Publicado em: 9 de dezembro de 2025
Em decisão unânime, a 11ª câmara do TRT15 majorou de R$ 5 mil para R$ 30 mil a indenização por danos extrapatrimoniais devida a advogada que sofreu violência de gênero praticada pelo presidente do sindicato dos Empregados no Comércio de Jundiaí e Região (SP), no qual ela trabalhava. O Tribunal determinou também que a entidade implemente medidas obrigatórias de prevenção e enfrentamento à discriminação de gênero, enfatizando que a conduta configurou grave violência institucional, sobretudo por partir de quem tinha o dever de proteger os trabalhadores. E oficiou ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 530 da CLT, que veda a ocupação de cargos de direção sindical por dirigentes que pratiquem atos de má conduta, com possível enquadramento na lei de improbidade administrativa.
A trabalhadora foi contratada como advogada em abril de 2022 e dispensada sem justa causa seis meses depois. Na ação, relatou ter sido alvo de expressões ofensivas e discriminatórias do presidente da entidade, que depreciava a sua aparência e a chamava de “vagabunda”, “miserável”, “desgraçada” e “mentirosa”, afirmando que deveria voltar a ser taxista, além de insinuações quanto à sua moral.
O juízo da 3ª vara do Trabalho de Jundiaí reconheceu o dano e fixou indenização em R$ 5 mil. O sindicato recorreu, alegando ausência de provas e tentou desqualificar a testemunha da autora, que, por sua vez, pleiteou a majoração da indenização, argumentando que a violência ultrapassava o mero abuso diretivo e configurava discriminação de gênero.
Ao analisar o caso, o relator, desembargador João Batista Martins César, destacou que a violência sofrida não se limitou ao âmbito individual, mas se inseriu em um contexto de desigualdade estrutural de gênero, reforçada pela posição de poder do agressor.
Aplicando o Protocolo do CNJ para Julgamento com Perspectiva de Gênero, concluiu que a prova testemunhal, ainda que indireta, era suficiente e coerente para demonstrar um ambiente de trabalho hostil e discriminatório.
O magistrado salientou que a tentativa de desqualificar a testemunha com base em elementos alheios ao processo reproduz estereótipos de gênero, como a crença de que mulheres exageram ao relatar violência, e contraria parâmetros internacionais de proteção, observando que o Brasil assumiu o compromisso de eliminar essa forma de violência, ao ratificar a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará, de 1994) e a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW, 1979). Ainda, a Opinião Consultiva OC-27/21 da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que examinou os direitos à liberdade sindical, negociação coletiva e greve sob perspectiva de gênero, reforça a obrigação estatal de adotar medidas positivas para reverter situações discriminatórias no âmbito laboral e sindical, reconhecendo que a permanência de estereótipos de gênero constitui obstáculo ao pleno exercício de direitos pelas mulheres.
O desembargador relator acentuou que a discriminação de gênero está enraizada em padrões histórico-culturais de uma sociedade machista e patriarcal e se manifesta por meio da divisão sexual do trabalho, regida pelo princípio da separação (trabalhos de homens e de mulheres), e pela hierarquia (trabalho de homem vale mais do que trabalho de mulher), que o art. 1º da Convenção 111 da OIT define como discriminação todo tratamento desigual que dificulte o acesso, permanência, ascensão profissional e igualdade remuneratória, incluindo práticas de assédio moral que desqualificam a mulher por meio de estereótipos sexistas. E que a Convenção 190, sobre violência e assédio no trabalho, reconhece que tais práticas violam direitos humanos, ameaçam a igualdade de oportunidades e são incompatíveis com o trabalho decente, impedindo especialmente que as mulheres tenham acesso ao mercado de trabalho, permaneçam e progridam profissionalmente.
Processo: 0011234-37.2023.5.15.0096









Comentários