Muito se discute, ultimamente, a respeito da inserção efetiva da mulher na sociedade e a necessidade cada vez maior de sua participação isonômica em relação aos homens nas variadas esferas de poder. Por outro lado, a política é tema tratado com profundo ceticismo pelos brasileiros ou de modo polarizado e movido a paixões; todavia, independentemente da visão adotada, é ponto comum a urgência em corrigir graves problemas estruturais. Nesse contexto, exsurge a liderança da mulher como alternativa concreta para melhoria social, político e econômica.
De início, insta compreender que, historicamente, as mulheres foram excluídas das principais instâncias de tomadas de decisão. Tal alijamento englobou também a esfera política, não é à toa que, somente em 24 de fevereiro de 1932, obtiveram o reconhecimento do direito ao voto, o qual fora insculpido no Código Eleitoral.
Tem-se, hodiernamente, como fato inegável a existência de uma construção social em que a mulher foi, por muito tempo, vista como ser inferior ao homem, embora isso não estivesse positivado expressamente em diplomas legais. No entanto, as funções a elas impostas pela sociedade machista limitavam seus potenciais, ao atribuir-lhes apenas os afazeres domésticos; grosso modo, a mulher servia unicamente para ser “dona de casa”.
Esse modelo de sociedade patriarcal redundou em diversos tipos de violência contra a mulher, algumas sutis e outras brutais, porém todas atingindo a mesma finalidade: a opressão da mulher.
Nesse sentido, elas foram obrigadas a suportar todo tipo de contrariedade, a começar pela vida conjugal, que as tornava incapazes para atos da vida civil; o casamento era um dogma que, uma vez dissolvido, gerava uma série de sanções para as mulheres, principalmente contra a sua reputação; eram controladas em cada ação do cotidiano; no extremo, aceitava-se o absurdo da tese da legítima defesa da honra, que garantiu impunidade para inúmeros matadores de mulheres (tese esta rechaçada, em 2021, pelo Supremo Tribunal Federal, em recente decisão na ADPF/779). Com tantos grilhões, difícil imaginar a participação plena e efetiva da mulher no campo político, visto que não tinham liberdade para decidir acerca das questões básicas e inerentes ao ser humano.
Em paralelo, convém breve digressão sobre a política no país, a fim de se vislumbrar a liderança feminina como solução capaz de garantir sucesso no destino dos brasileiros.
Sabe-se que o Brasil, no curso da República, possui uma história política caracterizada por graves instabilidades institucionais e frustradas expectativas de melhorias na vida do povo. Apesar de alguns otimistas acreditarem, com muito esforço, na solidez da nossa jovem democracia (formatada a partir da Constituição Federal de 1988), não se pode olvidar que convivemos com constantes ameaças de retrocessos, sobretudo no tocante à conquista e à preservação de direitos. No ápice da intolerância, certos grupos chegam a cogitar, inclusive, a volta da ditadura militar, ou seja, o exercício do poder à base meramente da força, em contundente afronta ao Estado Democrático de Direito e desprezo à liberdade.
Somam-se a isso profundas desigualdades sociais que parecem incapazes de ser superadas. Nos jornais, ganha destaque a fome, sem dúvida, o aspecto mais triste e impactante da pobreza e prova maior da incompetência dos governantes. Neste ponto, convém transcrever reportagem do dia 05/10/21, publicada no site da CNNBrasil: “A fome no Brasil avança e atinge, em dois anos, mais de nove milhões de pessoas. O levantamento mais recente da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan) indica que no total 19,1, milhões de cidadãos se enquadram neste perfil, ou 9% da população”. No mais, “entra e sai” políticos e o que se vê são escândalos de corrupção e promessas vazias. Como resultado, a política tem sido vista com descrença e ausência de credibilidade.
Traçado, em apertada síntese, o quadro político brasileiro, frisa-se que essa realidade desanimadora é fruto de um processo conduzido com absoluta predominância da presença masculina. Os dados a seguir (publicados no site do Tribunal Superior Eleitoral, em 20/07/2021) corroboram tal afirmação: “Elas são maioria entre os 150 milhões de eleitores, somando 53%. No entanto, são minoria nos cargos de representação. Nos últimos 195 anos, a Câmara dos Deputados por exemplo, teve 7.333 deputados, incluindo suplentes. Apesar de conquistarem o direito de serem eleitas em 1933, as mulheres ocuparam somente 266 cadeiras nestes quase 90 anos. “Destarte, mister se faz buscar um novo caminho! Doravante, as mulheres precisam exercer a liderança do país!
Para tanto, é indispensável reconhecer e valorizar as conquistas decorrentes das lutas femininas. Após compromissos assumidos internacionalmente, o legislador concebeu a Lei Nº 11.340/06 (Lei Maria da Penha), que, por sua vez, tipificou, no art. 5º, variadas formas de violência contra a mulher, tais como: física, sexual, psicológica, moral ou patrimonial. Assim, do ponto de vista jurídico, consolidou-se louvável avanço no sentido de colimar a libertação das mulheres do ciclo de violência a que vinham sendo submetidas. Entretanto, não se desconhece faltar muito a ser percorrido para desarraigar práticas violentas e machistas contra as mulheres, enraizadas nas relações sociais como um todo.
Conscientes da necessidade de eliminar os obstáculos que as impedem de exercer plenamente seus direitos, as mulheres conseguem a aprovação da Lei nº 14.192/2021, a qual previne, reprime e combate a violência política, vedando qualquer ação ou omissão que caracterize distinção, exclusão ou restrição em virtude do sexo feminino, em âmbito político.
Chama-se atenção, ainda, dentre outras inovações legislativa, para o tipo penal criado pela citada lei e inserido no Código Eleitoral, no art. 326-B. Ele visa a coibir o assédio, constrangimento, humilhação, perseguição ou ameaça, por qualquer meio, a candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo, utilizando-se de menosprezo ou discriminação à condição de mulher, com a finalidade de impedir ou de dificultar a sua campanha eleitoral ou o desempenho de seu mandato eletivo. A sanção é a pena de reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. Protege, portanto, a mulher candidata e a já eleita, podendo ser interpretado como um fator de motivação para a participação destemida na política. Como diz o poeta Milton Nascimento: “Nada a temer senão o correr da luta”. Vamos lá, mulheres! Ocupem seus espaços, sem medo ou limites!
Dessa forma, deve-se encorajar a continuidade das lutas femininas, pois estas vêm ensejando condições para que elas ocupem o centro do poder, genuíno empoderamento. A competência feminina, a sua sensibilidade e natureza vocacionada para abraçar valores íntegros fazem encher de esperança o coração e a mente dos brasileiros progressistas. Portanto, mais mulheres na política significa mudança de rumo em direção à certeza de um país justo!
Comentários