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A religiosa, advogada, ativista e formadora de movimentos sociais brasileira Irmã Rosita Milesi, de 79 anos, foi reconhecida internacionalmente pelo seu incansável trabalho em prol dos refugiados. Ela foi agraciada hoje, 14 de outubro, com o Prêmio Nansen de 2024, concedido pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR). O anúncio da premiação global destacou a trajetória de quase 40 anos de Irmã Rosita na defesa dos direitos e da dignidade de pessoas forçadas a deixar seus países por causa de guerras, perseguições e violações de direitos humanos.

O Prêmio Nansen, batizado em homenagem ao explorador e humanitário norueguês Fridtjof Nansen, é uma das maiores honrarias globais no campo da proteção a refugiados, distigue indivíduos e organizações que demonstram compromisso e coragem excepcionais ao ajudar refugiados e deslocados em todo o mundo. Estabelecido em 1954, o prêmio já foi concedido a figuras importantes como Eleanor Roosevelt, primeira-dama dos Estados Unidos e ex-presidente da Comissão de Direitos Humanos da ONU. Irmã Rosita é a segunda brasileira a receber a honraria, seguindo os passos de Dom Paulo Evaristo Arns, ex-arcebispo de São Paulo, agraciado em 1985.

Irmã Rosita foi escolhida entre mais de 400 indicados. Nascida em Nova Bassano, no Rio Grande do Sul, Irmã Rosita ingressou na Congregação das Irmãs Scalabrinianas em 1964 e desde então tem dedicado sua vida à defesa dos direitos dos migrantes e refugiados. Em 1999, ela fundou o Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH), uma associação sem fins lucrativos localizada em Brasília, que oferece atendimento jurídico, acolhimento humanitário e integração social e laboral a refugiados, migrantes e apátridas em situação de vulnerabilidade.

A década de 1990 marcou o início do envolvimento de Irmã Rosita com os refugiados, especialmente com os angolanos que fugiam da guerra civil em seu país. A guerra, que durou até 2002, levou milhares de angolanos ao Brasil em busca de asilo. Estima-se que entre 1990 e 2002, aproximadamente 2.300 angolanos tenham solicitado refúgio no país, de acordo com a Cáritas Arquidiocesana do Rio de Janeiro.

Como advogada, Irmã Rosita deu enorme contribuição para a criação da Lei de Refúgio no Brasil, sancionada em 1997. Até então, o país seguia os parâmetros da Convenção de Genebra de 1951, que protegia apenas pessoas perseguidas por motivos de raça, religião, opinião política ou pertencimento a determinado grupo social. Graças à sua atuação, o conceito de refugiado foi ampliado para incluir aqueles que são forçados a deixar seus países devido a violações graves e generalizadas de direitos humanos, alinhando a legislação brasileira à Declaração de Cartagena de 1984. Isso garantiu que a lei incorporasse mais medidas de proteção, inclusão e empoderamento para pessoas forçadas a fugir, em conformidade com os padrões internacionais. Hoje, mais de 135 mil refugiados no Brasil são reconhecidos com base nesse critério.

Durante sua trajetória, Irmã Rosita identificou quatro alicerces essenciais para a integração de refugiados em um novo país. O primeiro é a barreira linguística. Embora esse não fosse o maior problema para os refugiados angolanos, que já falavam português, a questão da revalidação de diplomas e da inserção no mercado de trabalho eram barreiras importantes. Além disso, ela destacou a importância da integração cultural, defendendo que os refugiados não podem ser tratados apenas como mão-de-obra. Eles precisam se sentir parte da comunidade, ter uma identidade e uma vida cultural integrada.

A partir de 2018, com o aumento do fluxo de refugiados venezuelanos entrando no Brasil por Roraima, o IMDH expandiu suas atividades para a região Norte. Em Boa Vista, capital do estado, o foco foi na emissão de documentos, uma etapa fundamental para que os migrantes se sintam acolhidos legalmente no país. Segundo dados oficiais, desde 2018, mais de 693 mil venezuelanos cruzaram a fronteira em busca de refúgio no Brasil. O país já reconheceu mais de 143 mil pessoas como refugiadas, incluindo mais de 77 mil apenas no último ano.

Hoje, a legislação brasileira sobre refúgio é considerada uma das mais avançadas da América Latina, e grande parte dessa conquista se deve à dedicação de Irmã Rosita. Seu trabalho incansável no IMDH continua a prestar assistência a milhares de pessoas que chegam ao Brasil em busca de uma vida mais segura e digna.

Irmã Rosita pela ONU por defesa de refugiados (Marina Calderón / ACNUR)

O comitê do Prêmio Nansen de 2024 também homenageou outras quatro laureadas regionais: Maimouna Ba, do Burkina Faso, que ajudou a educar e capacitar crianças e mulheres deslocadas; Deepti Gurung, do Nepal, que lutou pela reforma das leis de cidadania de seu país; Jin Davod, da Europa, que criou uma plataforma de apoio à saúde mental de refugiados; e Nada Fadol, uma refugiada sudanesa que mobilizou ajuda essencial no Egito.

O Alto Comissário da ONU para Refugiados, Filippo Grandi, declarou que “As mulheres muitas vezes enfrentam riscos elevados de discriminação e violência, especialmente quando são forçadas a fugir, mas essas cinco vencedoras mostram como as mulheres também desempenham um papel fundamental na resposta humanitária e na busca de soluções.” Grandi destacou a dedicação delas em realizar ações dentro de suas próprias comunidades, fortalecer o apoio local e até influenciar políticas nacionais.

Veja a premiação:

Gabriella Florenzano
Cantora, cineasta, comunicóloga, doutoranda em ciência e tecnologia das artes, professora, atleta amadora – não necessariamente nesta mesma ordem. Viaja pelo mundo e na maionese.

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