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São inúmeros os estudos científicos que indicam os malefícios para a saúde causados pelo consumo exagerado de açúcar – entre eles a obesidade, considerada por muitos o mal do século. O “Guia Alimentar para Crianças Brasileiras Menores de 2 anos” do Ministério da Saúde diz que “os açúcares, melado, rapadura e mel não devem ser oferecidos para crianças menores de 2 anos”, assim como alimentos processados e ultraprocessados. O consumo cada vez mais precoce destes alimentos faz com que um número crescente de crianças desenvolvam doenças crônicas antes típicas de adultos como a diabetes e a hipertensão, além de outros danos físicos e psicológicos.

Pois bem. As informações acima são facilmente confirmadas por pesquisas desenvolvidas em todas as partes do planeta. O que não há evidências científicas suficientes, entretanto, é uma “verdade” que muita gente considera absoluta: a de que o consumo excessivo de açúcar por crianças leva à hiperatividade. Esta crença começou a ganhar força nos anos 70 graças ao livro Why Your Child Is Hyperactive (“porque a sua criança é hiperativa”) escrito pelo alergista pediátrico Ben Feingold e que propõe, com poucas evidências, que açúcares, ao lado de salicilatos, cores artificiais e sabores artificiais, causam hiperatividade em crianças.

Todavia, pesquisas posteriores desmentiram essa associação. A análise de 12 estudos cegos realizada em 1996 não encontrou evidências que apoiassem essa ideia, mesmo em crianças com TDAH ou consideradas sensíveis ao açúcar. Na verdade, mostrou que o efeito do açúcar está na mente dos pais. Sim, o famoso efeito placebo, neste caso sustentado por um mito. Como? A ingestão excessiva de açúcar está associada a eventos festivos onde as crianças estão mais propensas a ficarem excitadas, como aniversários e comemorações como a Páscoa e o Halloween – quando a ingestão de doces é, ainda por cima, estimulada. 

Um estudo publicado no Journal for Abnormal Child Psychology reuniu um grupo de 35 crianças entre cinco e sete anos cujas mães afirmavam serem comportamentalmente sensíveis ao açúcar. Algumas das mães foram informadas de que seus filhos haviam recebido uma grande dose de açúcar enquanto às restantes disseram que os seus estavam no grupo do placebo. Na verdade, todas as crianças receberam placebos, porém as que achavam que seus filhos tinham consumido açúcar classificaram seus filhos como “significativamente mais hiperativos”. 

A relação entre hiperatividade e o consumo excessivo de açúcar, então, não tem nenhuma evidência científica comprovada, ou seja: se sua criança apresentar comportamentos relacionados com a TDAH é extremamente recomendável procurar orientação especializada o mais rápido possível e não culpar o docinho do aniversário do amiguinho por isso. Quando a questão for hiperatividade, é melhor acreditar na ciência e observar, além da alimentação, os hábitos e estímulos do dia-a-dia, antes de simplesmente creditar possíveis alterações comportamentais ao bolo de domingo oferecido pela avó.

Foto: D Sharon Pruitt

Gabriella Florenzano
Cantora, cineasta, comunicóloga, doutoranda em ciência e tecnologia das artes, professora, atleta amadora – não necessariamente nesta mesma ordem. Viaja pelo mundo e na maionese.

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