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O juiz titular da 72ª Zona Eleitoral, de Ananideua (PA), Adelino Arrais Gomes da Silva, em Ação de Investigação Judicial Eleitoral, declarou o deputado federal Antonio Leocádio dos Santos (MDB) inelegível por oito anos subsequentes ao pleito de 2024. O magistrado entendeu “restar caracterizada e comprovada a prática de abuso de poder político e econômico por Antônio Doido, em razão do uso sistemático, personalizado, midiático e autopromocional de recursos públicos com a finalidade e favorecimento eleitorais, com a nítida e inequívoca utilização da máquina e estrutura estatais em prol de seu projeto político, comprometendo a normalidade, legitimidade e equilíbrio do pleito, em afronta aos princípios da impessoalidade, da isonomia e da moralidade administrativa”.

O deputado arguiu litispendência entre a AIJE – proc. nº 0600518-80.2024.6.14.0072 e a Representação Especial por Conduta Vedada – proc. nº 0600515-28.2024.6.14.0072, requerendo a suspensão ou extinção parcial do feito. Mas o juiz rejeitou a preliminar suscitada, lecionando que o instituto da litispendência exige a concomitância da chamada tríplice identidade: mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido. Contudo, na AIJE figuram no polo ativo a Coligação “Ananindeua do Povo, Pra Mudança Continuar” e Daniel Barbosa Santos, tendo como investigados Antônio Doido e Maria Eunice Carvalho de Moraes, enquanto a Representação é proposta exclusivamente pelo Ministério Público Eleitoral contra Antonio Doido. Ademais, a AIJE apura abuso de poder político e econômico, em contexto de shows, sorteio de prêmios, obras de pavimentação asfáltica e ações sociais com distribuição de brindes, cestas e disponibilização de serviços públicos, visando a inelegibilidade. Já a Representação fundamenta-se estritamente na prática de conduta vedada, tratando da distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social, sem sanção de inelegibilidade.

Antonio Doido também arguiu decadência do direito de ação por ausência do Estado do Pará no polo passivo (litisconsórcio necessário), por envolver ações sociais executadas por órgãos estaduais (Fundação ParaPaz). O juiz fulminou a pretensão ensinando que a tese é própria das representações por condutas vedadas e não de AIJE.

Da mesma forma foram rejeitadas, ainda, a preliminar de inépcia da inicial, e a alegação de cerceamento de defesa e violação aos princípios do contraditório. O magistrado frisou que vídeos e publicações de autoria de Antonio Doido confirmam a utilização de suas emendas parlamentares para o custeio e realização do show do “Dia do Trabalhador”, sorteio de prêmios, distribuição de brindes e cestas básicas, ações sociais e pavimentação asfáltica, fato incontroverso nos autos, não sendo necessário “esclarecer” o que o próprio Investigado confessa publicamente e a defesa admite processualmente.

“Determinar a produção da “prova” requerida seria uma afronta ao princípio da celeridade e economia processuais”, afirmou o juiz, que fustigou: “ademais e ainda que não se tratasse de fato incontroverso, o argumento de cerceamento de defesa falece diante da própria manifestação dos Investigados. Em suas Alegações Finais, a defesa expressamente reconhece que a prova documental requerida (comprovação das emendas) “…é de fácil acesso e de natureza pública…” Sendo, portanto, uma documentação pública e de fácil acesso, poderia a parte interessada apresentá-la a este Juízo Eleitoral, independentemente de intervenção judicial. Não pode a parte alegar nulidade por ausência de uma prova que ela mesma qualificou como acessível e que deixou de produzir por sua própria inércia. O Poder Judiciário não atua como mero auxiliar administrativo das partes para a obtenção de documentos disponíveis em portais de transparência ou junto à própria assessoria parlamentar do Investigado”.

Para o juiz Adelino Arrais, “Doido” demonstrou uma estratégia deliberada e intencional de “confusão” entre o público e o privado. Alinhou que o evento realizado no dia 1º de maio de 2024, promovido pelo deputado então candidato a prefeito de Ananindeua, “custeado com recursos públicos advindos de emendas parlamentares, teve shows, inclusive, com a presença de artista renomado nacionalmente (“Zé Vaqueiro”), sorteio de prêmios de alto valor (motos, geladeiras e tvs), com estreita e inequívoca vinculação à pessoa do candidato, haja vista o total destaque, ênfase e protagonismo ao seu nome e imagem, conforme comprovado por registro da cartela de sorteio de prêmios, vídeo de promoção e realização do evento e print’s de redes sociais atribuindo à sua pessoa a realização do evento, relacionando o nome da festa (“Doido pelo Trabalhador”) ao nome pelo qual é conhecido “Antonio Doido”, demonstram o nítido caráter eleitoreiro travestido de ato institucional, aliando-se, portanto, perfeitamente ao conceito de abuso de poder”.

A sentença aponta que, sob o prisma do aspecto qualitativo, “as condutas praticadas pelo investigado “Antônio Doido” e já analisadas anteriormente, apresentam-se como altamente reprováveis e imorais”.

O juiz sintetizou sua fundamentação: “pensar de forma contrária seria criar um verdadeiro incentivo e estímulo a prática de abuso de poder, haja vista que pretensos candidatos a cargos eletivos se sentiriam autorizados a utilizar volumosos recursos financeiros ou mesmo se utilizar da “máquina” estatal como ferramenta de campanha em benefício de candidatura própria, pois só chegariam a ser penalizados ou sancionados em caso de chegar a ser eleito. Em caso de derrota, sairiam impunes e prontos para nova prática abusiva nos próximos pleitos. A Justiça Eleitoral não deve punir apenas o abuso que “dá certo”, mas o abuso que afronta a normalidade e legitimidade do processo eleitoral, “corroendo” os pilares da democracia.

Leiam com exclusividade a sentença, na íntegra.

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