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O promotor de justiça Benedito Sá obteve a suspensão das obras de duplicação da Rua da Marinha em Belém. A decisão, proferida pelo Juiz Raimundo Rodrigues Santana, titular da 5ª Vara da Fazenda Pública da Capital, atende a uma Ação Civil Pública do Ministério Público do Estado do Pará que tem como litisconsortes ativos o Município de Belém e a Associação dos Moradores do Conjunto Médici (AMME) e réu o Estado do Pará. Ao deferir a liminar, o magistrado fixou, em caso de descumprimento da ordem judicial, multa diária de R$ 100 mil, limitada (por agora) em R$2 milhões. O Governo do Pará já foi intimado em regime de urgência para ciência e cumprimento. O projeto carece de licenciamento municipal, estudo prévio de impacto ambiental e consulta pública. Com base na decisão, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente anunciou que fará a fiscalização no local da obra para fins de embargo e aplicação de multa administrativa pelo impacto ambiental já causado, especialmente pela grande supressão vegetal executada.

Historiando a questão, o juiz destacou que, inicialmente, o governo do Pará pretendia realizar a obra adentrando na área do Parque Ecológico de Belém. Como a Semma não concedeu o licenciamento, o projeto foi refeito de modo que não haveria qualquer intervenção no Parque Ambiental Gunnar Vingren. E começaram as obras, com licença da Secretaria Estadual de Meio Ambiente. Entretanto, o prolongamento da Rua da Marinha em um trecho fora dos limites do parque (entre a rotatória do Canal Joaquim e a Av. Centenário), ainda causará danos ambientais, já que o canal, margeado pela obra, está dentro dos limites do parque. Diante disso, o Ministério Público requereu tutela de urgência para suspender as obras e, no mérito, postulou a condenação do governo do estado em obrigação de não realizar qualquer supressão vegetal ou intervenção na área do Parque Gunnar Vingren (Parque Ecológico de Belém), sem licença do município de Belém, autorização legislativa do ente municipal e Eia/Rima com consulta da comunidade local interessada.

Em sua defesa, o governo do Pará asseverou que que a duplicação da Rua da Marinha tende a melhorar a mobilidade urbana em Belém, especialmente para eventos de grande porte, como será o caso da COP-30, em 2025. Sustentou que a intervenção não afetará diretamente o Parque Gunnar Vingren e que o projeto foi modificado para reduzir o impacto ambiental, e, ainda, que a Semas teria legitimidade para licenciar porque, apesar de estar adstrita aos limites físicos de Belém, a obra beneficiará toda a região metropolitana, cujo tráfego se dá pelas vias que serão ligadas à nova Rua da Marinha.

Já a Associação dos Moradores do Conjunto Médici (AMME) ressaltou a importância do Parque Gunnar Vingren para a comunidade local, e o fato de que a obra ameaça a preservação ambiental da área, com impactos irreversíveis à fauna, à flora e às nascentes de água. Aduziu, também, que o projeto de duplicação viola normas ambientais, por não ter licença municipal, nem ter consultado a comunidade afetada.

O juiz Raimundo Santana frisa, em sua decisão, que há fartos indicativos dando conta de que a obra de duplicação da Rua da Marinha, no bairro da Marambaia, embora seja de iniciativa estadual e implique na utilização (parcial) de área que pertencia à União, ostenta todas as características de um empreendimento de impacto local e causador de danos ambientais, ao menos por três razões.

A primeira: o trecho completo da obra está situado nos limites geográficos de Belém, não havendo conexão direta com as vias de acesso às rodovias federais ou estaduais. “Em circunstâncias tais, ressoa clara a predominância do interesse local sobre qualquer outro. Aliás, quanto a esse ponto, tudo indica que o próprio demandado já havia percebido a incidência do interesse local, ao requerer o primeiro pedido de licenciamento ao órgão municipal, o qual, porém, foi indeferido”. Ademais, a Resolução nº 162/2021, do Conselho Estadual do Meio Ambiente – Coema, define o impacto ambiental local como qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas que, direta ou indiretamente, afetam a saúde, a segurança e o bem-estar da população, as  atividades sociais e econômicas, a biota, as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente, a qualidade dos recursos ambientais, dentro dos limites do município.

Em segundo lugar, o magistrado aponta que, ainda que a parte física da obra não incida sobre o interior do Parque Gunnar Vingren, há evidente sinal de agressão a um território que deve ser juridicamente protegido, tanto por seu interesse ambiental quanto por seu viés estritamente ecológico. “Com efeito, é facilmente perceptível que a área na qual haverá supressão vegetal (que pertencia à Marinha do Brasil e foi doada ao Estado do Pará), em termos ecológicos, tem/tinha uma conexão intrínseca com a área do parque ambiental. Ou seja, para a vida silvestre ali existente, não há uma limitação geográfica entre a área do parque e o terreno que era de propriedade da União. Os animais, a vegetação e os cursos d’água situados no interior das duas áreas se comunicam intensamente, conformando, do ponto de vista ecológico, apenas uma unidade ecossistêmica. Portanto, a supressão de cerca de 34ha de vegetação, mesmo que efetuada fora dos limites do parque, tem o condão de afetar negativamente todo aquele ecossistema, especialmente se for considerado que a área do parque compreende cerca de 44ha. Em outras palavras, a área de vegetação adjacente que será suprimida corresponde a mais de 70% da área do parque, sendo manifesta a perda ecológica”.

Em terceiro lugar, mas não menos importante, o juiz alinha que, “em sendo tão perceptível a ocorrência de um dano ecológico-ambiental, é relevante que que remanesça a respectiva compensação do impacto negativo que será causado pelo empreendimento. Afinal, a intervenção em uma área que é ambientalmente sensível, por ser adjacente aos limites do Parque Gunnar Vingren, tende a interferir diretamente na qualidade ambiental tanto no interior do parque quanto no seu entorno. Nesse panorama, a exigência de medidas compensatórias é coerente com a necessidade de se assegurar a mitigação dos danos causados ao ecossistema e à comunidade situada às proximidades do parque”.

Leiam a íntegra da decisão.

Fotos de Alexandre Bastos

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