sadio e o TJSP acolheu o resultado. O processo ainda não foi extinto. A Fazenda contesta a decisão, porque o exame não foi realizado no Brasil. Além disso, alega que o dono poderia ter administrado medicamentos – intencionalmente ou não –, o que interferiria na resposta imunológica do animal.

Antes do cavalo Franco do Pec, chimpanzés e orangotangos figuraram em processos judiciais. A chimpanzé Suíça foi o primeiro animal reconhecido como sujeito jurídico de uma ação. Suíça e seu companheiro, Geron, passaram quatro anos no Jardim Zoológico de Salvador. Desde quando o macho morreu de câncer a macaca de 23 anos mergulhou em depressão, até ser encontrada morta em sua jaula na manhã do dia 27 de setembro de 2005. Em uma sentença que entrou para a história da Justiça brasileira, o juiz Edmundo Lúcio da Cruz, da 9ª Vara Criminal de Salvador, na Bahia, deferiu a liminar no HC ajuizado pelos promotores de justiça Heron José de Santana e Luciano Rocha Santana. A decisão foi tomada no dia 28 de setembro e publicada em Diário Oficial no Dia Mundial dos Animais, 4 de outubro, dia de São Francisco de Assis, protetor dos animais. Como a chimpanzé morreu, o habeas corpus perdeu o seu objeto, a sua razão de ser, cessando, por consequência, o interesse de agir. Ficou como precedente e marco principal do direito dos animais, como capacidade de ser parte e pleitear em juízo.

“Animal não pode integrar uma relação jurídica, na qualidade de sujeito de ação, podendo ser apenas objeto de direito, atuando como coisa ou bem”. Este ainda é o entendimento majoritário no meio jurídico, e a resposta foi dada há alguns anos por um juiz do Rio de Janeiro a um advogado que pedia a libertação de um pássaro aprisionado em gaiola.

Mas nem todo sujeito de direito é necessariamente pessoa no direito brasileiro. O sistema jurídico já protege os animais contra maus-tratos (Lei de Crimes Ambientais – 9.605/1998), contra a crueldade (Constituição Federal) e o Brasil é signatário da Declaração Universal dos Direitos dos Animais, que prevê especificamente em seu Preâmbulo: “Considerando que todo o animal possui direitos” e no artigo 4º, 1, que “Todo animal pertencente a uma espécie selvagem tem o direito de viver livre no seu próprio ambiente natural, terrestre, aéreo ou aquático e tem o direito de se reproduzir.”

O advogado paraense Albeniz Leite Neto, amigo da causa animal, vice-presidente da Comissão de Defesa dos Direitos dos Animais da OAB/PA e membro consultivo da Comissão de Proteção e Defesa Animal da OAB Federal, reconhece que a tese é uma inovação e ainda recebe muita resistência, mas acredita na existência de suficientes fundamentos jurídicos para que os animais sejam defendidos dessa forma, até mesmo considerando que o Judiciário não garante direitos apenas para os capazes. E vocês, o que acham? Comentem!

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