Publicado em: 9 de julho de 2025
O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com uma ação judicial urgente na última segunda-feira, 7 de julho, para assegurar o direito à educação de crianças indígenas da etnia Parakanã, que vivem na Terra Indígena Parakanã, no município de Novo Repartimento, sudeste do Pará. A ação tem como alvos o Governo Federal, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e a Prefeitura de Novo Repartimento, e denuncia que o ano letivo de 2025 ainda não foi iniciado em nenhuma das 21 escolas indígenas da região.
De acordo com o MPF, o caso configura um “cenário caótico e degradante” que compromete gravemente o acesso à educação básica, um direito constitucional das crianças indígenas. O ano letivo, que deveria ter começado em fevereiro, está paralisado devido a um impasse na forma de contratação dos professores indígenas, iniciado após decisão da Secretaria Municipal de Educação (Semed) de Novo Repartimento.
A prefeitura passou a exigir diploma de magistério como pré-requisito para a contratação de professores indígenas. Aos que ainda não concluíram o curso, foi oferecida a possibilidade de contratação apenas como profissionais de apoio escolar, com redução de salário e diferenciação de funções. A proposta foi rejeitada pelas lideranças Parakanã, que entendem a medida como discriminatória e desrespeitosa à autonomia pedagógica das comunidades.
Segundo o procurador da República Rafael Martins da Silva, que acompanha o caso, o MPF realizou reuniões com lideranças Parakanã e verificou relatos de atraso de meses no calendário escolar, além de falta de estrutura física nas escolas e precariedade na alimentação escolar. A comunidade expressou a percepção de que a prefeitura age com descaso e negligência em relação às demandas educacionais dos povos indígenas.
A ação judicial destaca que, além da ausência de aulas, a merenda escolar é insuficiente e inadequada às necessidades alimentares e culturais da comunidade. Apenas uma das 21 escolas possui cozinha estruturada. A maioria da comida é preparada nas casas das merendeiras, sem fogões adequados, sem utensílios básicos e sem condições mínimas de higiene e segurança alimentar.
O MPF observa que essa realidade representa grave violação dos direitos fundamentais das crianças indígenas, afetando não apenas o aprendizado, mas também a saúde e a dignidade dos estudantes.
Diante da gravidade da situação, o MPF solicita que a Justiça Federal determine, em caráter de urgência, o início imediato das aulas do ensino infantil e fundamental do ano letivo de 2025 em todas as escolas indígenas Parakanã de Novo Repartimento; a garantia das 1.000 horas de ensino e 200 dias letivos exigidos por lei; a reposição integral das aulas não ministradas desde fevereiro, sem redução da carga horária; o fornecimento de merenda escolar adequada aos usos e costumes alimentares dos Parakanã; a suspensão da exigência de diploma de magistério indígena ou qualquer especialização como condição para o início das aulas de 2025; a garantia mínima de dois professores por aldeia, sendo um indígena falante da língua materna, indicado pela própria comunidade, e um professor concursado, com carga horária integral de 200 horas mensais por aldeia; a proibição de contratação dos professores indígenas em cargos de apoio escolar ou equivalentes, assegurando isonomia salarial com professores não indígenas; e a aplicação correta dos recursos federais destinados à educação indígena, além dos demais repasses e verbas municipais.
Além das medidas emergenciais, o MPF também pede que os réus (União, FNDE e Prefeitura) sejam condenados ao pagamento de R$ 5 milhões por danos morais coletivos, valor que deverá ser revertido integralmente para a comunidade Parakanã.
A Constituição Federal de 1988 assegura o direito à educação diferenciada aos povos indígenas, respeitando seus métodos próprios de aprendizagem, suas línguas e seus conhecimentos tradicionais. A ausência do ano letivo em 2025, além de configurar omissão administrativa, afeta diretamente o futuro de centenas de crianças indígenas e evidencia falhas estruturais na oferta de políticas públicas específicas para os povos originários.
(Foto: Lohana Chaves/Funai, sob licença CC BY-ND 3.0)
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