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Quando começa o livro ela já é prisioneira há cinco anos. May fazia esportes, gostava de caminhar e já havia desconfiado que alguém a estava observando. Um dia veio um carro, local deserto, trilha alternativa e ele mostrou a arma.
Ele queria ser médico, acabou no Exercito, servindo no Afeganistão. Voltou meio estranho. Casou, tem uma filha. A mulher morre de câncer. A essa altura ele já havia matado oito moças, corpos nunca encontrados. Foi morar em cidade pequena, Estado de New York. Admirado pelos munícipes, prestativo, bonitão, ficou abatido, viúvo. Os sogros não gostavam dele e pediram a casa em que morava, de volta.
Era uma casa bonita, com um galpão ao lado. Nesse galpão, morava, presa a uma corrente, May. Quase todas as noites ele a visita e abusa sexualmente. Alimenta, dá banho, limpa suas necessidades. Quase não fala. Ela pensa 24 horas em fugir. Pensa na mãe, no irmão, na busca que deve ter cessado. Cinco anos.
Ele começa a paquerar a dona de um restaurante. Ela se apaixona. Ele cede, aos poucos. Alguns encontros às escondidas, para evitar falatório. Um juiz da cidade oferece sua casa. Mas não tem galpão. Ele diz a May que de agora em diante ela se chama Raquel. Que vai morar com ele e a filha. Ficará trancada em um quarto, saindo apenas para as refeições. Ameaça de todas as maneiras. Ela gosta da menina, 13 anos. Continua a ser abusada quase diariamente. Um dia ele esquece a algema sem trancar. Sai para trabalhar. Ela pensa em fugir. Não consegue. Não sabe nem onde está. Pensa que deve levar a filha.
Ele namora com a dona do restaurante. Ela decide ir até a casa. Para na rodovia. Ele vai lá. Ela chama a garota para fugir. Ela não vai. Ele volta correndo. Machuca May, aliás Raquel. A namorada sabe dela. Pensa o pior. Um dia, meio da manhã, entra na casa e conhece. Raquel não sabe o que dizer. Consegue arrombar a porta de um porão. Descobre fotos das mulheres assassinadas. Qual a razão por não ter sido morta. Uma ponta solta, acho. A filha aparece. Ela também conhece o porão. Agora sabe abrir as algemas. A comunidade, com pena, decide fazer uma festa natalina no jardim da casa deles. Ela pega a menina, corre até o carro e foge. Ele vai atrás. Chegam quase juntos à Polícia. Tudo é descoberto. Esses são os fatos. O que Clémence Michallon consegue em “A Inquilina Silenciosa” é revelar o pensamento de uma mulher submetida a inacreditável pressão, violência sexual e a retirada da liberdade, de seu mundo, de sua vida. Pode tirar tudo da gente, , agredir, violar, mas se tirar a liberdade… E também pensamos nesse serial killer que era amado pela comunidade e tinha uma família que amava e controlava. Gostei de ler. Algumas outras pontas soltas, diria. Quando se escreve um livro de mistério, onde a vida de alguém depende de detalhes, tudo precisa estar bem amarrado. Mas sim, gostei.

Edyr Augusto Proença
Paraense, escritor, começou a escrever aos 16 anos. Escreveu livros de poesia, teatro, crônicas, contos e romances, estes últimos, lançados nacionalmente pela Editora Boitempo e na França, pela Editions Asphalte. Foto: Ronaldo Rosa

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